Ajustamento de Portugal "não estará completo no final do programa", diz Carlos Costa

Governador do Banco de Portugal pede um pacto de regime.

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Carlos Costa nFactos/Jorge Miguel Gonçalves

O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, afirmou nesta terça-feira que o ajustamento de Portugal "não estará completo no final do programa" de assistência financeira, admitindo que podem ocorrer "episódios de volatilidade excessiva" que poderão "afastar os investidores".

Para Carlos Costa, que falava numa conferência na SEDES, em Lisboa, Portugal tem de estar consciente de que "no futuro próximo, "os mercados financeiros continuarão particularmente sensíveis a quaisquer derrapagens face às expectativas nos desenvolvimentos económicos, sociais e políticos, quer a nível nacional, quer europeu".

O governador do Banco de Portugal defendeu que o "novo paradigma" para a definição de política económica e social deve ter como base três vectores.

Em causa estão, segundo o mesmo responsável, uma política orçamental que garanta a sustentabilidade de médio prazo e uma política de distribuição de rendimentos "assente em regras que assegurem a manutenção da competitividade da economia, isto é, que tenha por base acréscimos efectivos de produtividade".

O último vector apontado pelo governador do Banco de Portugal prende-se com "o desenvolvimento de um quadro institucional que favoreça o investimento em áreas de maior valor acrescentado, que possa acomodar as aspirações de consumo e de protecção social inerentes ao modelo de sociedade europeu".

Para Carlos Costa, "é necessário perceber que o retorno à normalidade não será um retorno ao passado", pelo que "não haverá lugar para endividamento adicional".

Quanto aos mercados financeiros, o governador antecipa que haja "um maior escrutínio do risco das operações de financiamento, quer do sector público, quer do sector privado", acrescentando que "haverá menor condescendência com níveis elevados de endividamento e que a redução do endividamento deve ser uma prioridade".

Destacando que a existência de regras de disciplina orçamental não é suficiente para garantir bons resultados e que há uma "percepção de falhanço das políticas", decorrente da adopção de medidas de consolidação orçamental mais exigentes e da revisão das metas, Carlos Costa entende que "a disciplina orçamental deve assentar na definição de um Quadro Orçamental Plurianual viável e eficaz".

Para o governador do Banco de Portugal, este quadro deve ser apoiado por um "Pacto de Regime", ou seja, "um acordo entre as principais forças políticas que defina de forma clara as restrições incontornáveis que se impõem aos partidos que estejam no Governo".

Neste sentido, defendeu, este acordo "deve contemplar regras de distribuição, entre redução de dívida pública e redução de impostos, de bónus de crescimento económico que venham a ocorrer".

Além disso, devem ainda ser definidos "limites vinculativos para a despesa pública nominal num horizonte de médio prazo", disse Carlos Costa, acrescentando que estes limites só podem ser ultrapassados em circunstâncias muito excepcionais.

Carlos Costa referiu também a importância de investir em áreas de maior valor acrescentado e de aumentar o potencial de crescimento da economia.

"Talvez o maior desafio que temos pela frente é tornar Portugal um país mais produtivo e com capacidade para criar emprego de forma sustentada", afirmou.

"Cabe à iniciativa privada identificar as melhores oportunidades de negócio e fazer um escrutínio exigente dos projectos de investimento. Do sector público espera-se que assegure condições favoráveis à concretização destes projectos", argumentou.

Programa cautelar
Carlos Costa defendeu ainda a adopção de um Programa Cautelar, após o Programa de Assistência Económica e Financeira, para garantir a "operacionalização dos mecanismos europeus de intervenção no mercado da dívida pública".
Considerando que não se podem excluir situações de volatilidade excessiva do mercado, Carlos Costa afirmou, em Lisboa, que "é essencial que, para fazer a face a situações contingentes, se disponha de mecanismos de intervenção no mercado primário e secundário da dívida pública que evitem que os investidores se afastem da economia portuguesa".

Para o governador do Banco de Portugal, isso passa pela "operacionalização dos mecanismos europeus de intervenção no mercado da dívida pública, o que pressupõe, como contrapartida, a adopção de um Programa Cautelar".

"Um Programa Cautelar é um programa de acompanhamento das políticas e da evolução económica de um país que apresenta algumas vulnerabilidades. Não é um programa de assistência financeira", explicou Carlos Costa.
O mesmo responsável acrescentou que este instrumento "pode ser visto como um mecanismo de seguro, com uma linha de crédito de reserva associada, que pode ser utilizada para superar perturbações temporárias no financiamento do mercado, associadas, nomeadamente a efeitos de contágio resultantes de acontecimentos externos à economia portuguesa".

De acordo com Carlos Costa, um Programa Cautelar implica "a contrapartida da solidariedade dos parceiros europeus e contribui para consolidar a confiança dos mercados nas políticas económicas do país".

No caso de Portugal, esclareceu, "a condicionalidade do Programa Cautelar deve corresponder à que decorre do cumprimento do pacto orçamental - o qual inclui, em particular, a regra de equilíbrio do saldo orçamental estrutural e a regra de redução da dívida pública - mas com uma vigilância reforçada".

Ou seja, o Programa Cautelar a adoptar em Portugal "seria uma espécie de 'pacto orçamental reforçado'" e "absorveria as novas metas orçamentais acordadas no sétimo exame regular [da 'troika'] para os anos posteriores a 2013".

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