AdC diz que venda da EGF à Mota-Engil merece análise aprofundada

Privatização da empresa pública de tratamento de resíduos ficou decicida em Setembro e está a ser analisada pela Concorrência.

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A EGF é composta por 11 sistemas multimunicipais de tratamento de resíduos Foto: Rui Gaudêncio

O presidente da Autoridade da Concorrência (AdC) reconhece que há matérias que preocupam a entidade reguladora na privatização da EGF, a empresa pública de tratamento de resíduos sólidos urbanos que o Governo vendeu à SUMA (da Mota-Engil) por 150 milhões de euros.

Na quarta-feira, à saída da comissão parlamentar de Orçamento e Finanças, António Ferreira Gomes revelou que a AdC enviou às entidades que se constituíram como contra-interessadas no processo (como a espanhola FCC, que participou no concurso, e um agrupamento de nove empresas do sector) o projecto de decisão sobre a passagem desta operação de concentração à fase de investigação aprofundada.

Em causa está não a operação de privatização, que é uma opção política, mas os efeitos no mercado da concentração entre a EGF e a SUMA.Esta não é uma relação vertical típica, porque nela estão também os municípios, que são simultaneamente clientes e accionistas da EGF, mas há uma cadeia de valor em que participam a SUMA e a EGF, explicou o regulador. A primeira está na recolha de resíduos (as chamadas actividades em baixa) e a segunda no tratamento e valorização destes resíduos (actividades em alta).

É essa relação vertical que pretendemos esclarecer melhor e avaliar se daqui poderá decorrer algum tipo de preocupações jusconcorrenciais, sublinhou o presidente da AdC (que antes do início da privatização recomendou ao Governo que os 11 sistemas multimunicipais da EGF não fossem vendidos em bloco).

No projecto de decisão, a que o PÚBLICO teve acesso, uma das preocupações expressas pelo regulador é a possibilidade de a nova entidade ficar numa situação de vantagem concorrencial que lhe permita encerrar o mercado de resíduos urbanos em baixa. Por outras palavras, o receio é que a pressão concorrencial que a SUMA/EGF venha a exercer sobre as empresas rivais as faça serem marginalizadas ou até mesmo expulsas do mercado.

O regulador sublinha que os ganhos de eficiência da nova entidade integrada devem ser sempre olhados numa perspectiva dinâmica. Se, por um lado, este tipo de concentrações verticais pode fazer descer preços e ter efeitos pró-concorrenciais, também pode haver situações em que tal não suceda. É que, depois de eliminada a concorrência, a nova entidade ganha a capacidade, num momento subsequente, de fazer subir os preços.

Uma dessas fontes de encerramento de mercado poderia dar-se por aquilo a que a AdC chama a alavancagem da posição no mercado regulado, que resultaria da possibilidade de a SUMA/EGF conseguir passar, contabilisticamente parte dos custos das actividades em baixa para as actividades em alta, compensando os custos por via tarifária. Dada a dupla condição das câmaras (accionistas em alta e clientes em baixa), o regulador nota ainda que é preciso olhar para o papel do município, ou seja, em que medida a posição monopolista em alta da entidade resultante da operação de concentração, enquanto parceira dos seus próprios clientes, poderá influenciar os municípios na escolha dos prestadores de serviços em baixa.

As preocupações da AdC não são a única nuvem sobre a privatização. A Valorsul, o principal activo da EGF (que tem como accionistas os municípios de Lisboa, Loures, Odivelas, Vila Franca de Xira e Amadora), deverá realizar a 2 de Março uma nova assembleia geral destinada a afastar a EGF da sua estrutura accionista. Ainda estamos a analisar um parecer da EGF, mas tudo indica que se confirma a AG, disse ao PÚBLICO o autarca de Loures, Bernardino Soares. A EGF sustenta que a AG é ilegal.

Já o Governo garantiu, em declarações à Lusa, na terça-feira, que está convicto que o processo é "robusto do ponto de vista jusconcorrencial"  que a passagem a investigação aprofundada insere-se no "processo normal de análise" do regulador da Concorrência.

 

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