Questionada credibilidade de novo método de geração de células estaminais

Há umas semanas, cientistas anunciaram que tinham conseguido gerar células capazes de originar todos os tecidos do organismo submetendo células já diferenciadas a um banho ácido. Os resultados estão a gerar algum cepticismo entre os especialistas.

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Haruko Obokata quer dar explicações públicas precisas sobre o que aconteceu Jiji Press/AFP

Haruko Obokata, autora principal de recentes resultados científicos bombásticos, está a ser alvo de uma investigação por parte do Centro RIKEN de Biologia do Desenvolvimento de Kobe (Japão), a instituição onde trabalha – e também por parte da revista Nature, que há poucas semanas publicou os resultados. Em causa estão possíveis irregularidades no que respeita às imagens que acompanham o trabalho, bem como a dificuldade que outros laboratórios têm tido em reproduzir os resultados anunciados.

Recorde-se que, a 29 de Janeiro, cientistas norte-americanos e japoneses proclamaram um espectacular avanço científico. Basicamente, tinham conseguido criar, graças a uma nova técnica, células muito semelhantes às células estaminais embrionárias a partir de células já diferenciadas de ratinhos – células que designaram por STAP, a sigla em inglês de “aquisição de pluripotência desencadeada por um estímulo”. A técnica de reprogramação celular descrita pelos autores era surpreendentemente simples e directa: consistia em mergulhar as células do sangue dos ratinhos (células portanto já diferenciadas) numa solução ligeiramente ácida durante cerca de meia hora para as incitar a regressarem “à infância”.

Os resultados tiveram imediatamente uma repercussão mediática mundial, na medida em que esta nova técnica constituía uma potencial e muito acessível terceira via para a produção de células estaminais, com profundas implicações para o futuro da medicina regenerativa personalizada.

Porém, nos dias que se seguiram, lê-se numa notícia no site da Nature, surgiram comentários no blogue especializado PubPeer.com a sugerir que algumas das imagens publicadas poderiam ter sido manipuladas ou duplicadas. E a situação complicou-se ainda mais quando vários especialistas de topo em células estaminais, inquiridos pela própria Nature, declararam não ter conseguido duplicar os resultados de Obokata.

Contactado por aquela revista britânica, Charles Vacanti, da Universidade de Harvard (EUA), que liderou o trabalho, respondeu que poderá ter de facto havido uma troca acidental e involuntária de imagens (o cientista já enviou um pedido de correcção), acrescentando que isso não punha os resultados em causa.

Quando à dificuldade de replicar os resultados, vários especialistas entrevistados pela Nature estão, por enquanto, a dar o benefício da dúvida aos autores. É o caso de Qi Zhou, por exemplo, especialista de clonagem do Instituto de Zoologia de Pequim (China), que argumenta que a técnica poderá ser, na realidade, muito mais difícil de aplicar do que se poderia pensar. “A mesma técnica pode ser fácil para um laboratório experiente e muito difícil para os outros”, estima.

Jacob Hanna, especialista de células estaminais do Instituto Weizmann de Ciência em Revohot (Israel), diz por seu lado que todos deveriam “ser muito prudentes antes de lançar suspeitas sobre resultados inéditos”. Contudo, admitiu à Nature  sentir-se “extremamente preocupado e céptico”. Todavia, tenciona continuar a tentar reproduzir os resultados durante cerca de dois meses antes de desistir.

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