Reforço de segurança não travou a viagem de três menores para a Síria

Antes de viajarem para a Turquia, uma das raparigas contactou através do Twitter uma mulher de Glasgow que tem usado as redes sociais para tentar convencer jovens britânicas a juntar-se ao Estado Islâmico.

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As três raparigas no aeroporto de Gatwick AFP/Polícia Metropolitana

Pais e alunos regressaram esta segunda-feira à Bethnal Green Academy do Leste de Londres, considerada “excelente” pela autoridade escolar independente britânica. “É de loucos. Estou completamente chocado. As pessoas não esperam ir de férias e depois voltar e descobrir que todas estas raparigas foram para a Síria”, disse ao Guardian Mohammed, um aluno.

Era aqui que estudavam Shamima Begum e Amira Abase, de 15 anos, e Kadiza Sultana, 16, todas amigas e “alunas de A”, dadas como desaparecidas na terça-feira passada pelas suas famílias, horas depois de terem apanhado um avião para Istambul. A polícia londrina confirmou que tem agentes do comando de contraterrorismo na Turquia, onde procura as adolescentes com a ajuda das autoridades turcas, mas teme que já tenham atravessado a fronteira para se juntarem aos jihadistas do autoproclamado Estado Islâmico.

Shamima (que usou o passaporte da irmã, Aklima, de 17 anos), Amira e Kadiza nunca expressaram qualquer vontade de partir para a Síria, dizem familiares e colegas. Renu Begum, outra irmã de Shamina, conta que ela ficou “alterada” quando soube que uma colega partira para a Síria em Dezembro. A família, afirmou em lágrimas, numa entrevista, que só espera que as raparigas “tenham ido para trazer de volta” essa amiga. “Não queremos que ela faça nada estúpido – ela é uma rapariga sensata. Só a queremos em casa, em segurança”.

Apelos idênticos foram feitos durante o fim-de-semana por familiares das outras duas adolescentes. “Tu és forte, esperta, linda e esperamos que tomes a decisão certa”, afirma, num comunicado, a família de Amira. “Temos mais saudades tuas do que possas imaginar. Estamos preocupados e queremos que penses no que deixaste para trás. Por favor, volta para casa.” O pai, Abase Hussen, pede a Amira que pense como é amada. “A tua irmã e o teu irmão não conseguem parar de chorar”, diz num vídeo em que segura um urso de peluche que a adolescente ofereceu à mãe.

A família de Kadiza descreve os últimos dias como “um pesadelo”: “Não conseguimos perceber por que é que partiste. Face à especulação de que podes estar a caminho da Síria, estamos extremamente preocupados com a tua segurança”.

Esperando que alguém as identificasse na Turquia, a polícia decidiu divulgar as imagens das câmaras de segurança do aeroporto de Gatwick onde se vêem as três adolescentes, de calças, ténis e sacos de desporto na mão. Pouco depois, entravam num voo da Turkish Airlines com destino a Istambul – apesar do aumento do controlo das polícias europeias, a maioria dos ocidentais que decidem ir combater na Síria ainda voa directamente para esta cidade turca.

Richard Walton, responsável dos serviços antiterroristas da polícia britânica, disse que a viagem das três raparigas surpreendeu as famílias, que estão “devastadas”, e as autoridades. “Há obviamente muita propaganda feita por vários grupos na Síria para tentar atrair estes jovens, raparigas e rapazes. Normalmente, são os mais vulneráveis que se deixam seduzir mas estas raparigas não pareciam sê-lo.”

A escola confirmou que a polícia entrevistou as três adolescentes em Dezembro, quando uma amiga de 15 anos da mesma escola partiu para a Síria, “e não encontrou qualquer indicação de que elas estavam em risco de serem radicalizadas”. Uma carta foi enviada a todos os pais na sexta-feira a explicar-lhes o que acontecera, antes do fim das férias e do começo do segundo período.

O director, Mark Keary, diz que a escola está “extremamente orgulhosa da experiência de aprendizagem excepcional que proporciona aos estudantes”, sublinhando que os seus programas garantem “a promoção dos valores da democracia, tolerância e respeito por todas as culturas”. Todos os pais entrevistados pelos media britânicos se dizem “em choque”. “É uma escola fantástica. Não percebo, conhecendo os miúdos, conhecendo a escola, não faz sentido”, disse um ao Guardian.

França confisca passaportes

A polícia não confirma, mas a família de uma mulher de Glasgow que foi para a Síria em Novembro de 2013 para casar com um combatente e que usa a sua conta de Twitter para encorajar jovens britânicas a juntarem-se-lhe e diz que Shamima a contactou no domingo, dois dias antes da viagem, e não percebe como é que as autoridades não fizeram nada. “Segue-me para que possa mandar-te uma mensagem directa”, escreveu-lhe a adolescente.

Num comunicado, a família de Aqsa Mahmooud, de 20 anos, diz que os serviços de segurança têm “questões a responder”. Os perfis de Aqsa nas redes sociais “são monitorizados desde que ela desapareceu, há mais de um ano, mas apesar do contacto entre as raparigas e Aqsa, a polícia não foi capaz de as impedir de viajar para a Síria”, afirmam os familiares de Aqsa. “Tristemente, apesar de toda a retórica do Governo sobre o ISIS [Estado Islâmico no Iraque e no Levante], nem sequer conseguem seguir passos básicos que impeçam crianças de partir. Para que é que servem novas leis?”, perguntam-se.

Esta segunda-feira, as autoridades francesas confiscaram os passaportes e bilhetes de identidade a seis franceses que estariam prestes a viajar para a Síria. São as primeiras proibições administrativas de saída do território depois da adopção de uma nova lei anterrorista, em Novembro, antes ainda dos atentados contra o jornal Charlie Hebdo e uma sinagoga em Paris, que fizeram 17 mortos em Janeiro. Desde então, vários países europeus aprovaram novas medidas para tentar impedir a partida dos seus cidadãos para a Síria e o Iraque.

Bob Milton, ex-comandante da polícia britânica, ouvido pela BBC, diz que a falta de controlo no aeroporto e a forma como as adolescentes londrinas deixaram o país é “vergonhosa”. 

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