Numa vitória para Renzi, Sergio Mattarella é o novo Presidente da Itália

Foi eleito este sábado de manhã, na quarta ronda do escrutínio. Um irmão do chefe de Estado eleito foi morto pela Máfia nos anos 1980.

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Sergio Mattarella sucede a Giorgio Napolitano FILIPPO MONTEFORTE/AFP

Cumprindo a tradição, a quarta ronda de votos para a escolha do chefe de Estado italiano teve um resultado imediato: Sergio Mattarella, um antigo ministro da Educação e da Defesa e juiz do Tribunal Constitucional, e que foi o homem proposto pelo primeiro-ministro Matteo Renzi para o cargo, foi eleito Presidente da República. “Os meus pensamentos vão primeiro, e especialmente, para as dificuldades e as esperanças dos nossos concidadãos. Julgo que isso é suficiente”, reagiu, quando instado a comentar o desfecho da votação.

Depois de três tentativas goradas, em que o seu nome não atraiu os dois terços dos votos do colégio de eleitores, conforme estabelece a legislação, Sergio Mattarella obteve 665 votos – superando confortavelmente o patamar dos 505 necessários para garantir a eleição (uma maioria simples dos deputados, senadores e representantes das regiões do país). O siciliano, de 73 anos, toma posse na terça-feira para um mandato de sete anos.

Com uma carreira política acidental (como assinalava o Financial Times, o seu percurso profissional foi feito no mundo académico e o seu destino parecia ser o de tornar-se um distinto professor de Direito), e uma vida pública discreta e marcada por intervenções sóbrias mas convictas, Sergio Mattarella não é, notava a imprensa italiana, um “protagonista” óbvio. Mas isso não impediu Renzi de apostar todas as suas fichas no seu nome.

Mattarella tem um perfil de centrista e moderado, e uma reputação de homem de princípios, corajoso e incorruptível – sobretudo contra a mafia siciliana, que matou o seu irmão mais velho, Piersanti, com oito tiros à queima-roupa, em Janeiro de 1980. A família ia a caminho da missa em Palermo, e foi Sergio quem seguiu na ambulância com o irmão, que lhe morreu nos braços antes de chegar ao hospital. Os dois integravam o partido da Democracia Cristã que dominou a política italiana no pós-guerra, mas que desapareceu na década de 1990.

A presidência italiana, que é a garantia da ordem constitucional, transformou-se nos últimos anos de instabilidade política e incerteza económica, no centro de gravidade da vida política do país: em Outubro de 2011, com o colapso do executivo de Silvio Berlusconi, o experiente Napolitano iniciou um longo período de excepção, através da negociação de acordos parlamentares para evitar a convocação de eleições. Mesmo assim, nos nove anos que passou no Quirinale, Napolitano deu posse a quatro governos e ratificou duas eleições legislativas.

A eleição de Mattarella entra para a lista das importantes vitórias políticas de Matteo Renzi, que na primeira vez que teve de apostar no jogo de alto risco presidencial foi capaz de ultrapassar as resistências e de unir a indisciplinada bancada do Partido Democrático (PD), que em 2013 minou o acordo para a eleição do seu próprio candidato, Romano Prodi, forçando o Governo então liderado por Pier Luigi Bersani quase a suplicar a Napolitano que aceitasse continuar no cargo.

Desta vez, porém, o primeiro-ministro não se deixou enredar pelas maquinações dos franco-atiradores que transformam a escolha presidencial no processo institucional mais imprevisível da política italiana. Numa demonstração de “grande capacidade táctica e estratégica”, impôs a sua escolha, numa votação que para muitos analistas podia também ser interpretada como uma espécie de moção de confiança dissimulada ao seu Governo. “No caso de Renzi conseguir conter a oposição e manter a unidade da sua bancada, estaremos perante um sinal muito positivo em termos da sua agenda de reformas económicas e políticas”, antecipava o economista do Deutsche Bank, Marco Stringa, citado pela agência Bloomberg.

A eleição tinha uma importância crucial para o enérgico primeiro-ministro, que precisa de um aliado no Quirinale para fazer avançar a sua reforma política, assente numa revisão da lei eleitoral (Mattarella foi um dos autores dessa legislação nos anos 1990). O triunfo de Renzi significou mais um revés político para o seu aliado de direita Angelino Alfano, o ministro do Interior do partido Novo Centro Direita, e, assinalava o La Stampa, correspondeu a uma “retumbante derrota” para o antigo primeiro-ministro e líder do Forza Italia, Silvio Berlusconi.

O Cavaliere, que aceitou os termos propostos pelo Governo para a reforma constitucional, forçou um duelo com Renzi, numa tentativa de condicionar a escolha de um nome consensual. Perante a insistência do primeiro-ministro em Mattarella, Berlusconi deu ordem à sua bancada para romper o pacto e votar em branco, mas acabou por ser desafiado por 30 dos seus deputados.

O Presidente portuguêsfelicitou Sergio Mattarella pela sua eleição como chefe de Estado italiano, destacando o “muito que aproxima” Portugal e Itália e o empenho em “reforçar ainda mais as relações”. Cavaco Silva afirma a sua convicção de que os dois países “continuarão a tirar partido do muito que os aproxima”, quer no plano bilateral quer no âmbito da parceria europeia. 

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