Rússia aperta controlo sobre bloggers

Opositores de Vladimir Putin dizem que a nova lei vai "reduzir o número de vozes críticas e de oposição na Internet".

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O Presidente russo promulgou várias leis nos últimos dias Alexei Nikolski/Reuters

A privacidade e a liberdade dos utilizadores de Internet estão cada vez mais comprometidas em todo o mundo, mas a Rússia decidiu nos últimos dias apertar ainda mais o controlo sobre os seus bloggers. Uma nova lei, promulgada pelo Presidente Vladimir Putin, exige aos responsáveis por blogues com mais de 3000 visitas diárias que registem o seu nome e o endereço de email numa lista especial, sendo obrigados a cumprir muitas das leis que até agora só se aplicavam aos grandes meios de comunicação.

Opositores de Vladimir Putin e activistas dos direitos cívicos acusam-no de querer estancar a divulgação de informações sobre alegados casos de corrupção de indivíduos próximos do Kremlin, que na sua esmagadora maioria só chegam ao grande público através dos blogues e das redes sociais.

"Este reforço do controlo vai ser aplicado apenas para fins políticos", disse à agência Reuters o deputado Dmitri Gudkov, do partido de centro-esquerda Rússia Justa, e um dos organizadores dos protestos anti-Putin de 2011 e 2012.

Na prática, os bloggers ficam agora obrigados a cumprir todas as exigências de rigor informativo dos jornalistas profissionais, o que poderá levar muitos cidadãos a terem mais cuidado com as opiniões que veiculam nas suas páginas e sites.

"Esta lei vai reduzir o número de vozes críticas e de oposição na Internet. Todo o pacote [legislativo] parece ser bastante restritivo e poderá afectar severamente todos os que transmitem informação crítica sobre o Estado, sobre as autoridades, e sobre figuras públicas", disse ao The New York Times Galina Arapova, directora da organização não-governamental Centro de Defesa dos Meios de Comunicação.

Segundo a agência russa ITAR-TASS, se os bloggers não cumprirem as regras estabelecidas para os grandes meios de comunicação sobre o tratamento de informações relativas a "eleições, resistência ao extremismo e publicação de informação sobre a vida privada", serão multados em 10.000 a 30.000 rublos (entre 200 e 600 euros).

Mas a lei também foi muito criticada por responsáveis nomeados pelo Presidente Vladimir Putin. Depois da aprovação do documento pela Duma (a câmara baixa do Parlamento russo), há três semanas, um dos membros do Conselho Presidencial para a Sociedade Civil e Direitos Humanos, Ilia Shablinski, disse que "o verdadeiro objectivo da lei é prevenir qualquer tipo de crítica às autoridades".

No máximo, avançou então o jornal diário Novie Izvestia, o Conselho Presidencial para a Sociedade Civil e Direitos Humanos considera que a nova lei é "inútil".

"Qualquer barreira de protecção é não apenas contraproducente, mas também inútil numa rede global, que é um recurso sem fronteiras que possibilita o anonimato", disse outro membro do conselho, Aleksandr Verkhovski. "O problema é que estamos perante um caso paradoxal: tudo o que parece ser perigoso deve ser banido; no entanto, se o Estado começar a censurar a informação, estará condenado ao fracasso. Irá apenas conseguir irritar toda a gente", disse o responsável, citado pela ITAR-TASS.

Ella Pamfilova, supervisora para a área dos Direitos Humanos na Rússia (também nomeada por Vladimir Putin), disse mesmo que a lei poderia ser posta em causa se chegasse a ser analisada pelo Tribunal Constitucional. A responsável considera que a nova lei pode ter um efeito perverso, ao incitar a população a ultrapassar as restrições impostas, o que pode "levantar obstáculos ao cumprimento da legislação [geral] nas mentes dos mais jovens".

Entre as leis promulgadas nos últimos dias pelo Presidente Vladimir Putin está também a criminalização das opiniões que neguem "a memória histórica sobre os acontecimentos da II Guerra Mundial".

Para além de punir as declarações que neguem a versão das potências que derrotaram a Alemanha nazi – criminalizando o discurso neonazi –, a nova lei proíbe também "a propagação de informações falsas sobre as actividades da União Soviética durante a II Guerra Mundial", o que levou os críticos de Vladimir Putin a dizerem que o objectivo é banir as críticas a Estaline.

Vladimir Posner, o veterano jornalista e apresentador de um programa homónimo no Canal 1 russo, afirmou que esta lei visa "calar a boca de jornalistas, historiadores e escritores", que não poderão discutir publicamente "os graves erros que levaram à morte de centenas de milhares" de soldados russos durante a II Guerra Mundial – em Janeiro, os maiores fornecedores de televisão por cabo na Rússia deixaram de disponibilizar o canal privado Dozhd, que dias antes tinha perguntado aos seus espectadores se Estaline deveria ter cedido Leninegrado (actual S. Petersburgo) a Adolf Hitler para salvar a vida das centenas de milhares de soldados e civis que morreram durante o cerco à cidade, entre Setembro de 1941 e Janeiro de 1944.

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