Um fotógrafo cercado pelo Estado Islâmico

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Foi em Agosto de 2014 que o fotógrafo alemão Christian Werner se viu cercado, em conjunto com cinquenta mil yazidis, nas montanhas próximas de Sinjar, a 175 quilómetros de Lalish, no Iraque. Após o massacre de cinco a sete mil yazidis (estimativa da ONU), a frente de combate do Estado Islâmico seguiu no encalce de uma multidão em fuga que se dirigiu para as montanhas, sem água ou comida, numa tentativa desesperada de evitar novo massacre. O fotógrafo viveu em conjunto com o grupo perseguido em tendas e esqueletos de betão que passaram a servir de abrigo aos refugiados contra as ofensivas do EI. "Estávamos numa vala a trinta metros de guerrilheiros do Estado Islâmico. Conseguíamos ouvi-los falar", contou o fotógrafo ao P3, em entrevista. "Foi uma experiência perigosa. No final do ano de 2014, as montanhas estavam totalmente cercadas pelo Estado Islâmico. Dezenas de milhares de pessoas estavam confinadas às montanhas, sem comida ou abrigo de um Inverno severo. A pequena aldeia de Sherfedin, no sopé da montanha, era o único acesso ao local onde estávamos e um pequeno grupo de resistência yazidi lutava dia e noite desafiando as forças do EI. Todos os dias éramos bombardeados com morteiros e 'rockets', metrelhadoras pesadas e granadas. Planeámos ficar apenas três dias nas montanhas, mas devido ao mau tempo um dos helicópteros que vinha buscar-nos foi abatido e tivemos, afinal, de permanecer 18 dias. Sem tomar banho e com muito pouca comida, perdi 12 quilos durante este período." O fotógrafo trabalhou neste projecto durante diversos meses. "Visitei o Iraque seis vezes para dar seguimento a esta história. A experiência de fotografar num local tão inóspito despoleta uma mistura de emoções." O Estado Islâmico prometeu uma "limpeza" religiosa no Iraque e deu aos yazidis duas opções: a conversão ao islão ou a morte. Cinco a sete mil pessoas, sobretudo rapazes e homens, foram executados e aproximadamente cinco mil mulheres foram violadas por guerrilheiros e vendidas como escravas sexuais. "Quase todos os rapazes e raparigas, homens e mulheres yazidi que conheci têm histórias horríveis para contar. Conheci uma jovem rapariga de vinte e poucos anos. Ela e a mãe foram raptadas pelo Estado Islâmico e transportadas até Mosul. O seu pai e irmãos foram mortos sistematicamente, como todos os rapazes e homens da aldeia. Os seus irmãos de seis e dez anos de idade foram inspeccionados pelos guerrilheiros. Se tivessem pêlos debaixo dos braços significava que estavam prontos a combater e por isso eram mortos. Durante um longo período, os soldados voltavam, raptavam raparigas e violavam-nas. Algumas cometeram suicídio, outras foram levadas para Raqqa, onde foram vendidas como escravas sexuais a outros guerrilheiros. A rapariga que conheci teve sorte, conseguiu escapar passados nove dias em cativeiro. O trauma, no entanto, ficará para toda a vida." Desde Junho de 2014, o Estado Islâmico já executou mais de dez mil homens, mulheres e crianças em território iraquiano e sírio segundo dados recentes apresentados pela Syrian Observatory for Human Rights. Christian Werner é representado pela agência Laif e foi recentemente considerado um dos cinquenta talentos do ano apontados pela Lens Culture e seleccionado como participante da "Joop Swart Masterclass" organizada pela World Press Photo. Ana Maia