Cartas ao director

O neoliberalismo

Eu li com muito agrado o artigo de opinião escrito pelo economista e professor Ricardo Paes Mamede, publicado no jornal PÚBLICO, a 3 de Abril. O neoliberalismo é de facto o modelo mais desumano que existe neste momento no planeta e que está a destruir não só a nossa casa, o planeta Terra, como está a deslaçar os laços de fraternidade entre as pessoas, pelo excesso de competição a que nos obriga, e em nome de quê? Da acumulação cada vez maior da riqueza num grupo muito restrito de pessoas. E uma das grandes causas é o facto de certos partidos políticos nos regimes democráticos, que se auto-intitulam sociais-democratas, estarem a incorporar nas políticas que propõem o espírito do neoliberalismo.

O que precisamos, e as futuras gerações, é de políticas que promovam a cooperação entre todos nós, em vez da competição quase sem regras, produzindo assim níveis de bem-estar para todas as pessoas, em harmonia com o planeta e com as outras espécies, para podermos viver felizes e em paz.

Duarte Figueira, Lisboa

Isto nunca esteve tão mal

Popularizou-se a utilização do verbo intransitivo engonhar para se dizer tudo sem necessidade de se lhe juntar objecto directo e indirecto que lhe complemente o sentido literal; É este verbo que se me ocorre quando bebo as notícias diárias do tanto que não corre bem no país: não há médicos de família para 1,6 milhões de concidadãos; não há uma rede pública de creches para os bebés que teimam em nascer; não há lares de idosos estatais para quem levou uma vida a pagar impostos e a garantir a sustentabilidade da Segurança Social, que lhes falha na velhice; não há controlo de preços ao consumidor num momento de dramática especulação, de que ninguém se auto-acusa e que parece de geração espontânea; não há habitação para quem apenas quer uma casa para viver; não há justiça para os professores que continuam esbulhados de anos de trabalho, como se fosse coisa pouca; não há transportes públicos que cumpram a contratualização que aceitaram fazer com as áreas metropolitanas, e nada lhes importa (sequer), se nem prestam contas.

Engonhar é, portanto, e por isto tudo e não só, o que este Governo faz desde que ganhou a maioria absoluta. Não governa. Não orienta. Não planeia. Não fiscaliza. Não pede contas à economia de casino. Não ouve. Não vê… Engonha! E lá vem o fantasma dum certo outro governo passado dissertar a teoria do activismo envelhecido como sendo o único que vê e sente. Não é o activismo que é envelhecido; as políticas é que são tão velhas que a gente teve de ir buscar o activismo ao guarda-fatos, mesmo cheirando a naftalina, o activismo dos avós que não podem continuar a ver os netos a morrer à míngua por causa deste engonhar.

Maria da Conceição Mendes, Canidelo

Valores inalienáveis

Ter direito à memória colectiva a que chamamos História, assumir pulmão social e consciência ecológica, ver garantidas a saúde, a paz, as liberdades, a educação e o acesso à cultura são princípios civilizacionais inalienáveis.

Na altura em que um procurador corajoso abriu o primeiro processo que levará Donald Trump à barra dos tribunais por crimes contra as instituições democráticas do seu país (incluindo o incentivo à invasão do Capitólio), lembro que, com os seus negacionismos mais torpes (incluindo a campanha antivacinas e a desvalorização dos actos eleitorais), o seu apoio à mais insana violência extremista, a sua máquina de falsificação e manipulação dos media, o seu combate à causa ecológica e, mais, a sua assumida veia xenófoba (inspiradora de tantos bolsonaros espalhados pelo mundo), está claríssimo de que existe uma agenda montada pela extrema-direita internacional contra as democracias que, por muito imperfeitas que sejam, precisam mais do que nunca de ser salvaguardadas.

É preciso, portanto, unir esforços contra o retrocesso civilizacional a que se assiste – um retrocesso que, sob hipócritas capas de moralismo, ameaça também a cultura no seu todo, tal como a liberdade de criação e a salvaguarda dos patrimónios identitários. No nosso caso, defender os valores da Constituição de Abril, hoje tão ameaçados, é a essência.

Por isso, que salutar ar fresco nos chegou no PÚBLICO com o texto de três membros da comunidade ismaili: uma "carta aberta à sociedade portuguesa" onde se fala de igualdade, tolerância e fraternidade e se deixa aviso sério contra os seus detractores. Ainda existe lugar para a esperança.

Vítor Serrão, Santarém

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