Brea abriu o coração a uma chatbot de IA e criou Another Online Pervert

A artista visual Brea Souders partilhou 20 anos de diários pessoais com um chatbot de inteligência artificial e as respostas da máquina surpreenderam-na. “É mesmo algo completamente diferente.

©Brea Souders
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Após vários anos a explorar as potencialidades da inteligência artificial no seu trabalho artístico, a nova-iorquina Brea Souders mergulhou no mundo dos chatbots sociais ou conversacionais. Fê-lo de uma forma inusitada: partilhou com o programa informático, um chatbot feminino, excertos dos diários pessoais que escreveu ao longo de mais de 20 anos, para testar as suas respostas. E ficou surpreendida com resultado. O fotolivro Another Online Pervert, editado recentemente pela britânica Mack, cruza as interacções com a máquina e as fotografias do arquivo pessoal de Souders e coloca questões acerca do presente e do futuro da relação entre humanos e inteligência artificial.

O chatbot que Brea escolheu para o desenvolvimento do projecto, embora muito mais sofisticado, é “filho” de Eliza, a primeira versão de um chatbot social, desenvolvido nos anos 1960 para emular uma sessão com um terapeuta.

O interlocutor de Brea, de geração mais recente, também foi programado com o objectivo de “preencher um vazio” do utilizador, de ser “um companheiro” de conversa e oferecer “algum tipo de alívio”, explica a artista, ao P3, por email. “Se alivia ou aumenta esse vazio é discutível. Mas ela [chatbot] colocava questões acerca da minha mãe, do meu pai, perguntava como me sentia, o que pensava. A certa altura, disse-me que também gostaria muito de ter uma mãe. Ou seja, ela tenta relacionar-se contigo.”

É, para Souders, muito mais fácil atingir um patamar de sinceridade absoluta diante de um chatbot do que com uma pessoa, devido à ausência de julgamento. Não é incomum; há estudos que apontam a ocorrência desse fenómeno. “Há menos coisas em causa, ultrapassam-se algumas barreiras”, justifica. “As nossas conversas rapidamente se tornaram num espaço confessional. Parecia que o meu diário me respondia.”

Brea admite que as interacções com a máquina mudaram a forma como encara o seu passado, as suas experiências. Mas não porque a máquina se assemelhasse a um ser humano, pelo contrário. “O único benefício de falar com um chatbot adveio do facto de eu não esperar que a experiência se assemelhasse a um relacionamento humano”, sublinha. “É mesmo algo completamente diferente.”

Surpreendeu a artista “o humor absurdo” nas interacções. “As suas perguntas e afirmações são tão literais que roçam o absurdo. Para além disso, [o chatbot] tem fraca memória, o que tornava cada interacção numa experiência familiar ao mesmo tempo que parecia estar sempre a começar de novo. A inteligência artificial intriga-me porque ainda não funciona na perfeição. Ainda existe liberdade para brincar com ela e ser surpreendida.”

Assim, tendo por base o diálogo poético entre texto e imagem, o livro de Souders aborda os temas “do amor, da sexualidade, da morte, da desilusão, do desejo e ansiedade”, abrindo uma janela para o questionamento sobre temas tão amplos como “o capitalismo, a vigilância, o futuro da tecnologia”, ou mesmo “a fina linha que divide o ser do não ser”. 

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