Tsygankov tem contado em Girona a “lenda do ruivo”

Há uma superstição que fala da importância de ter um ruivo numa equipa de futebol. Mesmo que não a leve a sério, Tsygankov está a mostrar aos adeptos do Girona que já não passam sem o seu ruivo.

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Tsygankov soma três golos e três assistências no Girona EPA/MARISCAL

Valeriy Lobanovskiy, histórico defesa e treinador ucraniano, tinha algumas superstições. Uma delas era a de não ter nenhum n.º13 na equipa. Era também a última pessoa a entrar no autocarro e evitava pisar brechas que existissem no chão ou, no relvado, tocar com o pé nas linhas. E, segundo um artigo da UEFA, encerrava o “cocktail” de excentricidades com a crença de que uma equipa precisava de pelo menos um jogador ruivo para ter sucesso – e a ideia acabou por passar para os adeptos ucranianos.

O Dínamo de Kiev teve vários ruivos desde os tempos de Lobanovskiy e o último foi Viktor Tsygankov. Se a mística passar para os adeptos do Girona, não tarda serão eles a acreditarem que precisam de um ruivo para terem sucesso.

Tsygankov chegou ao clube espanhol em Janeiro e, em sete jogos, leva três golos e três assistências – bisou neste sábado, no empate (2-2) frente ao Rayo Vallecano.

Nascido em Israel, Tsygankov foi para a Ucrânia muito novo e chegou a ser definido por Mircea Lucescu, histórico treinador do futebol europeu, como “um dos jogadores mais talentosos” que lhe passou pelas mãos” – e isto dito por um homem que tem uma carreira de treinador com mais de 40 anos.

Aos 25 anos, é um dos melhores jogadores ucranianos da actualidade, mas exibe esse talento no modesto Girona. Porquê? Não é uma história de explicação evidente.

Cinco milhões e milhões futuros

O contrato de Tsygankov com o Dínamo acabava em Junho de 2023, pelo que no mercado de Inverno havia duas opções: regressar à Ucrânia e renovar pelo clube ou ter algum clube a chegar a acordo com os ucranianos para, a troco de qualquer coisa, levar o jogador de imediato.

A “qualquer coisa” foi uma verba de cinco milhões de euros e 50% do valor de uma futura venda – negócio bastante simpático para o Dínamo, visto que Tsygankov era um jogador praticamente perdido.

O próprio presidente do clube chegou a insurgir-se publicamente contra os agentes do jogador, depois de Tsygankov ter recusado as propostas de renovação que lhe foram apresentadas pelo emblema de Kiev.

Mas porquê escolher o Girona? Tsygankov já estava a viver em Espanha há alguns meses, com todas as condições de treino para se manter em forma, e o seu agente, Pere Guardiola, queria arranjar-lhe um clube espanhol.

O problema é que no mercado de Janeiro poucos clubes quiseram chegar-se à frente nas condições que o Dínamo exigia, nomeadamente o FC Porto, que chegou a ser associado ao jogador, mas os três milhões anuais que Tsygankov pedia eram esfriaram os intentos portistas.

Outra hipótese sugerida foi Guardiola, irmão do treinador do Manchester City, estar a querer colocar uma estrela na rede de influência no Girona, que poderá abrir, mais tarde, as portas do City. E Tsygankov parece ser, neste momento, jogador a mais para clube a menos.

Tsygankov “à Robben”

Quer pelo talento precoce quer pela cor do cabelo, Tsygankov atraiu atenções desde cedo, na formação do clube da capital ucraniana.

Foi titular desde os 19 anos, destacando-se na criação de futebol ofensivo – pode actuar pelas alas ou atrás do avançado –, mas não só. Nas últimas quatro temporadas superou sempre os 15 golos, tendo, como movimento de assinatura, as jogadas da direita para o meio, utilizando o talento do pé canhoto.

Ainda pelo Dínamo, chegou a provocar uma piada no Brasil. Em 2021, quando o Dínamo defrontou o Benfica na Liga dos Campeões, Tsygankov falhou uma oportunidade flagrante de golo. Na altura, daria o 1-0 ao Dínamo e colocaria em risco a qualificação. Como falhou, os “encarnados” acabaram por chegar ao triunfo e eliminarem o Barcelona.

Moral da história: Jorge Jesus ficou no clube, quando se pensava que uma eliminação europeia lhe daria saída precoce. Na imprensa brasileira chegou a escrever-se que Tsygankov passou a inimigo número um dos adeptos do Flamengo, sedentos de terem Jorge Jesus sem emprego – “que Tsygankov nem pense passar o Carnaval no Rio”, ironizou o cronista Juca Kfouri.

O ucraniano preferiu antes passar o último Carnaval na Catalunha, mas nem isso lhe acelerou a adaptação. Quique Carcel, director-desportivo do Girona, chegou a dizer que a adaptação de Tsygankov estava a ser dificultada pela língua, porque o jogador não fala castelhano e precisava de tempo para entender as indicações do treinador.

Agora, o problema parece estar ultrapassado, até porque a linguagem deste ala é fácil de entender: bola no pé esquerdo e movimento da direita para dentro. O Girona só tem de deixar-se levar... até que o City vá lá buscá-lo.

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