Se costuma ler esta newsletter, contribuiu para que Portugal seja um dos países que mais consome jornalismo por email, atrás da Áustria e da Bélgica, e empatado com os EUA. 

É compreensível que tenha encolhido os ombros (literal ou figurativamente) ao ler o parágrafo acima. Nas últimas duas semanas, a pequena bolha de nerds dos media (uns quantos académicos e jornalistas, onde se inclui o autor destas linhas) cumpriu o ritual de devorar, dissecar e discutir o Reuters Digital News Report, um relatório anual sobre o consumo de notícias na era digital

A maioria dos dados é irrelevante para quem esteja fora do esforço de fazer e tentar rentabilizar notícias nos últimos 20 anos, durante os quais a Internet se massificou e trocou as voltas ao sector, de formas bem conhecidas, embora não necessariamente bem percebidas.

 
           
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Porém, há pontos que ajudam a perceber o ruidoso espaço público na era digital e o funcionamento do quarto pilar das democracias – que, na paráfrase habitual, não são apenas o pior sistema de governo à excepção de todos os outros; são também um sistema cuja saúde depende, em parte, de um sector que precisa de ser rentável para cumprir com eficácia o seu papel de escrutínio e informação. 

Olhemos para três conclusões.

O bom
Tal como nos anos anteriores, Portugal está nos lugares cimeiros da tabela de países onde as pessoas mais confiam em notícias. Ficou em segundo lugar, empatado com a África do Sul e atrás da Finlândia.

Num indicador relacionado, os utilizadores em Portugal estão entre os que menos consideram haver polarização política na comunicação social ou seja, é um dos mercados onde mais pessoas acham que os media não se distanciam politicamente uns dos outros. Esta é uma percepção transversal a consumidores que se identificam como sendo esquerda, de direita e do centro. 

Curiosamente, apesar do nível confiança, apenas um terço acha que os media portugueses são independentes de influências políticas ou económicas. Temos, portanto, uma estranha forma de confiar.

O mau
Também como de costume, Portugal está entre os países que menos pagam por notícias online: 12% dos utilizadores fizeram algum tipo de pagamento, abaixo da média de 17%. Na Noruega, este número é de 41%; no Reino Unido, de 9% (o Reino Unido tem muitas ofertas de jornalismo de acesso gratuito, entre as quais o Guardian e a BBC, que é financiada pelos contribuintes).

Ser dos países que mais confiam, mas dos que menos pagam é sempre um antagonismo digno de nota. Haverá muitas razões para isto, a começar pelos salários comparativamente baixos. 

O pior
Estamos fartos de notícias.

Em Portugal, quase três em cada quatro utilizadores evitam activamente notícias, pelo menos ocasionalmente. Um em cada dez fá-lo frequentemente. Em 2017, estes números eram muito diferentes. Têm vindo a piorar ao longo dos anos.

Entre os que evitam notícias, a primeira razão que referem é haver demasiadas notícias sobre a covid e sobre política (em Janeiro tivemos eleições legislativas). A segunda razão é um cansaço devido ao excesso de notícias. E a terceira é o facto de as notícias afectarem negativamente o humor. O inquérito foi feito numa altura em que a invasão da Ucrânia, e a respectiva avalanche noticiosa, não tinha sequer começado.

Portugal tem ainda a distinção de ser o país onde mais pessoas consideram que se deparam com demasiadas notícias nos seus feeds do Facebook. A rede social parece ter acertado quando, há uns anos, disse que os utilizadores estavam mais interessados na família e nos amigos, e ajustou os algoritmos em conformidade. 

Estarmos fartos de notícias não é só um problema para quem trabalha nos media. Nem sequer é esse o principal problema. Estarmos fartos de notícias é um fenómeno compreensível, tendo em conta a pandemia, uma guerra na Europa e a hiperconectividade em que vivemos. Significa, contudo, estarmos fartos do mundo para além daquele que nos é mais próximo. Significa estarmos dispostos a viver num mundo mais simples, mais pequeno e mais ignorante. No imediato, é mais confortável. No fim, perdemos todos.