"O engenheiro mais conhecido do mundo deu a si próprio outro problema grandioso para resolver" – é o subtítulo da Economist num artigo sobre os planos de Elon Musk para o Twitter.

É, também, uma frase que sintetiza o prisma funcional com que têm vindo a ser encarados os desafios das grandes plataformas de discurso público, vulgarmente conhecidas por redes sociais. 

Vivemos o mito dos engenheiros: a ideia de que estes, sendo capazes de olhar para as entranhas dos sistemas do nosso mundo tecnológico, serão capazes de identificar os problemas, repará-los e pôr tudo a funcionar melhor.

A questão é que o problema daquelas plataformas – ao contrário das baterias para automóveis eléctricos e da exploração espacial – não é um problema de engenharia, mesmo que em sentido lato. Não se trata de afinar regras e algoritmos, de experimentar para ver o que funciona, de lançar novas funcionalidades ou de optimizar recursos (embora tudo isso possa ser útil e permitir melhorias incrementais). Esta é, sobretudo, uma questão de ponderação de valores e de definirmos, colectivamente, como queremos que funcione a "praça pública".

Não é tarefa fácil, para o engenheiro Musk (que é formado em física e economia) ou para qualquer outra pessoa. 

Não é, ainda, uma questão nova, embora o emaranhamento das nossas vidas nas plataformas digitais lhe tenha dado contornos específicos. E é uma questão para a qual estariam mais bem preparados políticos, juristas, historiadores, filósofos ou sociólogos (os quais, naturalmente, não têm 44 mil milhões de dólares para comprar uma rede social). Engenheiros (não no sentido académico do termo) como Mark Zuckerberg ou Jack Dorsey já tiveram a sua vez e os resultados estão à vista. Não é exigível mais: não se pede a quem constrói um piano que também o saiba tocar.

O Facebook parece já o ter percebido: em 2020 criou um grupo independente para rever as decisões da rede social no que diz respeito a assuntos como a conta de Donald Trump. Do grupo fazem parte, entre outros, uma jornalista e activista do Iémen que recebeu o Prémio Nobel da Paz em 2011; um advogado brasileiro especializado em propriedade intelectual; uma antiga directora geral do Ministério da Justiça de Israel; e o ex-director do jornal Guardian. A eficácia é duvidosa, mas o conceito diz muito.

Quanto a Musk, vamos-lhe conhecendo, em traços largos, as ideias que tem para o Twitter. No geral, passam por uma visão maximalista da liberdade de expressão. É possível que algumas das medidas concretas venham a ter efeitos positivos; esperemos que sim.

Entretanto, a aquisição teve o condão de pôr todo o tipo de opinadores a falar do assunto, incluindo aqueles que habitualmente não andam por estas latitudes. A secção de opinião do PÚBLICO é um bom exemplo disso. Estamos agora a ter, finalmente, a dimensão de discussão que deveríamos ter tido há anos. 

Digno de nota

- A Comissão Europeia acusou a Apple de abuso de posição dominante, ao privilegiar no iPhone o uso do Apple Pay, o seu próprio sistema de pagamentos, limitando o uso de produtos concorrentes. Em termos formais, a multinacional foi notificada da posição preliminar da Comissão, o que significa que o processo ainda está a dar os primeiros passos. Como se viu noutros casos (entre os quais, os do Google) estas investigações de Bruxelas por questões concorrenciais podem durar anos.

- Os telemóveis do primeiro-ministro espanhol e da sua ministra da Defesa estavam infectados com o software de espionagem Pegasus. No ano passado veio a público que a ferramenta, de origem israelita, era usada para espiar políticos, jornalistas e activistas em vários países. O Parlamento Europeu abriu em Março deste ano uma comissão de inquérito sobre o assunto, a primeira desde 1992.

- As videochamadas reduzem a criatividade, concluiu um estudo publicado na revista Nature. Dois investigadores, das universidades de Columbia e Stanford, nos EUA, juntaram pessoas em pares; alguns conversavam por videochamada, enquanto outros faziam-no presencialmente. Aqueles que conversavam cara a cara tinham mais ideias e ideias consideradas mais criativas. 

- Não será para todos, mas é um passo no caminho de um consumo mais sustentável: a Apple lançou um já anunciado programa para os utilizadores poderem reparar os próprios iPhones. A empresa disponibilizou manuais e peças. Mas o programa ainda só existe nos EUA.