Líderes europeus aprovam segundo pacote de sanções contra a Rússia, já a pensar no terceiro

Novas medidas restritivas assentam em cinco pilares — sector financeiro, energia, transportes, controlos de exportações e política de vistos — e deverão ser adoptadas já esta sexta-feira. São sanções de “máximo impacto” sobre a economia e as elites políticas russas, destinadas a responsabilizar o Kremlin pela guerra na Ucrânia.

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EPA/JOHANNA GERON / POOL

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Foi um longo dia de choque e nervos, o primeiro de um novo conflito em solo europeu, que já se tinha tornado tão previsível como inevitável. Seguindo o seu guião, o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, deu a ordem que faltava às suas tropas para avançarem sobre a Ucrânia; cumprindo a sua palavra, os líderes da União Europeia desenharam um novo pacote de sanções e medidas restritivas sobre a economia e as elites políticas russas — reservando-se o direito de apertar ainda mais o garrote, se o Kremlin não inverter o rumo, cessar as hostilidades e retirar as suas forças do país vizinho.

“Este é um pacote de sanções maciças, direccionadas e de máximo impacto, para responsabilizar o Kremlin”, anunciou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que criticou a escolha de Vladimir Putin de “trazer de volta a guerra” para redesenhar os mapas da Europa, mas prenunciou o seu falhanço. “Tentou o seu melhor para nos dividir, mas falhou por completo. Conseguiu exactamente o oposto: estamos mais unidos do que nunca, e estamos determinados”, garantiu.

Conforme explicou a chefe do executivo comunitário, as novas medidas que os chefes de Estado e de Governo da UE acertaram, após mais de cinco horas de reunião, em Bruxelas, assentam em cinco pilares: o sector financeiro, a energia, os transportes, os controlos das exportações e a política de vistos. Os textos jurídicos com o detalhe de todas as medidas foram fechados enquanto os líderes discutiam, e serão revistos esta sexta-feira de manhã, para a adopção (e imediata implementação) pelos ministros dos Negócios Estrangeiros na reunião extraordinária do Conselho da UE convocada pelo alto-representante para a Política Externa e de Segurança, Josep Borrell, na mesma semana.

As sanções financeiras, que visam 70% do mercado bancário da Rússia e as principais empresas estatais, incluindo as da defesa, vão cortar o acesso do Estado e das elites aos mercados de capitais mais importantes. “Estas sanções aumentarão os custos de financiamento da Rússia, aumentarão a inflação e desgastarão gradualmente a base industrial do país”, estimou Von der Leyen. Quanto aos oligarcas amigos do Presidente Putin, as medidas vão restringir os seus depósitos e impedir que possam continuar a esconder o seu dinheiro na Europa.

O segundo pilar diz respeito ao sector energético, e abrange uma proibição de exportação de petróleo, “impossibilitando a Rússia de modernizar as suas refinarias petrolíferas, que rendem receitas de mais de 20 mil milhões de euros por ano.

As sanções na área dos transportes passam pela proibição da venda de “aeronaves, peças sobressalentes e outros equipamentos construídos na União Europeia” às companhias aéreas russas. Além disso, a UE vai impor controlos às exportações de tecnologias tais como semicondutores.

“Finalmente, nos vistos, diplomatas e outros altos funcionários e empresários deixarão de ter acesso privilegiado à União Europeia”, concluiu Ursula von der Leyen.

Fazer a Rússia pagar

“A Rússia passou da violação do direito internacional à acção de guerra”, assinalou o primeiro-ministro, António Costa, justificando a escalada da resposta europeia, apenas um dia depois da adopção de um primeiro pacote de sanções que tinham deixado insatisfeitos os líderes ucranianos e sido consideradas frouxas por vários observadores. “No dia em que a Rússia reconheceu a independência de duas províncias separatistas, a UE aprovou imediatamente um primeiro pacote de sanções para a dissuadir de prosseguir a escalada. Tendo agora passado à guerra generalizada na Ucrânia, a UE aprovou um segundo pacote, que é muito mais extensivo e atinge sectores estratégicos da economia, para fazer a Rússia pagar pela sua acção militar”,

E como não há duas sem três, os líderes da UE admitem que um terceiro pacote de sanções poderá chegar tão rapidamente como o segundo. “Obviamente, se a Rússia prosseguir a sua acção, a UE considerará a adopção de medidas suplementares”, afirmou António Costa, sem querer especular se nessa terceira vaga os 27 avançariam com as sanções mais drásticas e com maiores impactos na economia europeia, como a suspensão das importações de gás natural e petróleo ou a exclusão da Rússia do sistema de transferências monetárias internacionais SWIFT.

“Muitos de nós concordamos que a Rússia tem de ser afastada do SWIFT, mas é preciso unanimidade para poder aprovar esta acção de forte impacto relacionada com o sistema de pagamentos, e ainda não estamos nesse ponto”, reconheceu o primeiro-ministro da Polónia, Mateusz Morawiecki, no final da reunião especial do Conselho Europeu. Porém, anteviu, “já não faltará muito” para haver um consenso nessa matéria.

Apoio e solidariedade

Onde não faltou acordo entre os 27 foi na necessidade de estudar e precaver as consequências nefastas das sanções — e sobretudo das previsíveis contra-sanções — sobre a economia dos Estados-membros. A Comissão ficou encarregada de elaborar um plano para minorar o impacto deste novo estado de guerra nos preços da energia, e de preparar medidas de apoio ou derrogações em matéria de política de concorrência (ajudas de Estado).

Houve acordo, ainda, quanto à necessidade de garantir o apoio humanitário às populações ucranianas deslocadas pelo conflito, e de seguir o princípio da solidariedade na recepção e acolhimento de refugiados principalmente pelos Estados-membros que têm fronteiras com a Ucrânia. Nesse aspecto, Portugal manifestou “total disponibilidade para partilhar a obrigação de assegurar protecção internacional” aos cidadãos ucranianos afectados pelo conflito, com o primeiro-ministro a confirmar a abertura para receber familiares e amigos dos membros da comunidade ucraniana residente no país.