António Costa e a teoria do poço

O resultado de domingo é uma vitória de um Homem. Sendo do PS e dos seus militantes, é, quase em absoluto, de Costa. Confirma-se uma ligação profunda entre o lisboeta que entende o país, o país que entende e gosta do lisboeta.

Costa é um político surpreendente. Eu, que o conheço há mais de quarenta anos, fico sempre admirado com a sua capacidade de perceber o caminho, de estar à altura de cada circunstância.

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Costa é um político surpreendente. Eu, que o conheço há mais de quarenta anos, fico sempre admirado com a sua capacidade de perceber o caminho, de estar à altura de cada circunstância.

Quando era seu secretário de Estado, entre 2005 e 2007, foram muitas a situações difíceis que nos bateram à porta. Costa sempre soube encontrar uma solução. Nasceu aí a teoria do poço - podemos sair sem um braço ou uma orelha, mas sairemos sempre vivos.

Na comissão política que avaliou as cedências à esquerda da esquerda a propósito do Orçamento do Estado para 2022, cedências que eu próprio militantemente reclamava, a sua intervenção conteve uma frase que me ficou até hoje - há muito mais país para além das sondagens e dos comentadores.

Assim foi! O resultado de domingo é uma vitória de um Homem. Sendo do PS e dos seus militantes, é, quase em absoluto, de Costa. Confirma-se uma ligação profunda entre o lisboeta que entende o país, o país que entende e gosta do lisboeta. Em democracia é caso único, porque os outros primeiros-ministros que fizeram legislaturas completas eram todos originários de distritos do interior.

Este resultado é ainda mais surpreendente porque se segue à mais profunda crise vivida no último século. Churchill, que havia ganho a guerra, perdeu as eleições. Costa ainda não ganhou a guerra da pandemia, mas ganhou, com um resultado extraordinário, as eleições.

O que aconteceu durante a campanha para que se instalasse o medo, em alguns momentos o desalento? O que levou a que as sondagens tivessem colocado Rio em posição de poder ser chefe do Governo?

Se olharmos bem, as sondagens de Rio não eram mais do que os votos consolidados da direita. E que veio a acontecer foi a aposta, quase em peso, dos indecisos no PS e a sova merecida dos eleitores da esquerda da esquerda que fugiram ao Bloco de Esquerda e ao PCP.

Mas foi também o medo de que, ao arrepio do que acontece na Europa, Rio fizesse um governo com a extrema-direita. O exemplo dos Açores e as suas afirmações dos últimos dias, de que haveria uma “geringonça” à direita mesmo que o PSD não ganhasse, fez com que a perda fosse ainda maior.

Um olhar para o PSD profundo pode dizer-nos duas coisas: 1) nos concelhos onde o PSD tem largas percentagens, o resultado de ontem foi muito menor; 2) nos distritos onde figuras relevantes do PSD foram afastadas, Rio ressente-se de forma dramática.

A unidade laranja era aparente. A fruta estava viçosa por fora, porque havia sido limpa por muitas Claras Ferreira Alves, Marias João Avilez e Joões Miguel Tavares, mas por dentro…

O que se segue agora? O PS vai ter, ao fim de seis anos de governos de emergência, possibilidade de promover uma grande transformação do país. Nos primeiros quatro teve de reverter as medidas da troika, nos últimos dois teve de fazer frente a uma desgraça sanitária.

Costa ganha a sua presença na eternidade política. Pode igualar, até ultrapassar os mandatos de Cavaco, como escrevi, aqui no PÚBLICO em 11 de novembro de 2019. Portugal é o seu destino, mais do que a Europa. Tem agora a obrigação de nos dar quatro anos de bom e fresco governo, com ministros plenos de autonomia e saber, com uma estrutura inteligível e funcional, com uma visão para fora, assumida pelo líder, e clareza nas opções, para dentro, autorizada aos executores.

O PS, afirma-se como o grande partido. Volta ao centro-esquerda, o sítio que sempre foi seu e que mais se cola ao sentir dos portugueses.