Farto do chefe? Não se preocupe, chegou a DAO

São uma novidade muito recente, mas já com casos de uso promissores e uma enorme comunidade de fãs. Mark Cuban prefere chamar às DAO “a combinação perfeita de capitalismo e progresso”.

Quem nunca se sentiu farto do chefe ou rodeado de idiotas no local de trabalho? Sobre maus chefes e empregados preguiçosos já muito se disse mas não tanto como Thomas Erikson no seu livro Rodeado de Idiotas. Felizmente a solução para ambos os problemas está a chegar através da tecnologia e de um novo tipo de organizações denominadas DAO, do inglês “Decentralized Autonomous Organization” ou, em português, “Organização Autónoma Descentralizada”. São uma novidade muito recente mas já com casos de uso promissores e uma enorme comunidade de fãs. Mark Cuban prefere chamar às DAO “a combinação perfeita de capitalismo e progresso”.

Imagine que podia transformar qualquer organização em milhares de linhas de código construindo um enorme programa de computador com regras claras, transparentes para todos e que fossem geridas e alteradas apenas de acordo com a vontade de todos os membros da organização, sem qualquer tipo de influência de uma estrutura central, de uma comissão executiva ou de um conselho de administração. Esta é a receita de uma DAO. As DAO têm vindo a proliferar nos últimos cinco anos e, em 2021, ganharam uma relevância especial. A primeira experiência de DAO foi numa organização chamada de “The DAO” que conseguiu angariar em crowdfunding 150 milhões de dólares para investimentos em capital de risco mas que acabou por sofrer um ataque devido a vulnerabilidades no código.

A base tecnológica que permite lançar este tipo de organizações é suportada pela blockchain, através de distribuição segura e transparente de dados na rede e de sistemas de confiança que extravasam as relações humanos ou contratuais e evoluem para relações tecnológicas. Vitalik Buterin, o guru de blockchain e criador da rede Ethereum, um talento russo que com 19 anos liderava já esta revolução tecnológica e que tem a sua fortuna pessoal avaliada em cerca de 1,5 mil milhões de dólares, foi dos primeiros a sugerir que uma DAO pudesse funcionar no futuro sem qualquer intervenção humana e com toda a gestão assegurada pelas regras do programa e pelos contratos inteligentes registados na rede. A rede de Vitalik é uma das principais a suportar esta tecnologia e tem um valor de mercado de 400 mil milhões de dólares.

Uma DAO pode funcionar de forma aberta, sendo acessível a qualquer pessoa que se queira juntar à organização, ou através de controlos privados, por exemplo com recurso a um NFT que serve de cartão de entrada. Uma vez na DAO cada pessoa pode realizar um conjunto de tarefas com que se sinta mais confortável, a remuneração será associada à velocidade e qualidade da execução dessa tarefa, sendo esses critérios medidos através das regras de programação da própria DAO. O chefe tradicional é assim substituído por uma máquina não emotiva e apenas racional que mede a qualidade do trabalho executado e remunera os participantes, participantes esses que poderão também ser membros da DAO e, consequentemente, decisores do futuro da própria organização. As atuais ações de uma empresa tradicional são assim também substituídas por esta representação ou moeda de troca existente dentro da DAO que tem poder de voto e de veto e que define o futuro e estratégia da organização.

Uma DAO permite também revolucionar os modelos de remuneração e incentivos que hoje existem, evoluindo de um mundo que ainda remunera por tempo (as famosas 7 ou 8 horas por dia num escritório) para um mundo que remunera atividades concluídas, tempos de entrega, qualidade e eficiência – tudo de forma programada e sem interpretações subjetivas de chefias. Podem assim terminar os horários de trabalho, os dias úteis e os fins-de-semana, as limitações de fusos horários e as limitações de trabalhar apenas para uma determinada empresa ou projeto. Será também muito mais fácil contratar profissionais para uma determinada área, pois o seu historial de entrega e qualidade será materializado em indicadores concretos e comparáveis. Deverá ser um mundo de trabalho mais justo, mais eficiente e mais meritocrático.

Existem já vários casos de aplicações reais da DAO. O Dash é um exemplo que nos chega de 2015 de como uma organização pode gerir a sua estrutura corporativa e alocação de fundos financeiros. A Augur, que funciona desde 2018, é uma plataforma de previsões e aposta em valores de mercado que é gerida através de DAO. A Steem virou as suas atenções para a blogosfera e redes sociais e opera desde 2016 e, por fim, já em 2021 nasce a DeveloperDAO que é um caso curioso de como comunidades de programadores, designers, escritores e trabalhadores independentes na área do digital se podem organizar com uma DAO para construir a nova versão da Internet – a Web3.

Os desafios que existem em relação às DAO são tremendos, vão desde o seu impacto social e laboral, até a questões legais e regulatórias, passando por cibersegurança. As DAO poderão ser o caminho de libertação total do tal chefe indesejado ou dos trabalhadores preguiçosos mas não estará certamente para os próximos anos uma implementação massiva desta tecnologia, por isso, até lá, o melhor mesmo é habituarmo-nos ao chefe, à equipa e aos colegas de trabalho porque ainda não há DAO que nos valha! Em caso de desespero há já várias referências a funcionar neste formato e 2021 foi o ano de maior criação de equipas de gestão totalizando 700 mil pessoas de todo o mundo a participar na tecnologia.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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