O que tornou o gato malhado? Um gene, claro

Na base teórica da descoberta está um artigo de Alan Turing, um dos pais da ciência da computação. Formação de padrões do pêlo começa logo no embrião.

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Os gatos malhados podem ter muitos padrões diferentes Reuters/THOMAS PETER

De onde vem a extraordinária diversidade dos padrões dos gatos malhados? Tigrados, listados, manchados, há todo um reportório possível. A resposta baseia-se na genética, mas esse processo não é bem compreendido. Cientistas norte-americanos identificaram um gene nos gatos domésticos que desempenha um papel determinante para a formação do padrão malhado, logo no tecido embriónico dos gatinhos, ainda antes de os folículos do pelo começarem a crescer.

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De onde vem a extraordinária diversidade dos padrões dos gatos malhados? Tigrados, listados, manchados, há todo um reportório possível. A resposta baseia-se na genética, mas esse processo não é bem compreendido. Cientistas norte-americanos identificaram um gene nos gatos domésticos que desempenha um papel determinante para a formação do padrão malhado, logo no tecido embriónico dos gatinhos, ainda antes de os folículos do pelo começarem a crescer.

Os criadores de gatos conhecem bem a hereditariedade dos padrões do pêlo, e sabem como criar gatos com determinada pelagem. O mistério, diz o artigo publicado na revista Nature Communications por cientistas do Instituto Hudson Alpha de Biotecnologia, no Alabama, e da Faculdade de Medicina da Universidade de Stanford, na Califórnia, está em saber o que faz com que algumas células dos embriões sigam um caminho de desenvolvimento que levará a uma pelagem mais escura, e outras células a um pêlo mais claro.

“Julgo que obtivemos a primeira compreensão de quais as moléculas que estão envolvidas” na formação destes padrões, disse ao New York Times Gregory Barsh, um dos autores do artigo científico. 

A base teórica do trabalho desta equipa está num artigo de 1952 de Alan Turing, o génio britânico pioneiro da informática e que ajudou a quebrar o código das máquinas criptográficas Enigma, que os alemães usavam para comunicar secretamente durante a II Guerra Mundial. Mas no artigo “A base química da morfogénese”, Turing “lançou os alicerces daquilo que veio a ser a biologia matemática”, explicou Gregory Barsh ao Times.

O artigo de Turing descreve uma reacção de difusão, na qual dois químicos, um que estimula a actividade de um gene e outro que a inibe, pode resultar em padrões regulares e alternados – como as listas dos gatos, pensaram os investigadores que estudam como se desenvolvem os padrões do pêlo dos animais.

O trabalho publicado na Nature Communications confirma esta hipótese, e pela primeira vez mostra que o gene Dkk4 e a proteína cujo fabrico comanda são essenciais para a formação desse padrão no pelo, sendo que o Dkk4 actua como inibidor nesse processo.

A investigação foi feita graças à colaboração com iniciativas para capturar e esterilizar gatos sem dono, e depois libertá-los, para evitar a sua proliferação. Muitas fêmeas submetidas a este procedimento estão já grávidas mas os embriões estão numa fase muito inicial de desenvolvimento para serem viáveis, e normalmente são deitados fora. Os cientistas recolheram os tecidos embrionários para estudar como se desenvolvem os padrões do pêlo, explicam no artigo.

Os cientistas descobriram um padrão de áreas finas e espessas na camada superior da pele embriónica, que nunca antes tinha sido reportado, diz o New York Times. Estas regiões copiam o que acontece com os padrões de pigmentação nos gatos adultos.

Então, os investigadores procuraram os genes que poderiam estar activos durante essa fase de desenvolvimento embrionário, e a molécula que mais se destacou foi a produzida pelo gene Dkk4. Aliás, havia quantidades diferentes de Dkk4 nas áreas de tecido espessas e finas, o que levou os cientistas a perceber que esta molécula inibe os genes que produzem outras moléculas que estão activas durante o desenvolvimento embrionário, chamadas proteínas Wnt.

Ainda assim, a equipa frisa no artigo científico que os padrões que investigaram agora são apenas “uma fracção da diversidade de padrões que existem nas variedades de gatos domésticos”. Há ainda muito para estudar.