Qual é a melhor memória que guarda com os avós?

Várias personalidades responderam à mesma pergunta. As respostas variam, mas, invariavelmente, é o carinho do colo dos avós e o sorriso terno que se destacam entre as recordações.

Foto
Adriano Miranda

São eles a dar colo e mimos incondicionalmente, a defender os netos, a dar um chocolate às escondidas e a alinhar em todas as brincadeiras. São os avós. Esta segunda-feira, celebra-se o Dia dos Avós. A data celebra-se a 26 de Julho, por influência da Igreja Católica, que assinala, neste dia, a festa de Santa Ana e São Joaquim, os avós de Jesus, pais de Maria. A propósito da efeméride, o PÚBLICO fez uma pergunta a várias personalidades. O médico intensivista Gustavo Carona, a escritora Catarina Raminhos, a actriz Lídia Muñoz, o nutricionista Pedro Carvalho, a jornalista Isabel Stilwell, a enfermeira Carmen Garcia, a compositora Ana Stilwell e o realizador Miguel Gonçalves Mendes respondem a “Qual é a melhor memória que guarda com os seus avós?”.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

São eles a dar colo e mimos incondicionalmente, a defender os netos, a dar um chocolate às escondidas e a alinhar em todas as brincadeiras. São os avós. Esta segunda-feira, celebra-se o Dia dos Avós. A data celebra-se a 26 de Julho, por influência da Igreja Católica, que assinala, neste dia, a festa de Santa Ana e São Joaquim, os avós de Jesus, pais de Maria. A propósito da efeméride, o PÚBLICO fez uma pergunta a várias personalidades. O médico intensivista Gustavo Carona, a escritora Catarina Raminhos, a actriz Lídia Muñoz, o nutricionista Pedro Carvalho, a jornalista Isabel Stilwell, a enfermeira Carmen Garcia, a compositora Ana Stilwell e o realizador Miguel Gonçalves Mendes respondem a “Qual é a melhor memória que guarda com os seus avós?”.

“Estará sempre viva e a sorrir nas minhas memórias”

Gustavo Carona, médico intensivista e cronista do PÚBLICO

Foto
Adriano Miranda

A minha avó tinha 17 netos. Tinha olhos claros e doces, sorriso fácil e um sentido de humor apurado. Tinha a simplicidade de quem gostava de ter as mãos na terra e brincar com os cães o dia todo, e a abertura de mundo de falar várias línguas fluentemente mesmo até chegada aos dias em que os esquecimentos eram a norma. Muitas vezes surpreendia-me com um sussurro ao ouvido, para que mais ninguém ouvisse: “Gustavo, és o meu preferido!”. E seguia o seu caminho, algo em desequilíbrio e com um sorriso maroto. Eu adorava a minha avó e por isso ficava todo contente, mas hesitava entre o desconforto do privilégio e a possibilidade de não ser verdade. Este mistério deixava-me maravilhado, nunca lhe perguntei em vida, nem nunca perguntei à minha irmã ou aos meus primos, mas desconfio que ela dissesse o mesmo aos outros 16... Estará sempre viva e a sorrir nas minhas memórias.

“De ver sempre nela um colo disponível e um sorriso nos lábios”

Catarina Raminhos, escritora, autora de Catarina, uma Incrível História Banal

Foto
DR/João Marques

As memórias com a minha avó Deolinda são todas doces, serenas e felizes. Recordo-me de ela cozinhar coisas que eu gostava de comer, de me ensinar a fazer ponto cruz, de ir com ela apanhar figos e de irmos a pé ao mercado, que ficava a dois quilómetros de casa. De comer aquele bolo de canela e noz que ela fazia como ninguém e de a ajudar a fazer pão, que colocávamos em cima de uma folha de couve e levávamos ao forno. De ver sempre nela um colo disponível e um sorriso nos lábios — mesmo quando a vida não lhe dava muitos motivos para sorrir. 

“São as melhores memórias que tenho”

Lídia Muñoz, actriz, neta de Eunice Muñoz

Foto
Teresa Pacheco Miranda

Escolher um momento de todos os momentos que guardo na minha memória com a minha avó, é difícil. Porque todas as memórias que tenho com ela são as melhores memórias que tenho. E melhor ainda é poder continuar a construí-las dia após dia.

“Torradas de fogão com manteiga”

Pedro Carvalho, nutricionista e cronista do PÚBLICO

Foto
Nelson Garrido

Falar da minha avó é falar da cevada e das torradas de fogão com manteiga impecavelmente preparadas para quando o neto chegasse da escola ao som da Rádio Clube de Matosinhos, do refresco de groselha a acompanhar as refeições, das omeletes de sardinha que só ela sabia fazer e do armário das lambarices onde só podia tirar dois Sugus por dia. Parece irónico que seja um nutricionista a falar de todas estas coisas aparentemente desequilibradas. Mas esta é a magia da alimentação: a de nos fazer viajar no tempo para a época onde esses sabores ficaram gravados na memória.

“Os lanches eram memoráveis”

Isabel Stilwell, escritora e jornalista, co-autora das Birras de Mãe

Foto
Nuno Ferreira Santos

No Dia dos Avós, apetece-me falar da minha tia-avó Genoveva, que me mimou tanto. Não tinha filhos, e adoptou-me a mim, e aos meus irmãos, como verdadeiros netos. Lia-me histórias — lembro-me de, num misto de antecipação e alegria, ir procurar numa prateleira atrás de uma cortina de veludo o Little Lord Fauntleroy, que estávamos a ler juntas. O livro era lindo e deixou-mo em herança. Em casa dela e do tio Pedro, os lanches eram memoráveis, scones e limonada e, no verão, gelados do Santini. Era sempre tão acolhedora, generosa, atenta. E eu não tinha medo nenhum dela, em contraste com o medo que sentia da minha avó paterna, uma mulher admirável, fortíssima, de quem aprendi a gostar, mas já mais crescida. A minha avó materna vivia em Inglaterra, muito presente através da minha mãe, mas não no dia-a-dia. Por isso, sim, neste dia, é sobretudo a tia Genoveva que me vem à memória. Com uma imensa saudade.

“O meu coração ficou tão quentinho e aconchegado” ​

Carmen Garcia, enfermeira, autora de A Mãe Imperfeita cronista do PÚBLICO

Foto
Miguel Manso

Num dia frio de Inverno, cheguei com a minha mãe a casa dos meus avós. Tínhamos ido a pé e, apesar do guarda-chuva, estávamos molhadas. Os meus avós estavam sentados à camilha e quando nós chegámos fomos sentar-nos com eles. A braseira acesa dava um calor tão bom... E a minha avó foi fazer-nos torradas na frigideira, que barrou com a banha corada de fritar a carne do dia anterior, e um chá. O meu coração ficou tão quentinho e aconchegado. Nunca comi nada que me soubesse tanto a amor.

"Sentia-me um bocadinho neta única”

Ana Stilwell, cantora e compositora, co-autora das Birras de Mãe

Foto
INSTAGRAM/Ana Stilwell

Uma das melhores memórias que tenho com os meus avós maternos é de ir apanhar amoras em Sintra. Apesar de sermos muitos primos, durante o verão, os meus avós ficavam a dormir em minha casa e, durante esses passeios, sentia-me um bocadinho neta única. Com os meus avós paternos uma das memórias que mais guardo foi quando o meu avô já estava doente, mas que jogámos, também com a minha avó, à canasta — um jogo de cartas “tradicional” na nossa família. Lembro-me de saber, mesmo sendo bastante nova, que era um momento que ia guardar para sempre e que cada vez que pegasse num baralho de cartas me ia voltar a lembrar.

“Obrigado aos meus avós por me terem ensinado o que é o amor absoluto”

Miguel Gonçalves Mendes, realizador

Foto
Miguel Gonçalves Mendes com a avó Leonor DR

Os anos passam e nunca vou conseguir aprender a lidar com a partida dos outros. Porque a morte simplesmente não me é tolerável. E é por isso que (mesmo não sendo crente), tal como os antigos egípcios, falo diariamente com eles — para que a sua memória se perpetue e eles não morram em mim. Lembro-me da minha avó dos seus olhos cor azul topázio; da minha canja preferida com ovinhos inteiros e dos sacos e sacos de comida que me preparava quando era estudante; do meu avô gritar “Leonor, olha o romance!” quando a novela começava; do prazer que tinha em dar-me a mão e dos beijinhos repenicados que mandava desde a varanda sempre que eu entrava no carro e partia para Lisboa. Ela deu-nos tudo e talvez tenha recebido pouco para o tanto que merecia já que a demos sempre como garantida. Mas a vida não é nenhuma garantia — ou no máximo é a garantia do nada. Mas graças ao seu amor, devoção e abnegação, posso afirmar que, tanto eu como a minha irmã, conhecemos em primeira mão o que é ser amado incondicionalmente por alguém. E poder dizer isto nos dias que correm já é dizer tudo. Um privilégio absoluto pelo qual estou eternamente grato. E é por isso que, às vezes, é tão difícil lidar com os nossos novos “outros” amores. Porque eles nunca serão iguais, nunca serão incondicionais, nem abnegados, nunca darão a vida por nós como os nossos pais/avós (sendo que, na realidade, ninguém tem o direito de exigir isso a alguém). Mas aos nossos pais e avós acreditamos infantilmente que sim. Por isso, onde quer que estejam: obrigado aos meus avós por me terem ensinado o que é o amor absoluto na sua forma mais pura, mas acima de tudo obrigado, minha mãe, por teres cuidado deles até ao fim da maneira que só uma filha/mãe como tu sabe cuidar. Este mês, a minha avó completaria 94 anos e tenho eternamente saudades dela.