Carta aberta – Em defesa do Estuário do Tejo

Se se confirmar o uso turístico do Mouchão do Lombo do Tejo abre-se um precedente para o mesmo fim nos outros mouchões.

O Estuário do Tejo foi sempre um dos ex-libris  da Política de Ambiente desde que esta existe institucionalizada, primeiro como Secretaria de Estado e depois como ministério.

Ao longo destas décadas houve sempre um Ministério do Ambiente decidido a defender o estuário das várias tentativas de empreendimentos que poderiam subverter a sua integridade física e biológica.

Ao ser criada pelo Decreto Lei nº 565/76 de 19 de Julho a Reserva Natural do Estuário do Tejo ficou definitivamente salvaguardada (pelo menos assim se julgava)  a sua condição de uma das mais importantes zonas húmidas estuarinas da Europa, classificada  como sítio da Convenção de Ramsar. O bom estado de equilíbrio deste ecossistema complexo e valiosíssimo é também um indicador da qualidade ambiental para a região de Lisboa.

Existem três mouchões próximo da margem direita, Lombo do Tejo, Alhandra e Santa Iria, sendo o mais importante o primeiro, onde sempre funcionou uma exploração agro-pecuária que, como tal e porque tem sido mantida equilibrada, não interfere com a integridade biofísica e ambiental do estuário. Mas também desde há várias décadas que foram surgindo propostas para transformar o mouchão num empreendimento turístico e sempre, repete-se sempre, os sucessivos ministérios do Ambiente recusaram essa reconversão para turismo - fica em causa não só o aumento da área de construção, a sua utilização pacífica como apoio à agro-pecuária, mas ainda o aumento de pessoas a movimentarem-se e a usarem o mouchão como local de lazer, com tudo o que isso implica de ruído e perturbação da tranquilidade indispensável à vida selvagem do estuário, em especial da avifauna.

Se se confirmar o uso turístico do Mouchão do Lombo do Tejo abre-se um precedente para o mesmo fim nos outros mouchões. Se a isto somarmos o enorme erro que é a pretensão de construir o novo aeroporto no Montijo, que o próprio actual Ministério do Ambiente apoia mandando até fazer um segundo EIA porque o primeiro contrariava a proposta. E se for por diante a transferência dos Parques Naturais para o âmbito das Autarquias Locais, será  o descalabro total do Sistema Nacional de Áreas Protegidas : estamos perante um Ministério do Ambiente que envergonha a sua missão, em pleno século XXI, num país da União Europeia.

O dinheiro e os negócios nunca devem prevalecer perante os valores fundamentais da Vida.

É contra isso e em prol da defesa do Estuário do Tejo como área sensível e ecologicamente única no nosso país, de valor europeu e universal, que nós que dedicámos as nossas vidas à defesa da Conservação da Natureza como pilar do Ambiente, nos indignamos e apelamos a um sobressalto cívico  que possa travar estes atropelos ambientais.

Signatários

António Antunes Dias, Biólogo, ex-director das Reservas Naturais do Estuário do  Tejo e do Sado
António Eloy, Antigo professor universitário, investigador, coordenador do Observatório Ibérico de Energia
Carlos Pimenta, Ex-secretário de Estado do Ambiente
Fernando Santos Pessoa, Ex-presidente do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico, responsável  da criação da Reserva Natural do Estuário do Tejo
Helena Freitas, Professora Catedrática da Universidade de Coimbra
João Reis Gomes, Ex-director da Reserva Natural do Sapal de Castro  Marim/Vila Real de Santo António
Jorge Paiva, Biólogo do Centre for Functional Ecology-Science for People & Planet, Universidade de Coimbra
José Carlos Costa Marques, Tradutor, editor
Luís Coimbra, Engenheiro aeronáutico, ex-presidente da NAV Portugal
José Marques Moreira, Ex-director de Serviço do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico  e do Instituto da Conservação da Natureza
Robert Manners de Moura, Antigo professor da UTAD, Prémio Nacional da Confederação Portuguesa  das Associações de Defesa do Ambiente, ex-director do Parque Natural do Alvão

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