A linha à nossa frente salva vidas

A pandemia de covid-19 fechou-nos em casa e colocou-nos gráficos à frente. Quando saímos passámos a ter linhas aos nossos pés. O design gráfico é mais do que traços, rabiscos e autocolantes e pode salvar-nos a vida.

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Reuters/Hannah Mckay

Não falo do sinal de trânsito que nos avisa de uma falésia ou da presença de crocodilos no rio. Falo daquela linha que temos à nossa frente na fila do supermercado, do placard com instruções de etiqueta respiratória à entrada do restaurante e das curvas achatadas que vemos no jornal. À primeira vista parecem traços, rabiscos e autocolantes irrelevantes, mas sempre estiveram presentes na nossa vida.

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Não falo do sinal de trânsito que nos avisa de uma falésia ou da presença de crocodilos no rio. Falo daquela linha que temos à nossa frente na fila do supermercado, do placard com instruções de etiqueta respiratória à entrada do restaurante e das curvas achatadas que vemos no jornal. À primeira vista parecem traços, rabiscos e autocolantes irrelevantes, mas sempre estiveram presentes na nossa vida.

Uma das primeiras aplicações do design gráfico em saúde remonta a 1854 e pertence a Florence Nightingale, enfermeira britânica que serviu no exército inglês durante a guerra da Crimeia. O gráfico que apresentou no parlamento inglês mostrou que a maioria das mortes se devia aos escassos cuidados de higiene nas enfermarias do exército e levou a várias mudanças nas condições sanitárias em que os soldados eram tratados.

Também em 1854 John Snow, médico britânico considerado pai da epidemiologia moderna, utilizou o design para salvar milhares de vidas. A cólera matava milhões de pessoas no mundo e em Londres esse valor atingia os 15 mil óbitos. Ao mapear o local dos óbitos durante um dos maiores surtos conseguiu identificar a possível fonte de infecção na famosa Broad Street e impedir que muitos mais morressem.

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Wikimedia

A forma de comunicar visualmente poderá ter mesmo salvado vidas, incluindo em outros surtos mais recentes, como o de zika no Brasil ou de ébola em África. Existem ideias inovadoras e eficazes, como instalações publicitárias que atraem e eliminam mosquitos ou pinturas exuberantes em murais.

Na pandemia de covid-19, os exemplos são simples, como utilizar fita-cola para orientar a circulação, marcar círculos em jardins para garantir o distanciamento físico ou transformar orientações de saúde em desenhos infantis. A curva achatada partilhada desde Março mostra que o distanciamento físico, entre outras medidas, reduz o número de casos que necessitam de cuidados de saúde e evita uma sobrecarga dos serviços de saúde. Milhares de vidas foram salvas ao promover este distanciamento e alguns estudos já reportam resultados interessantes.

Parecem intervenções banais, mas os elementos gráficos permitem que todos compreendam a mensagem, independentemente dos estudos ou idioma. Já reparou que nos lembramos mais facilmente de um desenho que vimos há uma semana do que o texto que lemos ontem? Ao apelar ao lado emocional, as imagens podem inspirar-nos a adoptar comportamentos que nos protegem. Não é apenas algo que agrada à vista, mas também útil e memorizável. Todas estas vantagens permitem esbater as desigualdades que o novo coronavírus agravou.

O design foi sempre utilizado pelas companhias multinacionais para estimular o consumo. Mas o design gráfico é muito mais que isso quando colocado ao serviço do bem comum: pode resolver problemas da sociedade e aumentar a qualidade de vida. Também as instituições de saúde deveriam fazer uso destas armas para melhorar a saúde de todos.

Quão fantástico seria se designers, profissionais de saúde e cidadãos trabalhassem juntos para melhorar a nossa vida? A pandemia de covid-19 fechou-nos em casa e colocou-nos gráficos à frente. Quando saímos passámos a ter linhas nos nossos pés. Cada autocolante ou gráfico foi pensado com o propósito de facilitar a vida numa sociedade em adaptação. Da próxima vez que for às compras lembre-se: a linha no chão à nossa frente salva vidas.