Aplicação StayAway Covid instalada por 121 mil pessoas em quatro dias

Primeiro-ministro, que já descarregou a aplicação, pede aos portugueses que a instalem: “É um dever cívico.” Mas a instalação não é possível em muitos telemóveis.

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LUSA/RUI MANUEL FARINHA

A aplicação StayAway Covid, sistema digital de rastreio de contactos de infectados pelo novo coronavírus,  já tinha sido descarregada por 121 mil pessoas ao início da manhã desta terça-feira, adiantou ao PÚBLICO José Manuel Mendonça, presidente do Instituto de Engenharia de Sistemas de Computadores, Tecnologia e Ciência (Inesc Tec).

Desenvolvida pelo Inesc Tec em parceria com o Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, a aplicação — disponível desde sexta-feira para utilizadores de Android e iOS — foi apresentada oficialmente no Porto pelo primeiro-ministro e os ministros da Saúde e da Ciência e Tecnologia. A StayAway Covid é de utilização voluntária e é gratuita.

Como funciona esta aplicação? É simples. No caso de estar infectada, a pessoa recebe do médico um código que coloca no seu telemóvel, se assim o entender. O objectivo é que os indivíduos diagnosticados com covid-19 possam activar o envio de um alerta anónimo aos equipamentos móveis com que estiveram em contacto próximo (menos de dois metros de distância durante mais de 15 minutos nas duas últimas semanas) que tenham igualmente a aplicação instalada. Esses códigos vão para um servidor da Imprensa Nacional - Casa da Moeda e a privacidade está garantida.

Além disso, a aplicação “não dá para os engraçadinhos fazerem partidas”, fez questão de frisar o primeiro-ministro durante a apresentação. Sublinhando que já a instalou, António Costa pediu aos portugueses de forma enfática que façam o mesmo: “É um dever cívico descarregar a aplicação e sinalizarem [ligando para a linha SNS 24] se vierem a ser” diagnosticados como casos positivos.

As pessoas não podem “assustar” todas aquelas que estiveram consigo, disse. E explicou: “Só posso dar o alerta se o médico que detectou que eu estou positivo me der um código e só com esse código é que posso inserir [na aplicação que estou infectado]. Não haverá falsos alertas e isto é também muito importante.”

Quantos portugueses não têm acesso?

Numa sessão sem direito a perguntas dos jornalistas, não foi possível perceber, porém, quantos portugueses têm telemóveis que permitem instalar a aplicação nem se a linha SNS24 vai ser reforçada para este efeito, caso a adesão venha a ser significativa.

O Expresso noticiou esta terça-feira que serão cerca de 800 mil os equipamentos com sistemas operativos incompatíveis — um número que a equipa do Inesc Tec define como “exagerado”. O valor resulta de uma estimativa do número de portugueses que têm smartphones incompatíveis com a aplicação obtidos a partir de dados do site StatCounter

A verdade é que modelos de telemóveis lançados antes de 2014 não são compatíveis com a aplicação. Isto porque a StayAway Covid utiliza a nova interface de programação de aplicações (API) para rastreio de contágio, desenvolvido pela Apple e pela Google no final de Maio.

Ao todo, o sistema que é conhecido por GAEN (sigla inglesa para: notificação de exposição da Apple e da Google) não é compatível com telemóveis Apple com sistemas operativos inferiores ao iOS 13 (incluem todos os modelos mais antigos que o iPhone 6, lançado em 2014) e telemóveis Android com sistemas operativos mais antigos que o Android 6 (lançado em 2015 e também conhecido por Android Marshmallow).

Contactada pelo PÚBLICO, a equipa da Google explica que os modelos mais antigos do seu sistema operativo não permitiam economizar bateria quando o Bluetooth está ligado. 

É uma parte chave do sistema porque a StayAway Covid usa Bluetooth, uma tecnologia de comunicação sem fios (usada, por exemplo, para ligar auriculares ao telemóvel) que permite que aparelhos troquem informação quando estão próximos. Com o GAEN, os gastos de energia por ter o Bluetooth dos aparelhos sempre ligado, é menor.

O PÚBLICO não obteve resposta da Apple.

Inesc Tec admite que 96% é valor exagerado

José Manuel Mendonça acredita que os valores mencionados pelo Expresso são exagerados. Mas também admite que os valores que a equipa do Inesc Tec referiu durante a apresentação foram precipitados e que mais de 4% dos portugueses não podem usar a app.

Durante a apresentação, o presidente do Inesc Tec tinha avançado que “cerca de 96%” dos telemóveis em Portugal permitem a instalação da StayAway Covid e que apenas os novos modelos da Huawei (que está presa no meio de uma guerra comercial entre os EUA e a China) poderiam ter problemas.

Questionado mais tarde pelo PÚBLICO, Mendonça admitiu que esta percentagem também pode ser demasiado alta. “Não estava a contar que muitas pessoas usassem telemóveis com mais de dez anos”, explicou. “Parece razoável acreditar que hoje em dia, na sociedade de consumo em que vivemos, as pessoas troquem de telemóvel de cinco em cinco anos”, continuou. “Se alguém quiser muito a aplicação, há telemóveis a partir dos 80 euros que já são compatíveis. Não é preciso um telemóvel muito caro.”

Além disso, apenas os telemóveis mais recentes da Huawei – que já não vêm com acesso às ferramentas da Google – é que não conseguirão aceder à aplicação.

Mendonça acredita que dizer que “800 mil pessoas” não têm acesso “é uma brutalidade.”

Para o presidente do Inesc Tec, o foco não deve ser quantos portugueses instalam a aplicação, mas quantas pessoas é que são diagnosticadas graças ao sistema. Na Suíça, o primeiro país a lançar a aplicação, há dois meses, 14% dos diagnósticos de covid-19 já foram feitos por esta via. 

Ao contrário do primeiro-ministro, a ministra da Saúde confidenciou na sessão que não tinha ainda descarregado a aplicação porque foi pedida uma actualização e o seu telemóvel não estava ligado à corrente "durante a noite”, mas não foi menos enfática na valorização do novo instrumento de combate à pandemia. “Claro que sabemos que tem limitações. Nem todos terão tecnologia compatível” e é preciso explicar que o alerta tem que ser lido com “prudência” porque “exposição não significa infecção”, afirmou Marta Temido.

“É uma ferramenta complementar do trabalho das equipas de saúde pública. Não substitui esse trabalho mas pode ser um auxiliar precioso”, disse. Desde logo, porque a tarefa de identificação e contactos para a interrupção das cadeias de transmissão é mais rápida.

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