“Mais do que paletes de legislação sobre incêndios, é preciso actuar no terreno”

João Dinis, membro da Direcção da Confederação Nacional de Agricultura, lamenta a “desertificação humana de vastas regiões”, critica a “ditadura de preços na madeira e na cortiça” e pede ao Governo que “apoie devidamente os proprietários e produtores florestais”.

Foto
Adriano Miranda

“Se há sector em que há legislação a sobrar é o da floresta nacional.” Aliás, “o tanto legislar, e ‘desordenadamente’, sobre a floresta é já um vício institucional, através do qual até se chega a pretender prevenir ou conter os incêndios florestais”.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

“Se há sector em que há legislação a sobrar é o da floresta nacional.” Aliás, “o tanto legislar, e ‘desordenadamente’, sobre a floresta é já um vício institucional, através do qual até se chega a pretender prevenir ou conter os incêndios florestais”.

Confrontada com mais um pacote legislativo para o sector florestal e questionada pelo PÚBLICO sobre os vários diplomas aprovados e se foi consultada e deu contributos sobre os mesmos, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) optou por um comentário global ao invés de responder questão a questão. Fala de “tendência tecno-burocrática”, de que é exemplo o Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, aprovado em Conselho de Ministros a 21 de Maio e cujo diploma ainda não está publicado.

João Dinis, membro da Direcção da CNA, é peremptório: “Mais do que continuar a produzir ‘paletes’ de legislação, importa que o Governo actue no terreno e, sobretudo, apoie devidamente os proprietários e produtores florestais.”

O responsável da CNA fala de “desertificação humana de vastas regiões”, da “elevada idade média dos (ainda) residentes”, da “regularidade dramática com que ocorrem os incêndios devastadores” e conclui: “Tudo isso contribui para a falta de dinâmica e de ânimo para se investir na produção florestal, sobretudo no minifúndio.”

E não é a “estrutura fundiária a culpada”. As causas mais profundas, frisa João Dinis, radicam na “ruína da agricultura familiar”. E da “floresta de uso múltiplo em consequência directa das más políticas agrícolas e de mercados, a começar pela PAC – Política Agrícola Comum”.

Há, depois, um ponto sensível: o preço da matéria-prima produzida nas florestas, que “tem perdido interesse económico directo”. O dirigente da CNA não tem dúvidas: “Enquanto se mantiverem em baixa os preços da madeira e da cortiça na produção, não se resolvem os maiores problemas da floresta nacional”.

As agora chamadas “ajudas ecossistémicas” são “interessantes” para o rendimento da floresta multifuncional, diz a CNA. Todavia, “o preço da madeira na produção continua a ser o elemento estruturante”. E “os sucessivos governos não se têm atrevido a mexer nos grandes interesses económicos ligados à fileira florestal”, como as “celuloses (aglomerados) e agora também já as biomassas e a transformação da cortiça”. Estas indústrias, aponta João Dinis, “impõem uma autêntica ditadura”, mantendo os preços da madeira e da cortiça “em forte baixa na produção”.