Impacto orçamental ainda é desconhecido, mas rectificativo parece inevitável

Destinada a garantir a liquidez de tesouraria nas empresas, a maior parte das medidas do novo pacote de ajuda à economia não tem um impacto imediato no défice, mas Mário Centeno reconhece que um OE rectificativo pode surgir até ao final do ano

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LUSA/TIAGO PETINGA

Apesar de apenas uma pequena parte do plano de apoio à economia anunciado esta quarta-feira pelo Governo ter um impacto directo na execução orçamental, o Governo está já a antecipar uma deterioração significativa do saldo orçamental e a necessidade de um orçamento rectificativo até ao final do ano. Uma consequência vista como inevitável. “Não é o mais importante agora”, disse Mário Centeno.

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Apesar de apenas uma pequena parte do plano de apoio à economia anunciado esta quarta-feira pelo Governo ter um impacto directo na execução orçamental, o Governo está já a antecipar uma deterioração significativa do saldo orçamental e a necessidade de um orçamento rectificativo até ao final do ano. Uma consequência vista como inevitável. “Não é o mais importante agora”, disse Mário Centeno.

O pacote de medidas apresentado pelo ministro das Finanças e pelo seu colega da Economia, Pedro Siza Vieira, envolve um total de verbas de 9200 milhões de euros. Mas isso não significa que todo este valor, correspondente a cerca de 4,5% do PIB português, conduza a um agravamento do saldo orçamental.

De facto, para já, a grande maioria das medidas não implica um aumento do défice, uma vez que aquilo que o Estado está a fazer é assegurar a existência de liquidez nas tesourarias das empresas através da concessão de garantias para empréstimos e do adiamento por alguns meses de obrigações fiscais e contributivas.

No caso das garantias, um efectivo aumento da despesa do Estado apenas acontece se, mais tarde, o empréstimo concedido não for amortizado.

E no que diz respeito o adiamento das contribuições fiscais e contributivas, se o pagamento, em vez de ser feito em Abril, por exemplo, for feito no final deste ano, não existe um impacto no défice de 2020. Apenas se esse adiamento se arrastar para 2021 ou o pagamento acabar mesmo por não ser feito é que o impacto acontece.

Como explicou o ministro das Finanças, o pacote de medidas de 9200 milhões de euros não terá uma “transmissão directa na execução orçamental”, pelo facto de estarem em causa maioritariamente medidas de liquidez.

Aquilo que o Estado tem de garantir é que o seu próprio financiamento está assegurado, para não registar problemas de tesouraria. Neste capítulo, a capacidade que o Estado português continua a revelar no acesso ao financiamento nos mercados (apesar da subida das taxas de juro nas últimas semanas) e a almofada de liquidez acumulada desde a entrada da troika tornam a situação mais tranquila.

Ainda assim, já há, neste novo pacote, medidas com um impacto directo no saldo orçamental. A mais importante é a redução a um terço das contribuições sociais relativas aos meses de Março, Abril e Maio para as empresas com o máximo de 50 postos de trabalho (e mais tarde possivelmente até a empresas com até 250 trabalhadores que registem perdas importantes).

Esta é uma perda de receita definitiva, que terá impacto no défice. Mário Centeno não avançou com uma estimativa de impacto orçamental e não foi possível ainda obter junto das Finanças uma quantificação do impacto desta medida em concreto.

Em medidas aprovadas anteriormente, como o contributo do Estado no pagamento de baixas ou o reforço de verbas para a saúde, já havia impactos imediatos para o cálculo do saldo orçamental, e que foram estimadas na altura por Mário Centeno em 300 milhões de euros.

Seja como for, como reconhece o ministro das Finanças, não existem dúvidas de que o actual cenário aponta para uma deterioração significativa dos números do OE, o que torna provável a apresentação de um OE rectificativo mais perto do final do ano.

“Esgotadas as folgas [presentes no OE 2020], é evidente que nada impede que se adapte o Orçamento do Estado a estas circunstâncias, nomeadamente através da apresentação para aprovação na Assembleia da República de um orçamento rectificativo”, disse o ministro, defendendo que esta não é a altura para “pôr em causa a execução destas e de outras medidas”.

E, para além das medidas, o efeito mais significativo no défice pode vir do funcionamento dos chamados estabilizadores automáticos, isto é, da diminuição das receitas fiscais e aumento dos gastos sociais decorrentes do abrandamento da economia e agravamento do desemprego.

Uma primeira indicação, mais concreta, sobre qual é a estimativa do do Governo para o impacto da actual crise na economia e no saldo orçamental deverá surgir em meados de Abril, quando for entregue em Bruxelas o Programa de Estabilidade deste ano.