Reacções: COP25 “soube a pouco” e foi uma oportunidade perdida

Na manhã de domingo, chegou-se a acordo em Madrid — mas o artigo 6, o único que falta regulamentar do Acordo de Paris, continua sem solução.

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O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, mostrou-se desiludido com o resultado da cimeira do clima ZIPI/LUSA

O Governo português considera que o resultado da cimeira da ONU sobre o clima, que terminou este domingo em Madrid, “soube a pouco” porque “o pouco que tinha para concluir não concluiu”. O ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, considerou, em declarações à Lusa, que desde o início da conferência das partes havia uma “enorme diferença de expectativas” entre o que havia para discutir dento da cimeira e “o mundo cá fora”, com uma opinião pública muito sensibilizada em relação aos resultados. “E desde o primeiro dia que de facto esta COP tinha pouco para discutir. Mas, o que é facto, é que no pouco que tinha para discutir, ou sobretudo no pouco que tinha para concluir, não concluiu. E nesse aspecto sabe de facto a muito pouco”, disse.

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O Governo português considera que o resultado da cimeira da ONU sobre o clima, que terminou este domingo em Madrid, “soube a pouco” porque “o pouco que tinha para concluir não concluiu”. O ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, considerou, em declarações à Lusa, que desde o início da conferência das partes havia uma “enorme diferença de expectativas” entre o que havia para discutir dento da cimeira e “o mundo cá fora”, com uma opinião pública muito sensibilizada em relação aos resultados. “E desde o primeiro dia que de facto esta COP tinha pouco para discutir. Mas, o que é facto, é que no pouco que tinha para discutir, ou sobretudo no pouco que tinha para concluir, não concluiu. E nesse aspecto sabe de facto a muito pouco”, disse.

Matos Fernandes considerou que a Europa “esteve muito bem” quando apresentou um acordo sobre o clima, o chamado Green Deal, na mesma altura em que decorria a COP25. “E Portugal esteve e estará bem. Porque não só apresentou os seus bons exemplos e mostrou estar de facto na linha da frente no combate às alterações climáticas, como se alguma mensagem negativa passar desta COP cá para fora, no sentido de alguns quererem menos ambição, Portugal não irá retroceder nem um milímetro”, garantiu.

Marcelo Rebelo de Sousa concordou que o resultado não é “tão generoso como se esperaria”, sublinhando a dissonância entre europeus e americanos: “Para os europeus é uma evidência que este é um problema grave. Mas, por exemplo, há eleitores americanos e brasileiros que ainda não acham isso. Depois há eleitores nalguns países africanos que têm tantos problemas imediatos de sobrevivência que, porventura, isso não é tão debatido nem apresentado como tão importante”.

Guterres: “Comunidade internacional perdeu uma oportunidade importante”

O secretário-geral das Nações Unidas expressou igual desilusão. “A comunidade internacional perdeu uma oportunidade importante para mostrar uma maior ambição na mitigação, adaptação e financiamento para enfrentar a crise climática”, disse António Guterres, citado pela AFP.

França, pela voz da ministra da Transição Ecológica e Solidária, Élisabeth Borne, lamentou “a falta de ambição climática, apesar dos avanços obtidos” nas duas últimas semanas, lê-se numa mensagem na rede social Twitter. “Apesar da falta de ambição para chegar a uma decisão final na COP25, isto não nos deve fazer desistir: a União Europeia acaba de anunciar o seu objectivo de ser o primeiro continente a ter neutralidade carbónica em 2050. Isto é histórico. A França, ao garantir que o espírito do Acordo de Paris é cumprido, quer agora conduzir mais países para esse caminho”, afirmou a ministra.

A China, através do seu negociador-chefe, Zhou Yingmin, considerou que “os resultados não atingiram as expectativas”. “Creio que todos lamentamos que os resultados não tenham correspondido aos nossos esforços”, disse, citado pela Reuters.

De Tuvalu, arquipélago do Pacífico altamente vulnerável à subida do nível das águas do mar, a reacção é de uma condenação veemente. “Há milhões de pessoas em todo o mundo que já estão a sofrer os impactos das alterações climáticas. Negar este facto pode ser interpretado por alguns como um crime contra a Humanidade”, disse o representante do país na COP25, Ian Fry. Da mesma região, o enviado da Papua-Nova Guiné, Kevin Conrad, lamentou que “nas últimas 24 horas, 90% dos participantes” não tenham sido envolvidos no processo negocial.

Já Jair Bolsonaro, Presidente do Brasil, criticou cimeira e o “jogo comercial” favorável à Europa. "Eu não sei como as pessoas não entendem que se trata apenas de um jogo comercial”, afirmou o chefe de Estado num encontro com a imprensa à saída da sua residência oficial, no Palácio da Alvorada. E acrescentou: “Eu gostaria de saber se existe uma resolução para a Europa ser reflorestada ou se vão continuar a perturbar apenas o Brasil?”.

O Brasil deveria ter acolhido a COP25, mas desistiu logo após a eleição de Bolsonaro que, questionado sobre esta decisão respondeu: “Fui eu que decidi. Eles teriam feito o seu carnaval no Brasil”.

Também o ministro do Meio Ambiente do Brasil, Ricardo Salles, afirmou que conferência do clima não “deu em nada”, nomeadamente no que diz respeito à regulamentação global dos créditos de carbono. “Os países ricos não querem abrir os seus mercados de crédito de carbono. Exigem acção e apontam o dedo ao resto do mundo, sem cerimónias, mas quando se trata de meter as mãos nos bolsos, não o fazem. Proteccionismo e hipocrisia estiveram de mãos dadas todo o tempo”, escreveu Ricardo Sales na sua conta na rede social Twitter, ainda em Madrid.

Cientistas e ONGs responsabilizam EUA, Austrália, Brasil e Arábia Saudita

As organizações ambientalistas Oikos e Zero também consideram “pouco positivo” o resultado da cimeira do clima e acusam alguns países de proteger interesses económicos. “Atolados por negociações de má-fé que colocam a política e os interesses dos combustíveis fósseis acima das pessoas e do planeta, muitos países — liderados pelos Estados Unidos, Austrália e Brasil — mais uma vez expuseram a sua apatia ao sofrimento de milhões e uma rejeição voluntária da ciência”, denunciam em comunicado conjunto divulgado horas depois de anunciado o acordo.

As duas ONG dizem ainda que é “cada vez maior” a diferença entre o que as pessoas exigem por um futuro seguro para o clima e o que os líderes estão dispostos a fazer “à medida que as emissões aumentam, a produção de combustíveis fósseis se expande e os impactos são mais dramáticos”.

Alden Meyer, dirigente da Union of Concerned Scientists, organização que em 2017 publicou um artigo assinado por cerca de 15 mil investigadores a alertar para danos “irreversíveis” e “substanciais" no planeta, disse igualmente que nunca tinha assistido a tamanha dissonância entre o que a ciência exige e o que as negociações produzem em termos de acções significativas, acrescentando que “a maior parte dos países poluidores está a resistir ao apelo para aumentar as suas ambições” em termos de medidas.

A Greenpeace, pela voz da directora executiva Jennifer Morgan, considerou que “esta COP expôs o papel dos poluidores na política”, apontando o dedo ao Brasil e à Arábia Saudita, mas também à “liderança irresponsavelmente fraca do Chile” na cimeira de Madrid.