Regulamento de AL no Porto vai ter “moderadores” para diminuir conflitos entre turistas e habitantes

Primeiro esboço do Regulamento Municipal do AL estará pronto em 30 dias. Plataforma O Porto Não se Vende propõe proibição de novos registos até lá.

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O Porto recebeu, em 2018, 4,3 milhões de hóspedes e estima chegar aos 5,2 milhões neste ano Paulo Pimenta

Com o estudo encomendado à Universidade Católica nas mãos, a Câmara do Porto chegou ao “momento zero” da discussão e avançou para a criação do Regulamento Municipal do Alojamento Local. A primeira versão do documento, que será disponibilizada para consulta pública antes de ser votado no hemiciclo, deve estar pronta em Junho, afirmou o vereador Ricardo Valente durante o primeiro de um ciclo de debates dedicados à habitação que a Câmara do Porto está a promover. Entre outras coisas, revelou, o regulamento deverá criar a “figura do moderador” para diminuir potenciais conflitos entre habitantes e turistas.

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Com o estudo encomendado à Universidade Católica nas mãos, a Câmara do Porto chegou ao “momento zero” da discussão e avançou para a criação do Regulamento Municipal do Alojamento Local. A primeira versão do documento, que será disponibilizada para consulta pública antes de ser votado no hemiciclo, deve estar pronta em Junho, afirmou o vereador Ricardo Valente durante o primeiro de um ciclo de debates dedicados à habitação que a Câmara do Porto está a promover. Entre outras coisas, revelou, o regulamento deverá criar a “figura do moderador” para diminuir potenciais conflitos entre habitantes e turistas.

Conflito inevitável instalou-se perante a decisão camarária de proibir perguntas no debate público onde se pedia a “participação cívica” da cidade. As cadeiras colocadas no átrio da câmara não chegaram para todos os que aceitaram o desafio, mas a participação ficou limitada ao Facebook da autarquia, onde houve uma transmissão em directo do debate, e à caixa de sugestões instalada na entrada. O moderador Miguel Pereira Leite justificou a deliberação com o facto de haver demasiada gente na sala. Mas houve quem não gostasse e tivesse pedido a palavra, a meio da discussão e depois de o presidente da Assembleia Municipal a dar por terminada. Das redes sociais, apesar de haver mais de 60 comentários no momento em que a sessão terminou, foram lidos apenas dois. E nenhum deles espelhava as muitas queixas relacionadas com o crescimento do AL no Porto.

Antes do debate desta terça-feira, o presidente Rui Moreira já admitiu a hipótese de “alguma contenção” do AL, recusando, no entanto, “medidas proibicionistas” que poderiam matar o mercado. Falta definir os moldes em que tal contenção se fará, porque as hipóteses são imensas: pode fazer-se contenção por zonas, como acontece em Lisboa, por número de dias de estadia, por lucro máximo dos proprietários, proibir o arrendamento temporário de prédios inteiros, entre outras.

No debate, dedicado exclusivamente ao AL, a Câmara do Porto, através do vereador Ricardo Valente, não deixou muitas pistas em relação às suas ideias nessa matéria. Mas deixou clara a importância dada ao turismo. Graças a ele, disse, “a taxa de desemprego na cidade está a crescer acima da média nacional”. E mesmo que isso se faça com emprego não qualificado é ganho para o Porto: “É preferível ter emprego não qualificado do que não ter emprego”, pronunciou perante o burburinho da sala.

Além de Ricardo Valente, estiveram no debate o presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), Eduardo Miranda, e Ana Barbeiro, da plataforma O Porto Não se Vende, movimento pelo direito à habitação que defendeu, perante o desafio de propor medidas práticas, a suspensão de novos registos de AL enquanto não houver um regulamento para o sector.

Ana Barbeiro sublinhou a importância de – além de um trabalho económico sobre esta realidade, já executado pela Católica – ser realizado “um trabalho etnográfico com os moradores”. Habitante do centro histórico nos anos 90 e regressada lá há cerca de cinco anos, Ana Barbeiro diz estar a testemunhar uma “transformação incrível” nessa zona da cidade. E não para melhor. Neste momento, afirmou, o centro histórico é “um hotel a céu aberto”. Sem “serviços para os cidadãos” e repleto de restaurantes e outro comércio inacessíveis aos bolsos dos portugueses. “Não sou contra o turismo, mas ele não pode estar em conflito com o que é a cidade”, disse a autora de um estudo que concluiu que se todos os AL do centro histórico estivessem com capacidade máxima, haveria um turista para cada dois moradores da zona

O presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal, Eduardo Miranda, falou num “período de transformações rápidas que não são fáceis para ninguém”. Mas sublinhou as vantagens deste alojamento, que tornou possível a “democratização do turismo” e trouxe “emprego local”. As populações desfavorecidas dos centros históricos de Lisboa e do Porto, defendeu, são “um problema estrutural” e não uma consequência do AL. “Toda a população que tenha rendas abaixo do valor do mercado é uma população fragilizada que está em risco e vai continuar a ser pressionada”, disse. Eduardo Miranda deixou no ar um exercício de suposição: “Se amanhã aparecer um casal jovem que quer viver no centro histórico e tiver condições de pagar 500 ou 600 euros e quem lá está pagar 200 ou 300 vamos fazer o quê? Proibir os casais de morar no centro histórico?” Para o empresário corre-se o “risco de combater o problema errado”. Mesmo porque “os proprietários não podem fazer o papel da Segurança Social”.

Mas o AL, preveniu, não é a galinha dos ovos de ouro que às vezes se vende: a rentabilidade “não é assim tanta” e muita gente tem desistido do negócio em Lisboa. Se querem incentivar os proprietários a investir em arrendamento de longa duração é preciso “publicitar” os incentivos que para isso existem, aconselhou: “Desde Janeiro de 2018 que todos os imóveis recuperados nas ARU podem ter 5% de IRS se forem usados para habitação.”

Ana Barbeiro levou ao debate o testemunho do que é morar no centro histórico e conviver com o AL. Além da subida de preços e diminuição da oferta, existem inconvenientes como a questão da segurança ou do barulho. “Tenho novos vizinhos a cada três ou quatro dias. Têm voos às seis da manhã e por isso fazem barulho às quatro. Depois vem o aspirador para fazer a limpeza”, exemplificou.

A resposta veio pronta do próprio moderador do debate: “Seguramente não defende um regresso aos anos 80”, provocou. E logo de seguida pela voz do vereador Ricardo Valente, para quem esses problemas “são micro”. “No meu prédio há um casal de jovens que durante a queima chega às quatro da manhã. Vou agora proibir a queima?”, questionou, reforçando uma ideia que já antes tinha defendido: “O direito à propriedade é constitucional, tão válido como o direito à habitação.”

Mesmo antes do regulamento estar esboçado e em funcionamento, a Câmara do Porto já está a tomar algumas medidas, adiantou Ricardo Valente. Em parceria com o Airbnb, está a ser criado um “sistema de código-conduta para os registos na cidade do Porto”, que promova a “educação” dos turistas, e “expulse automaticamente” quem não cumpra um “conjunto de regras”. Com a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal e a ALEP está a ser feita uma “credenciação do AL”, acrescentou: “Este negócio exige qualificação e regras.” Segundo Ricardo Valente, a câmara - que está também a construir um Observatório do Turismo -, já está a assumir algumas das valências que também competem à ASAE. “Estamos a chamar as entidades que têm AL, a ir aos locais, a receber queixas”, disse. Se o AL criou pressão sobre a habitação? “É evidente”, admitiu. Mas esse cenário não é responsabilidade de proprietários nem da autarquia, acredita: “A ausência de política pública é que fez com que o privado encontre o AL como o único meio de rentabilização do dinheiro do imobiliário.”