Chile planeou vender a ilha da Páscoa aos nazis

Novo livro recupera documentos com mais de 80 anos e revela que o Governo chileno quis vender a mítica ilha à Alemanha de Hitler para reforçar a sua frota naval. Já se sabia que o negócio fora proposto aos EUA, ao Reino Unido e ao Japão. O Presidente Alessandri pedia por ela 860 mil euros.

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A ilha a 3700 quilómetros da costa chilena é celebre pelos seus gigantes de pedra, os moai DR

Mario Amorós, jornalista e historiador espanhol que muito tem escrito sobre o Chile, não podia escolher melhor cenário para a apresentação do seu novo livro, Rapa Nui. Una herida en el océano (Ediciones B). A 14 de Agosto, depois do lançamento oficial em Santiago do Chile (a 9), o autor ruma à ilha da Páscoa, a das misteriosas e gigantescas cabeças de pedra (moais), para falar deste novo título em que revela que, em 1937, decorreram negociações para vender à Alemanha nazi este território isolado no Oceano Pacífico a 3700 quilómetros da costa chilena.

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Mario Amorós, jornalista e historiador espanhol que muito tem escrito sobre o Chile, não podia escolher melhor cenário para a apresentação do seu novo livro, Rapa Nui. Una herida en el océano (Ediciones B). A 14 de Agosto, depois do lançamento oficial em Santiago do Chile (a 9), o autor ruma à ilha da Páscoa, a das misteriosas e gigantescas cabeças de pedra (moais), para falar deste novo título em que revela que, em 1937, decorreram negociações para vender à Alemanha nazi este território isolado no Oceano Pacífico a 3700 quilómetros da costa chilena.

Até aqui sabia-se apenas que o país, governado pelo conservador Arturo Alessandri entre 1920 a 1925 e entre 1932 a 1938, tentara que os americanos, os japoneses e os britânicos se interessassem pela ilha, estando disponível a aliená-la a quem apresentasse a melhor oferta.

Escreve esta quinta-feira o diário espanhol El País, depois de uma conversa com o historiador, que Alessandri estava apostado em reforçar a sua frota naval porque a Argentina, país que formara com o Peru e a Bolívia uma aliança que ameaçava os interesses chilenos, encomendara oito vasos de guerra aos estaleiros britânicos.

“Para o Chile continental a ilha era sobretudo um lugar marcado pelo estigma da lepra e para o poder político um território distante cedido à Marinha e arrendado a uma empresa privada. Tinha muito pouco valor”, disse ao País Mario Amorós, autor de duas biografias de outros tantos chilenos célebres, o Presidente Salvador Allende e o poeta de Vente Poemas de Amor e uma Canção Desesperada, Pablo Neruda. Foi com esta percepção do território, e sofrendo ainda as consequências da grave crise económica internacional desencadeada com o crash da bolsa americana em 1929, que o Chile resolveu pedir pela ilha qualquer coisa como um milhão de dólares.

Por que falhou o negócio

Amorós, explica o diário espanhol, resolveu estudar os negócios secretos que envolveram a ilha e o Governo de Hitler depois de tomar conhecimento da investigação levada a cabo por um especialista nas Forças Armadas chilenas, o historiador húngaro Ferenc Fischer, que encontrara já provas de que o Governo daquele país sul-americano mantivera conversações com os nazis, entre elas um documento de 1937 que resumia uma conversa entre o embaixador do führer em Santiago e o ministro dos Negócios Estrangeiros chileno, destinada a averiguar se a proposta de venda era séria.

Rapa Nui. Una herida  en  el  océano é o resultado do trabalho de aprofundamento desta pesquisa e nele o historiador espanhol defende que só os britânicos explicaram taxativamente por que razão as negociações mantidas secretas durante décadas não chegaram a avançar. “Descartaram a compra da ilha porque consideraram que, do ponto de vista militar, o seu valor era escasso”, disse Amorós, lembrando que, no entanto, tanto Londres como Washington fizeram questão de defender que não era conveniente que a ilha fosse parar às mãos de nenhuma das potências que viriam a encabeçar o Eixo (Alemanha, Itália e Japão).

Com base em documentação consultada em dezenas de arquivos, grande parte dela até aqui inédita, segundo o historiador, a obra conta também a história de um povo e de um território desde os primeiros vestígios de ocupação humana ali encontrados até à actualidade.

De acordo com a sinopse disponível no site da editora, entre os mais relevantes documentos consultados por Amorós está a correspondência de um padre alemão que ali viveu a partir de 1935 e que dá conta das transformações daquele território em meados do século XX.

Rapa Nui é o que os seus habitantes chamam à Ilha de Páscoa, designação que decorre do facto de a sua descoberta pelos europeus, atribuída ao explorador holandês Jacob Roggeveen, ter ocorrido precisamente no domingo de Páscoa de 1722. Segundo o jornal chileno La Nación, o Governo do Presidente Sebastián Piñera está agora a trabalhar numa lei que vai permitir à ilha readquirir a título oficial o seu nome local.

Sob soberania chilena há 130 anos, foi vítima de epidemias e saques durante décadas. Nos últimos anos os Rapa Nui — nome que também se dá aos seus habitantes — têm tentado redefinir a sua relação com o Governo de Santiago do Chile e em 2015, lembra o jornalista e historiador, os seus representantes máximos apresentaram uma petição junto da Comissão Interamericana de Direitos Humanos para que lhes sejam devolvidas as terras dos seus antepassados e para que possam reaver o controle dos recursos naturais da ilha.

Esta quarta-feira entrou em vigor uma norma proposta pelo Governo de Piñera e que limita o acesso de turistas àquele território insular como medida de protecção da sua fauna e flora.

"Esta ilha é mágica, todo o mundo a quer visitar, mas também é uma ilha delicada que temos de proteger. A nova lei tem como objectivo regular o turismo", disse o presidente chileno à cadeia de televisão 24 Horas.

Anualmente, a ilha da Páscoa, com 170 quilómetros quadrados e uma população residente de cinco mil pessoas (dados de 2010), recebe 100 mil turistas. A nova lei, aplicável a estrangeiros e a chilenos, reduz o seu tempo de permanência de 90 para 30 dias e faz depender a autorização de visita de uma série de pressupostos – quem ali quiser ficar, por exemplo, tem de ter uma reserva num hotel ou ser convidado de um dos habitantes, e não pode chegar sem ter na mão um bilhete de volta.