Há 60 mil crianças em risco de morrer à fome. E as sanções não ajudam

A chegada de ajuda à Coreia do Norte é dificultada pelas tensões políticas e pelas consequências “não intencionais” das sanções internacionais. Por todo o mundo, há 48 milhões de crianças a precisar de assistência humanitária, alerta a Unicef.

Foto
A Unicef pediu ajuda para os 48 milhões de crianças que vivem em cenários difíceis — na Coreia, são mais de 200 mil Reuters/DAMIR SAGOLJ

Existem 60 mil crianças norte-coreanas em risco de morrerem à fome, situação que é agravada pelas sanções económicas internacionais que têm sido aplicadas ao regime de Pyongyang, que dificultam a chegada de ajuda humanitária ao país, alertou a Unicef nesta terça-feira. “A tendência é preocupante e não está a melhorar”, lamentou o director de programas de emergências da organização das Nações Unidas, Manuel Fontaine.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Existem 60 mil crianças norte-coreanas em risco de morrerem à fome, situação que é agravada pelas sanções económicas internacionais que têm sido aplicadas ao regime de Pyongyang, que dificultam a chegada de ajuda humanitária ao país, alertou a Unicef nesta terça-feira. “A tendência é preocupante e não está a melhorar”, lamentou o director de programas de emergências da organização das Nações Unidas, Manuel Fontaine.

Na sequência dos programas de mísseis e nucleares, com testes sucessivos ordenados por Kim Jong-un, a ONU e várias potências internacionais têm aplicado sanções à Coreia do Norte, que resultam em consequências “não intencionais”. A juntar ao isolamento do país e à falta de financiamento para programas de apoio às crianças, estas sanções (que incluem limitações económicas e limitações na importação de produtos petrolíferos) dificultam a chegada de ajuda ao país.

À luz do que foi definido pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, as sanções não devem afectar os apoios e as operações humanitárias, disse o director adjunto da Unicef, Omar Abdi — mas isto não é tarefa fácil. “Aquilo que acontece é que os bancos e as empresas que fornecem bens ou enviam bens são muito cautelosos. Não querem ser acusados mais tarde de terem quebrado estas sanções”, acrescentou Abdi, citado pela Reuters.

E as sanções económicas não afectam só as crianças: o painel dos direitos humanos das Nações Unidas alertava no final de 2017 que também as mulheres norte-coreanas sofrem de “elevados níveis de desnutrição”, com 28% de grávidas e lactantes a serem afectadas.

Segundo a Unicef, existem ao todo 200 mil crianças norte-coreanas subnutridas e estima-se que 60 mil enfrentam o tipo de subnutrição mais grave, que pode ser mortal. “Este é o tipo de subnutrição que pode levar à morte, é uma subnutrição de proteína e de calorias”, explicou Manuel Fontaine.

Não é a primeira vez que a Coreia do Norte enfrenta crises alimentares, tendo já passado em 2015 pela “pior seca em 100 anos”, que fez baixar a produção de alimentos essenciais como o arroz, ou ainda a grande fome na década de 1990, que levou à morte de entre um a três milhões de pessoas (numa altura em que a população era de 20 milhões).

A Unicef é uma das poucas organizações humanitárias com acesso ao país, mas Fontaine reconhece que a intervenção feita na Coreia do Norte é “altamente vigiada”. A ideologia juche norte-coreana, que defende a independência e auto-subsistência do regime, é uma das razões que aumentam o enclausuramento do país. Já em 2011 a então chefe das operações humanitárias da ONU, Valerie Amos, alertava para o facto de que a Coreia do Norte não conseguiria “alimentar a sua população num futuro próximo”.

Crianças com “um futuro cada vez mais sombrio”

A Unicef anunciou nesta terça-feira que precisa de 2900 milhões de euros para conseguir prestar assistência humanitária a 48 milhões de crianças que vivem não só em cenários de fome, mas também em ambientes de “conflitos, desastres naturais e outras emergências”, em 51 países espalhados pelo globo. Desse total, uma fatia de 13,3 milhões está destinada às crianças da Coreia do Norte.

“As crianças e jovens não podem simplesmente ficar à espera que as guerras findem, com crises que ameaçam, a uma escala catastrófica, a sua sobrevivência imediata e futura”, disse Manuel Fontaine, em comunicado. “A menos que a comunidade internacional tome medidas urgentes para proteger e prestar assistência vital a estas crianças, elas enfrentarão um futuro cada vez mais sombrio”, sublinhou ainda.

Foto
Reuters/DAMIR SAGOLJ

Entre os objectivos da Unicef para 2018 está o tratamento de mais de quatro milhões de crianças com subnutrição aguda e a imunização de dez milhões de crianças contra o sarampo; a organização das Nações Unidas quer ainda possibilitar o acesso a água potável a 35 milhões de pessoas.

Quase uma em cada quatro crianças vive num país afectado por catástrofes naturais, pela guerra ou por outros conflitos. Entre os países mais afectados está o Bangladesh – devido aos milhares de crianças rohingya, que fogem do conflito na Birmânia – e o Iémen – com a crise de cólera que enfrenta, a maior de que há registo, que resultou já em milhares de mortes. Se nada for feito, a Unicef alerta que, até 2030, 69 milhões de crianças com menos de cinco anos irão morrer e 167 milhões de crianças irão viver em pobreza extrema.