BoJack Horseman, o cavalo deprimido está de regresso

Chegou nesta sexta-feira ao Netflix a quarta temporada da série animada sobre BoJack Horseman, o cavalo alcoólico e agarrado ao passado. Continua tão boa como tem sido desde que se estreou em 2014.

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BoJack Horseman pensativo DR
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Mr. Peanutbutter candidata-se à governador da Califórnia, apesar de não ter qualquer competência para o cargo DR
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Princess Carolyn, uma gata persa, num sofá DR

Há um cavalo. No final dos anos 1980 e início dos anos 1990, BoJack Horseman era a estrela de um muito famoso programa de televisão, Horsin' Around, uma sitcom sobre um solteirão que se vê obrigado a cuidar de três crianças que, ao contrário dele, são humanas. Foi um sucesso junto do público – a crítica não gostou – e durou nove temporadas. BoJack nunca conseguiu replicar o êxito e hoje vive, rico mas deprimido e alcoólico, egoísta, frustrado e agarrado ao passado. Não é, de todo, uma boa pessoa, mas vai tentando, muito aos poucos, crescer, e perceber que talvez isso não seja assim tão possível

É esta a premissa de BoJack Horseman, a série animada do Netflix criada em 2014 por Raphael Bob-Waksberg, que veio do mundo da comédia de sketches com a trupe Olde English, cujos 12 episódios da quarta temporada ficam disponíveis esta sexta-feira. Em relação às épocas anteriores, mantém-se o complicado equilíbrio quase perfeito entre piada e coração, parvoíce e seriedade, leveza e profundidade, sem nunca ter medo de acabar episódios, como acontece frequentemente, com momentos de pungente melancolia que põem o espectador a pensar na sua própria vontade. E a vontade de fazer sempre diferente, de explorar mais e melhor o universo que foi criado em parceria com Lisa Hanawalt, ilustradora, cartunistapodcaster que desenhou as personagens, uma boa parte delas animais antropomórficos a viver e trabalhar em Hollywood – ou Hollywoo, já que no sexto episódio da primeira época o nome perdeu o "D".

O mundo de BoJack Horseman é um em que há trocadilhos constantes, mas nunca são a única fonte de piada, nem o mais importante. E onde tudo pode acontecer. Uma personagem, uma gata persa chamada Princess Carolyn que tem a voz de Amy Sedaris  – que é desde os anos 1990 uma das actrizes cómicas mais hilariantes e consistentes dos Estados Unidos –, é uma agente de Hollywood, teve durante algum tempo uma relação com três miúdos às cavalitas uns dos outros com uma gabardine por cima a fingirem que eram um homem chamado Vincent Adultman. Ou em que Alan Arkin, a lenda da comédia e actor oscarizado, deu voz a J.D. Salinger, o lendário escritor recluso que na vida real morreu em 2010, mas no universo animado fingiu a própria morte, passou algum tempo a trabalhar numa loja de bicicletas e regressou anos depois à vida pública para criar e apresentar um concurso cujo objectivo era descobrir se celebridades de Hollywood sabiam ou não sabiam coisas: Hollywoo Stars and Celebrities: What Do They Know? Do They Know Things?? Let's Find Out!.

A série usa estas partes ridículas e exageradas como ponto de partida para lidar com humanidade, tristeza, desapontamento, crescer, planos furados, amor, egoísmo, violência causada por armas e a forma como filmes podem fomentar isso, relações, depressões, vícios, feminismo, como as mulheres são tratadas pelo mundo em geral e a insegurança que sentem, bem como o mundo do entretenimento ou ultrapassar e confrontar o passado. É um sem-número de temas não raras vezes sérios que são tratados de uma forma nada leviana e que outras séries animadas nunca se atreveriam a abordar de maneira parecida.

Afinal, não é como se Family Guy tivesse episódios como o sétimo da temporada anterior, que é explicitamente sobre a maneira como homens poderosos de Hollywood são acusados de abuso sexual de mulheres e raramente sofrem as consequências disso. Tudo isto sem medo de dizer nomes. É algo que foi abordado na recente segunda temporada de Master of None também do Netflix, mas não costuma acontecer em séries animadas.

Nesta temporada, mantém-se o elenco nuclear de vozes da série, que inclui Will Arnett, de Arrested Development, como BoJack, Alison Brie, de Community e G.L.O.W., como Diane Nguyen, uma jornalista, Aaron Paul, de Breaking Bad, como Todd, que nas épocas anteriores dormia no sofá de BoJack e é das mais interessantes personagens assexuais que existem na televisão actual (não que sejam muitas), a já mencionada Amy Sedaris, de Strangers with Candy e agora Unbreakable Kimmy Schmidt, como Princess Carolyn, e o cómico de stand-up Paul F. Tompkins como Mr. Peanutbutter, um labrador que é o antigo rival televisivo de BoJack e marido de Diane. O cão é alguém de quem toda a gente gosta, que passou a vida a transpirar positividade e a ter tudo aquilo que queria, e que nesta leva de episódios se candidata a governador da Califórnia, apesar de não ter competência para o cargo, nem sequer saber bem o que isso comporta, numa clara alusão às eleições presidenciais norte-americanas de 2016.

Mas também há, como sempre, vários convidados, mais ou menos famosos, que regressam ou se estreiam por estes lados. Pessoas como o sempre hilariante actor cómico Martin Short, que faz de patriarca de uma família rica de ratos com preconceitos contra gatos, o estilista Marc Jacobs, que faz de Sharc Jacobs, uma versão dele próprio em modo tubarão (e, segundo Lisa Hanawalt, Jacobs terá aparecido vestido de tubarão para gravar a sua parte), o cómico de stand-up Patton Oswalt, Adam Conover, apresentador do programa de destruir semi-verdades estabelecidas Adam Ruins Everything, colega de Waksberg na trupe Olde English e namorado de Hanawalt, actores como Jessica Biel, Felicity Huffman e Zach Braff, entre muitos outros, a fazerem deles próprios, o rapper Sir Mix-A-Lot ou a cómica de stand-up Aparna Nancherla, que também apareceu em Master of None e Crashing, como a filha perdida de BoJack, que procura a mãe desconhecida. Entre muitos, muitos outros.

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