Mentiroso és tu, diz Trump ao ex-director do FBI

Presidente norte-americano está disposto a prestar declarações sob juramento. Garante que não pediu lealdade a James Comey e dá a entender que não tem gravações das conversas entre os dois.

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Donald Trump e James Comey MICHAEL REYNOLDS/SHAWN THEW/EPA

O duelo entre o Presidente dos Estados Unidos e o ex-director do FBI parece cada vez mais uma daquelas zaragatas no recreio da escola, em que dois miúdos se acusam mutuamente de serem os maiores mentirosos do mundo enquanto um desafia o outro a ser o primeiro a tocar-lhe nem que seja só com um dedo. Depois de James Comey ter afirmado, sob juramento, que Donald Trump está a mentir, agora é a vez de Donald Trump acusar James Comey de ser um mentiroso – e de afirmar que também está disposto a dizer isso sob juramento.

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O duelo entre o Presidente dos Estados Unidos e o ex-director do FBI parece cada vez mais uma daquelas zaragatas no recreio da escola, em que dois miúdos se acusam mutuamente de serem os maiores mentirosos do mundo enquanto um desafia o outro a ser o primeiro a tocar-lhe nem que seja só com um dedo. Depois de James Comey ter afirmado, sob juramento, que Donald Trump está a mentir, agora é a vez de Donald Trump acusar James Comey de ser um mentiroso – e de afirmar que também está disposto a dizer isso sob juramento.

Nem 80%, nem 90%, nem 99%: "100%" é a percentagem de garantia que o Presidente norte-americano deu a um jornalista durante uma conferência de imprensa na Casa Branca, sexta-feira, quando foi questionado sobre se está disposto a desmentir o ex-director do FBI sob juramento. "Teria todo o gosto em dizer-lhe precisamente o que acabei de dizer", reforçou Donald Trump, referindo-se ao novo responsável pela investigação do FBI sobre a ingerência russa, Robert Mueller.

Poucas horas depois, a Comissão de Serviços Secretos da Câmara dos Representantes anunciou que pediu aos responsáveis da Casa Branca para responderem por escrito a duas perguntas: se têm alguma gravação das conversas entre Donald Trump e James Comey e, se a resposta for sim, se por acaso não querem enviá-las aos congressistas.

Trump não foi convidado para estar presente em nenhuma das comissões do Congresso que estão a investigar a ingerência russa nas eleições presidenciais norte-americanas do ano passado, e muito dificilmente os responsáveis por essas comissões vão perguntar ao Presidente dos Estados Unidos se quer sentar-se ali numa cadeira e ser confrontado com afirmações do director do FBI que ele despediu.

Para além disso, é possível que os seus conselheiros e advogados estejam a dizer-lhe neste momento que ele não devia ter dito aquilo nos jardins da Casa Branca, ao lado do Presidente da Roménia e perante um batalhão de jornalistas.

Só que Donald Trump tinha sido forçado a deixar de ser Donald Trump na quinta-feira, quando foi aconselhado a ficar longe do Twitter enquanto James Comey estava a depor na Comissão de Serviços Secretos do Senado. Logo na sexta-feira de madrugada, escreveu um tweet: disse que Comey acabou por lhe dar razão e chamou-lhe leaker – uma palavra que apenas serve para descrever alguém que entrega documentos sensíveis a jornalistas, e que no Twitter de Trump ganha uma conotação mais negativa do que ladrão.

Mas, afinal, o que é que Donald Trump disse na conferência de imprensa na Casa Branca? Disse que não pediu a James Comey para deixar cair a investigação ao ex-conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn, e que também não lhe pediu lealdade. Estas duas questões são centrais na discussão sobre se Trump poderá vir a ser um dia acusado de obstrução à justiça, o que poderia resultar num processo de destituição – à falta de testemunhas das conversas entre os dois responsáveis, e perante o mistério sobre a existência ou não de gravações em áudio ou vídeo, as comissões de inquérito só podem comparar as notas que James Comey foi tirando dessas conversas com a palavra do Presidente dos Estados Unidos da América.

Por exemplo, quando Richard Nixon pediu a demissão para evitar o impeachment, em 1974, havia cassetes; e quando Bill Clinton foi alvo de impeachment (posteriormente chumbado eplo Senado) por perjúrio e obstrução à justiça, em 1998, havia um vestido azul manchado pelo Presidente.

E é por se sentir aos comandos deste jogo que Donald Trump disse que não tem problemas em falar sob juramento: na mesma conferência de imprensa em que desmentiu as duas principais acusações de James Comey, o Presidente norte-americano alimentou ainda mais o mistério das gravações.

Numa mensagem partilhada no Twitter no dia 12 de Maio (três dias depois de ter despedido o director do FBI), Trump disse que Comey devia preparar-se para a divulgação de "gravações" das conversas entre os dois, se decidisse passar informações aos jornalistas (no mundo de Trump, uma palavra entre aspas significa que, muito provavelmente, essa palavra não significa precisamente aquilo que significa, pelo que "gravações" pode ser qualquer coisa entre memorandos e registos em áudio ou vídeo).

As notas das conversas entre Comey e Trump foram publicadas pelo The New York Times no dia 15 de Maio, e na passada quinta-feira James Comey admitiu no Senado que foi ele o responsável por essa fuga – entregou os documentos a um amigo, que depois os leu a jornalistas.

Na sexta-feira, na conferência de imprensa na Casa Branca, Trump disse que vai falar sobre as tais "gravações" num "período de tempo muito curto", mas acrescentou uma frase, em resposta aos jornalistas, que pode indicar que não existem registos nenhuns: "Quando ouvirem a resposta, vão ficar muito desiludidos."