Crise
Venezuela: crise obriga pais a entregar os filhos
Zulay Pulgar é venezuelana, tem 43 anos, é desempregada e tem sete filhos. A pensão do pai, que equivale no mercado negro a 5,8 euros mensais, é a base de sustento de toda a família, num momento em que a Venezuela atravessa uma das crises económicas e sociais mais profundas da sua história. Recentemente, o agregado familiar diminuiu. Não por falecimento de um dos seus membros, mas por carência económica. Pulgar não encontrou outra opção senão entregar a sua filha de seis anos ao cuidado de um casal vizinho. "É melhor que tenha outra família do que tenha de prostituir-se ou morrer de fome" disse a mulher de 43 anos, à porta da sua modesta casa em Punto Fijo, na Venezuela. A falta de comida esta na base da sua decisão. Uma refeição de frango para toda a família pode custar metade de um orçamento mensal, explicou à Reuters. O pequeno-almoço da família resume-se, diariamente, a café e pão e a maioria das refeições principais são feitas á base de arroz, sem nada a acompanhar. Nancy, a vizinha a quem Pulgar entregou a filha, tem 54 anos, trabalha numa mercearia e tem cinco filhos. Aceitou cuidar da criança porque "não aguentaria ver a menina com fome", disse à Reuters. "Eu e o meu marido ensinamo-la a comportar-se, a estudar, a vestir-se, a falar... Ela trata-me por 'mãe' e ao meu marido por 'pai'", descreve. O caso de Pulgar é acompanhado pelos serviços sociais de Carirubana, uma organização não-governamental que dá apoio a este tipo de casos. "Registamos diariamente cerca de 12 pedidos de ajuda de pais sem recursos para continuar a cuidar dos filhos." "O principal motivo é falta de comida", disse Maria Salas, a directora da ONG à Reuters. O governo, garante, não presta qualquer auxílio. Segundo um inquérito levado a cabo pela organização não-governamental Cecodap, dedicada aos direitos das crianças, dois terços das famílias com filhos residentes em Caracas - de todas as classes sociais - revelaram não comer o suficiente para suprir as necessidades diárias.Existem, por isso, cada vez mais crianças em situações de risco, que recorrem à mendicidade e prostituição como forma de sobrevivência."As longas filas de supermercado que os pais são obrigados asuportar todos os dias, debaixo de um sol abrasador, tornam as suas vidas muito difíceis", explica. É um cenário que se repete por todo o país e que afecta 30 milhões de pessoas. Quatro autarquias locais e quatro grupos dedicados a serviços de assistência social confirmam o aumento do número de crianças entregues ao Estado, a instituições de caridade, amigos ou familiares. Nos hospitais registam-se mais casos de crianças a dar entrada com subnutrição e escorbuto. Há também pais que se limitam a abandonar as crianças. Em Novembro de 2016, um bebé foi encontrado dentro de um saco numa zona nobre da capital venezuelana; um menino malnutrido foi também encontrado dentro de um caixote na zona leste da Ciudad Guayana, de acordo com notícias locais.