Suécia faz as contas e diz-se preparada para deportar 80 mil pessoas

Nunca a mudança na política de asilo na Suécia foi tão evidente como agora. Das dez mil pessoas que quis expulsar em 2015, sete mil desapareceram dos radares das autoridades.

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Os novos controlos na fronteira com a Dinamarca ajudaram a reduzir a entrada de requerentes de asilo. Björn Lindgren/AFP

Vão longe os dias em que os governantes suecos insistiam na ideia de que as suas portas estavam abertas a quem quer que fugisse da perseguição e do conflito armado. “A minha Europa recebe as pessoas que fogem da guerra, a minha Europa não constrói muros”, declarava o primeiro-ministro Stefan Löfven aos vários milhares de pessoas que em Copenhaga exigiam um continente mais solidário. Era Setembro, princípio do Outono e eram então evidentes quais os países que na Europa mantinham a porta aberta a refugiados e os que, sobretudo no Leste, as blindavam com vedações.

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Vão longe os dias em que os governantes suecos insistiam na ideia de que as suas portas estavam abertas a quem quer que fugisse da perseguição e do conflito armado. “A minha Europa recebe as pessoas que fogem da guerra, a minha Europa não constrói muros”, declarava o primeiro-ministro Stefan Löfven aos vários milhares de pessoas que em Copenhaga exigiam um continente mais solidário. Era Setembro, princípio do Outono e eram então evidentes quais os países que na Europa mantinham a porta aberta a refugiados e os que, sobretudo no Leste, as blindavam com vedações.

Muito mudou desde então. As chegadas aumentaram até atingirem as dez mil novas pessoas por dia. As autoridades, alarmadas, começaram a alertar a coligação de sociais-democratas e Verdes para os riscos de segurança. Pediram reforços e disseram que era crucial reduzir as chegadas de requerentes de asilo ao país. O Governo mudou de agulha passado pouco mais de dois meses depois do discurso de Löfven em Copenhaga. “O sistema não resiste”, disse ao Parlamento, em Novembro. A vice-primeira-ministra chorou ao anunciar então novos controlos de fronteira. Pouco depois, no início do ano novo, a polícia começou a exigir identificação a quem chegasse da Dinamarca.

A mudança de tom na Suécia em relação à sua política de portas abertas nunca foi tão visível como nesta quinta-feira, quando um membro do Governo – o ministro do Interior, Anders Ygeman – fez pela primeira vez em público as contas de quantas pessoas poderiam ser deportadas nos próximos anos: entre 60 a 80 mil, disse, caso se mantenha a relação entre pedidos de asilo aprovados e rejeitados – dos 59 mil pedidos processados no ano passado, só 55% foram aprovados. Ygeman disse para além disso que a polícia se deveria preparar para novos desafios, como o de encontrar pessoas que presumivelmente se tentarão esconder para evitar a deportação. Anunciou também que a Suécia está a discutir com parceiros europeus o aluguer de aviões especiais para expulsar com a máxima eficácia os requerentes de asilo rejeitados – a Alemanha expulsou 20 mil pessoas em 2015.

A Finlândia também fez as suas contas e anunciouesta quinta-feira que conta expulsar cerca de dois terços dos 32 mil requerentes de asilo que foram registados o ano passado pelos serviços de imigração. Segundo o ministério do Interior cerca de 20 mil pessoas deverão ver o seu pedido de asilo rejeitado.

O  porta-voz do o ministro do Interior sueco explicou a intenção mensagem. “Claro que é uma maneira de dizer que se vêm para cá e não têm motivos para asilo, então não vão poder ficar”, disse Victor Harju, citado pelo jornal britânico Guardian. “Podem procurar asilo na Europa, mas há muitos mais países seguros onde não serão afectados pela guerra e perseguição, por isso não têm necessariamente que acabar na Suécia”, acrescentou. O objectivo, diz, é manter o nível de chegadas actual, muito mais baixo do que o de 2015. “Se continuar neste nível, esperamos 45 mil pedidos em 2016. Ainda um número muito alto, mas gerível.”

No último ano a Suécia recebeu 163 mil pedidos de asilo, mais do que qualquer outro país na Europa se se tiver em conta a sua população de menos de 10 milhões de habitantes. Está ainda longe de processar todos os pedidos, mas, dos 20 mil que já recusou, só metade saiu do país voluntariamente. Com a Dinamarca, a Sul, a começar o confisco de bens a quem procura lá asilo, a Suécia perdeu o rasto a sete mil pessoas a quem recusou dar protecção. Outros três mil foram deportados. “Temos um grande desafio pela frente”, disse Ygeman. “Precisaremos de usar mais recursos para isto e vamos precisar de melhor cooperação entre as autoridades.”

Crime e extrema-direita

À semelhança do que aconteceu na Alemanha depois de uma grande vaga de ataques a mulheres por jovens requerentes de asilo, a Suécia começa a dar cada vez mais tempo de antena a episódios de crime da população recentemente chegada ao país. Multiplicam-se os relatos de assédios e agressões a mulheres e, no início da semana, um jovem de 15 anos esfaqueou e matou uma trabalhadora sueca no centro de acolhimento em que esperava uma decisão sobre o seu pedido de asilo.

Nesse mesmo dia, o Governo ouviu novos apelos da polícia, que pede reforços para lidar com a explosão de casos de deportação, patrulha de centros de acolhimento e no combate ao terrorismo. O primeiro-ministro acedeu e anunciou mais meios para as autoridades policiais.

Apesar da mudança nas políticas de asilo, a coligação liderada por Stefan Löfven sofre ainda palas fronteiras que manteve abertas no último ano: a última sondagem nacional mostra que os sociais-democratas têm apenas 23% dos votos, uma queda íngreme face aos 31% que conseguiram em 2014. Já os Democratas Suecos, da extrema-direita e antimigração, crescem a um ritmo acelerado: têm 18% das intenções de voto.

A presumível deportação de dezenas de milhares de pessoas demorará. Quem chegar por estes dias à Suécia com um pedido de asilo terá de esperar entre 15 a 24 meses para que o país avalie o seu processo, dado o grande número de casos em atraso. Mas as palavras desta quinta-feira devem já surtir efeito, como dizia em Setembro o director do Instituto da Migração de Malmö, Pieter Bevelander, quando comentava a introdução de postos de controlo na fronteira: “O grande dissuasor será quando começar o rumor entre refugiados de que a Suécia deixou de aceitar mais pessoas.”