Turquia começa a julgar imã que Erdogan acusa de o querer derrubar

Entre os queixosos do processo que se abriu em Istambul estão o próprio Presidente turco e um dos seus filhos. O procurador pede prisão perpétua para Fethullah Gülen, julgado em ausência.

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Fethullah Gülen, o imã de 74 anos, é promotor de um islão moderado SELAHATTIN SEVI/ZAMAN DAILY/AFP

Já passou mais de ano e meio desde que o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, pediu aos Estados Unidos para extraditarem o seu antigo aliado e agora arqui-inimigo, Fethullah Gülen, o imã de 74 anos promotor de um islão moderado. A extradição nunca aconteceu e esta quarta-feira o líder religioso turco começou mesmo a ser julgado em ausência na Turquia.

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Já passou mais de ano e meio desde que o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, pediu aos Estados Unidos para extraditarem o seu antigo aliado e agora arqui-inimigo, Fethullah Gülen, o imã de 74 anos promotor de um islão moderado. A extradição nunca aconteceu e esta quarta-feira o líder religioso turco começou mesmo a ser julgado em ausência na Turquia.

Gülen escolheu sair da Turquia e vive na Pensilvânia desde 1998. É de lá que dirige a confraria Hizmet (serviço), um poderoso movimento sócio-religioso que conta com vários milhões de membros na Turquia, sendo muito influente na polícia e na magistratura. É acusado de conspirar para derrubar o Governo turco e de pertencer a um “grupo terrorista”, acusações que sempre desmentiu.

Estas são as acusações mais graves num processo que envolve 69 arguidos. A maioria são ex-agentes da polícia, mas no grupo inclui-se o antigo chefe da polícia de Istambul Yakup Saygili, e o antigo director adjunto da polícia criminal Kazim Aksoy. Ambos estão detidos desde Setembro de 2014 e estavam presentes na sessão desta quarta-feira.

Tudo começou no fim de 2013, quando a Justiça começou a investigar dezenas de pessoas por corrupção, incluindo Necmettin Bilal, filho de Erdogan, e mandou deter, entre outros, os filhos dos ministros do Interior, Muammer Güler, e da Economia, Zafer Caglayan, o director- geral do maior banco público, o Halk Bankasi, Suleyman Aslan, e o empresário Reza Zerrab, todos aliados do agora Presidente, então primeiro-ministro.

Em causa estavam alegados subornos em concursos públicos de construção e suspeitas de  corrupção, fraude e branqueamento de capitais em vendas de ouro e transacções financeiras entre a Turquia e o Irão. O Governo deixou cair alguns ministros, mas recusou sempre quaisquer actividades corruptas e Erdogan declarou guerra a Gülen, acusando-o de ter constituído “um Estado dentro do Estado” destinado a provocar a sua queda.

Aos escândalos de corrupção seguiu-se uma verdadeira purga na polícia e na Justiça, com dezenas de responsáveis afastados por terem “ultrapassado o seu poder”. Muitos teriam sido colocados nos seus cargos por influência de Gülen, quando este e Erdogan eram aliados. Aliás, o imã foi fundamental na ascensão política de Erdogan e na guerra que este lançou contra a influência dos militares, autores de três golpes de Estado ao longo do século XX.

As represálias do líder turco estenderam-se a apoiantes de Gülen e aos seus interesses financeiros na Turquia. Segundo media próximos do Governo, 1800 seguidores do imã foram detidos nos últimos dois anos.

Erdogan e Gülen já se tinham afastado e, pouco antes dos escândalos de corrupção, o Governo decidiu fechar escolas privadas de preparação para os exames de acesso à universidade, argumentando que davam uma vantagem injusta aos alunos com dinheiro. Estas escolas eram uma importante fonte de financiamento para o Hizmet de Gülen, mas os seus seguidores garantem que esta medida não teve nada que ver com a ruptura.

Saygili e Aksoy são acusados de terem ordenado as investigações sobre corrupção. Na abertura do julgamento, o procurador de Istambul pediu prisão perpétua para Gülen e para estes antigos responsáveis. Para os restantes 66 arguidos foram pedidas penas dos sete aos 300 anos de prisão.

Entre os queixosos estão o próprio Erdogan, o seu filho Bilal, o seu genro Berat Albayrak, os quatro ministros que se demitiram por causa das acusações de corrupção e o chefe dos serviços secretos da Turquia, Hakan Fidan.

O escândalo foi um dos grandes desafios ao domínio de Erdogan, poucos meses depois da vaga de protestos pacíficos que começou com uma concentração contra a demolição de um parque de Istambul e que o Governo reprimiu com brutalidade. Erdogan sobreviveu, e, em Agosto de 2014, foi eleito Presidente.