Peso dos salários na economia volta a subir após estar ao nível mais baixo desde 1960

Portugal inicia o ano com o peso dos salários na economia ao nível mais baixo dos últimos 55 anos. As medidas que entram agora em vigor podem, pelo menos no imediato, mudar a tendência.

Foto
Descida dos salários deve-se a menos empregados e forte moderação (ou retracção) do valor dos ordenados Rita Chantre

Ano novo, nova política económica. Com o ano de 2015 a terminar com o peso dos salários no PIB ao nível mais baixo das últimas cinco décadas, os primeiros dias de Janeiro de 2016 ficam marcados pela passagem à prática das medidas que concretizam a intenção do Governo de aumentar de forma mais rápida o rendimento disponível dos portugueses, especialmente os provenientes dos salários. E o debate entre os defensores e os opositores dessa opção promete continuar aceso ao longo do ano.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Ano novo, nova política económica. Com o ano de 2015 a terminar com o peso dos salários no PIB ao nível mais baixo das últimas cinco décadas, os primeiros dias de Janeiro de 2016 ficam marcados pela passagem à prática das medidas que concretizam a intenção do Governo de aumentar de forma mais rápida o rendimento disponível dos portugueses, especialmente os provenientes dos salários. E o debate entre os defensores e os opositores dessa opção promete continuar aceso ao longo do ano.

Entre as medidas que entram agora em vigor estão a subida do valor do salário mínimo nacional, o início de uma reversão dos cortes salariais mais rápida que ficará concluída já no decorrer deste ano e a redução (eliminação em alguns casos) da sobretaxa de IRS. Tudo medidas que terão, pelo menos no imediato, um impacto directo no rendimento disponível de muitos portugueses: 515 mil no caso do salário mínimo, 330 mil funcionários públicos actualmente com cortes e a maior parte dos contribuintes no que diz respeito à sobretaxa.

Esta mudança de política surge depois de vários anos em que foram raras as notícias positivas para a maioria dos portugueses sobre a evolução dos seus rendimentos, em especial aqueles que são provenientes dos salários.

Em 2015, de acordo com os números publicados pela Comissão Europeia, o peso dos salários no PIB cifrou-se em 51,9%. Este número representa a continuação de uma tendência de descida deste indicador que se faz sentir de forma quase ininterrupta desde o início do milénio e que se acentuou a partir de 2009, com os impactos da crise. Em 1998, antes da entrada de Portugal na moeda única, o peso dos salários do PIB era de 60,1%. Passados 17 anos, este número caiu em quase 10 pontos percentuais.

O valor registado em 2015 marca (tal como acontecera já com o de 2014) um novo mínimo histórico desde 1960, o primeiro ano para o qual há dados disponíveis.

Foto

Em comparação com os outros países, Portugal que tinha até há cinco anos, um peso dos salários na economia que era superior ao da média europeia, está agora claramente abaixo, sendo o sexto país da moeda única com o valor mais reduzido e o terceiro em que este indicador mais caiu nos últimos cinco anos (apenas menos que a Irlanda e Chipre).

Isto significa que, se é verdade que toda a economia caiu desde 2010, os salários caíram mais: 8,4% em termos nominais. Uma descida que é o resultado combinado da redução do número de pessoas empregadas e da forte moderação (e em alguns casos retracção) do valor dos salários pagos. No total da zona euro, no mesmo período, subiram 9,1%.

O rendimento disponível dos portugueses caiu menos: 4,6%. Na Grécia, a queda foi 21,5%, enquanto no total da zona euro se assistiu a uma subida de 6,2%. A ajuda pela positiva veio das transferências feitas pelo Estado para as famílias com benefícios sociais (como o subsídio de desemprego) que subiram 5,6% neste período, ainda assim menos que na zona euro, onde cresceram 10,6%.

As medidas agora colocadas em prática deverão ter, parece certo, um efeito imediato nestes indicadores, nomeadamente com uma subida do peso dos salários na economia. Em relação ao efeito a prazo, tanto nos salários como no andamento da economia como um todo, a discussão mantém-se.

Do lado do Governo a expectativa é a de que, com esta indução de um crescimento imediato no rendimento disponível das famílias, a economia portuguesa vai ter uma ajuda necessária proveniente do consumo, o que por sua vez contribuirá para a viabilidade de empresas e para o aumento do investimento e do emprego, com efeitos também ao nível da receita fiscal. No seu programa, o Executivo defende que esta política “constitui, nas condições actuais da economia portuguesa, uma alavanca de curto prazo para a melhoria dos índices da actividade económica e, em consequência, para mais e melhores oportunidades no mercado de trabalho”.

Na oposição à direita do governo, a expectativa em relação ao resultado destas medidas é bastante diferente. São duas as dúvidas que se colocam. Uma tem a ver com o impacto nas contas públicas, já que parte do aumento do rendimento disponível é garantido com mais despesa pública com salários, pensões e menos receita fiscal com a sobretaxa. PSD e CDS defendem que tal não será compensado por uma melhoria da actividade económica.

A outra incerteza está relacionada com uma eventual perda de competitividade das empresas portuguesas devido ao aumento dos custos laborais, o que combinado com um estímulo ao consumo, poderia conduzir a uma deterioração do equilíbrio externo da economia portuguesa.

Para chegar a uma conclusão final sobre quem tem razão será necessário esperar mais algum tempo, para medir os efeitos na economia da política agora iniciada. Uma coisa é certa: o debate promete continuar animado durante este ano e mesmo ao longo da legislatura.