Manifestantes viram-se contra Erdogan, Governo turco suspeita do Estado Islâmico

Num clima de suspeita política, autoridades tentam identificar responsáveis pelo atentado em Ancara em que podem ter morrido 128 pessoas.

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“Chefe e assassino Erdogan”, “morte ao fascismo”, gritavam os manifestantes, fazendo-se eco das acusações sobre a autoria do atentado a que Selahattin Demirtas, líder do HDP, dava voz. “Estamos de luto, estamos tristes, mas também estamos furiosos”, declarou, perante a manifestação na praça Sihhiye, no centro da capital turca.

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“Chefe e assassino Erdogan”, “morte ao fascismo”, gritavam os manifestantes, fazendo-se eco das acusações sobre a autoria do atentado a que Selahattin Demirtas, líder do HDP, dava voz. “Estamos de luto, estamos tristes, mas também estamos furiosos”, declarou, perante a manifestação na praça Sihhiye, no centro da capital turca.

O primeiro-ministro, Ahmet Davutoglu, enumera como suspeitos o Partido/Frente Revolucionária de Libertação do Povo (DHKP-C), um grupo de extrema-esquerda que cometeu muitos ataques na Turquia desde a década de 1970 e, sobretudo, o grupo jihadista Estado Islâmico (EI) – apontado como suspeito do atentado em Suruç, a 20 de Julho, que matou 32 jovens activistas curdos que se preparavam para partir para ajudar a reconstruir Kobani, a cidade no Curdistão sírio que tinha sido reconquistada ao EI. Embora nunca tenha sido reivindicado, são atribuídas as culpas a esse grupo.

Após o atentado, o país, em choque, procura os culpados. Foi “uma bomba nos nossos corações”, dizia a primeira página do diário Hürriyet, expressando o sentimento popular. “Em cólera profunda, as pessoas esperam para saber quem esteve por trás deste ataque”, escreve o jornal.

Mas ninguém reivindicou o ataque, sendo que um dos prováveis bombistas suicidas foi identificado como um homem entre os 25 e os 30 anos, de acordo com uma análise dos corpos no local e das impressões digitais obtidas, segundo o jornal Yeni Safak, pró-Governo.

O atentado visou uma manifestação que reunia sindicalistas e simpatizantes do HDP, pró-curdo, três semanas antes das eleições legislativas, para protestar contra a ofensiva lançada pelo Governo contra os separatistas curdos do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) após o atentado de Suruç – numa estratégia de luta contra “todos os terrorismos”, o dos curdos, o do EI e o da extrema-esquerda.

Por isso, aviões turcos começaram a bombardear na madrugada de domingo alvos do PKK no Norte do Iraque e no Sudeste da Turquia. Isto depois de os manifestantes pró-curdos terem sido massacrados no mais mortífero atentado da História da Turquia moderna, e depois de o PKK ter ordenado aos seus militantes que parassem com toda a actividade no país até às eleições antecipadas de 1 de Novembro.

 “O cessar-fogo do PKK não significa nada para nós. As operações vão continuar”, disse uma fonte militar à Reuters. O vice-primeiro-ministro, Yalcin Akdogan, já tinha dito que o anúncio do PKK não é mais que “uma táctica” pré-eleitoral – na expectativa de favorecer o HDP. A entrada no Parlamento deste partido nas eleições de Junho fez com que o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), o partido do Presidente Recep Erdogan e de Davutoglu, não obtivesse uma maioria suficiente, pela primeira vez desde 2002, para formar governo sozinho nem para mudar a Constituição e transformar a Turquia num regime presidencialista.

O AKP também não conseguiu formar uma coligação governamental, pelo que foram convocadas novas eleições. E acabaram as conversações com os separatistas curdos que duravam há alguns anos, substituída por uma política de confronto.

“Esta estratégia foi baseada na presunção de que a violência levaria os votos dos nacionalistas e dos conservadores para o AKP”, escreveram os analistas da Brookings Institution, Kemal Kirisci e Sinan Ekim, num ensaio de Setembro. Erdogan “reforçou esta estratégia ao retratar o HDP e Demirtas como aliados do PKK, e portanto como responsáveis pela actual instabilidade”.

É por isso que o HDP e o seu líder Demirtas atribuem culpas ao AKP e a Erdogan, cuja acção nos últimos tempos tem sido também de forte repressão dos media e dos próprios jornalistas, além de violência contra os curdos. Por isso, e porque a Turquia tem uma longa história de redes ligadas aos serviços secretos e aos militares, durante os tempos da junta militar e mesmo depois, envolvidos em atentados e acções suspeitas – aquilo a que os turcos chamam o “Estado Profundo”.