A doença de Portugal

O Portugal mágico de felicidade e de justiça só vive no fanatismo deles.

O que nós, no fundo, queríamos ser era um modelo do que se chamava um país próspero e ordeiro, como Paris nos dizia que fôssemos. Havia, no entanto, uma pequena dificuldade: não tínhamos dinheiro, excepto o que até ao fim do século XIX nos vinha do Brasil, o que pedíamos emprestado à banca internacional e as remessas da emigração. Quando a Ditadura caiu o cidadão comum não pensava em África (e muito menos no Império), pensava nos salários da Alemanha, no Estado Social da Suécia, na suavidade fiscal do Luxemburgo e no parlamentarismo da última república que de Gaulle higienicamente eliminara.

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O que nós, no fundo, queríamos ser era um modelo do que se chamava um país próspero e ordeiro, como Paris nos dizia que fôssemos. Havia, no entanto, uma pequena dificuldade: não tínhamos dinheiro, excepto o que até ao fim do século XIX nos vinha do Brasil, o que pedíamos emprestado à banca internacional e as remessas da emigração. Quando a Ditadura caiu o cidadão comum não pensava em África (e muito menos no Império), pensava nos salários da Alemanha, no Estado Social da Suécia, na suavidade fiscal do Luxemburgo e no parlamentarismo da última república que de Gaulle higienicamente eliminara.

Os fundos de Bruxelas atenuaram durante 30 anos de alguma tranquilidade e progresso a insatisfação indígena, enquanto pelo meio o “cavaquismo” na sua língua-de-trapos proclamava falsamente que Portugal “estava na moda” ou no “pelotão da frente”. Mas, retórica à parte, o país não crescia e continuava longe da modernidade, da riqueza e da independência mítica com que os portugueses sonhavam desde o princípio de novecentos. À superfície, a imitação do modelo europeu ia enganando os mais crédulos, mas não enganava quem não ignorava a verdadeira situação do país. O castelo de cartas da nossa tão gabada democracia não aguentaria o menor solavanco.

E o solavanco veio em 2008-2010, mostrando a miserável realidade das coisas, como já mostrara em 1807 com a invasão francesa e o fim do monopólio comercial com o Brasil; e em 1890-93 com o ultimato dos credores. Os portugueses foram outra vez separados das suas fantasias. Só que uma parte deles não desistiu de uma ilusão de séculos e continuou a imaginar que o desastre era a obra de forças maléficas, que a salvífica intervenção do povo iria liquidar. Sem um tostão e com muita propaganda andam ainda por aí e gozam de uma certa respeitabilidade. Mas nunca mudarão nada, como não mudaram os liberais, nem os republicanos, nem a extrema-esquerda em 1975. O Portugal mágico de felicidade e de justiça só vive no fanatismo deles. Ganhem ou não ganhem em 4 de Outubro o destino deles (como o nosso) não será agradável.