Portugal, Espanha e Irlanda têm sido “moderados” com a Grécia

Os países do resgate defenderam, nos últimos dias, que não devia haver decisões antes do referendo grego – a posição oficial ontem anunciada por Angela Merkel. Uma posição a meio caminho entre os radicais de Leste e a abertura a um acordo revelada pela Alemanha, França e Itália.

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A posição de Passos Coelho foi criticada por Tsipras em Fevereiro JOHN THYS/AFP

Portugal não integra, assim, o grupo dos pequenos países a que se referiu ontem o ministro das Finanças francês, quando afirmou à RTL que “os mais duros não são os alemães, mas os pequenos países que fizeram significativos esforços”. Michel Sapin citou mesmo os casos da Eslovénia e da Eslováquia, mas o PÚBLICO sabe que nestes mais radicais incluem-se outros países bálticos, em especial a Letónia. Por dois grandes motivos: a proximidade do governo grego a Putin deixa aqueles países “com os cabelos em pé”, mas também porque não compreendem por que razão países que têm um Produto Interno Bruto maior que o seu – e provavelmente um melhor nível de vida – têm de ser ajudados.

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Portugal não integra, assim, o grupo dos pequenos países a que se referiu ontem o ministro das Finanças francês, quando afirmou à RTL que “os mais duros não são os alemães, mas os pequenos países que fizeram significativos esforços”. Michel Sapin citou mesmo os casos da Eslovénia e da Eslováquia, mas o PÚBLICO sabe que nestes mais radicais incluem-se outros países bálticos, em especial a Letónia. Por dois grandes motivos: a proximidade do governo grego a Putin deixa aqueles países “com os cabelos em pé”, mas também porque não compreendem por que razão países que têm um Produto Interno Bruto maior que o seu – e provavelmente um melhor nível de vida – têm de ser ajudados.

Já os países do resgate assumiram, pelo menos nesta última fase das negociações, uma posição considerada “moderada” ou a meio caminho, insistindo na necessidade de se esperar pela decisão do referendo grego do próximo domingo. Posição que acabou por prevalecer, tanto no Eurogrupo como no Conselho Europeu.

Essa posição foi expressa pelo ministro das Finanças irlandês no final da semana passada, quando afirmou que “a Grécia tem o direito a fazer o referendo”. E ontem repetida pelo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que afirmou respeitar “plenamente” esse direito. "É um referendo que tem importância dentro da vida política e constitucional da Grécia. Portanto, não quero estar desvalorizar o referendo nem o seu resultado, mas também não tenho de o comentar, nem tenho de interferir nesse processo. Era amplamente desejável que os países europeus se abstivessem de fazer comentários sobre essa situação, ao nível dos seus governos, dos seus dirigentes, para não interferir no próprio processo de escolha que cabe ao povo grego", acrescentou.

Um discurso que não faz destes países “bonzinhos”, como explica a mesma fonte de Bruxelas. No fundo, o que Portugal, Espanha e Irlanda querem é colocar Tsipras em maus lençóis, pois qualquer que seja a resposta ao referendo, coloca o ónus sobre a Grécia, e não sobre a Europa. Se vencer o sim à manutenção no euro, isso desautorizará o governo do Syriza. Se vencer o não, a responsabilidade por uma eventual saída do euro será assacada unicamente aos gregos, retirando o ónus de cima das instituições europeias e, sobretudo, de Angela Merkel.

Difícil para os países do resgate seria que a liderança europeia tivesse chegado a um acordo que desse a Atenas condições que aqueles não tiveram – e que chegou a ser defendido pela Alemanha (apesar das diferenças entre a chanceler Merkel e o seu ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble), França e Itália, para evitar o referendo e um eventual Grexit. Isso poderia ser usado pelas suas oposições e opiniões públicas internas para punirem nas urnas os governos português e espanhol, que vão a votos antes do fim do ano.

Mas a posição extremada contra qualquer negociação, com ou sem referendo – como a assumida pelos países de Leste – também seria contraproducente para as suas economias ainda em recuperação depois dos programas de ajustamento.  

“Portugal sabe muito bem como são enormes os riscos da Grécia cair, e como são imprevisíveis as consequências para o país”, afirma a mesma fonte. Mas ao mesmo tempo “tem de ensaiar um discurso mais duro do que aquele em que acredita, para dar aos mercados os sinais de distanciamento face à Grécia” e conter o efeito dominó.

Ao fim da tarde de ontem, Passos Coelho revelava algum alívio, ao insistir na ideia de que o processo negocial dos últimos meses "ficou concluído ontem [terça-feira], com o termo da extensão do próprio programa", e não será prolongado. "Quero insistir, porque me parece que às vezes na comunicação no espaço público pode não ser tão claro, que a matéria negocial que se desenvolveu até final da semana passada é uma matéria que faz parte da história", disse. E lembrou que as necessidades de financiamento da Grécia “existem qualquer que seja o Governo grego e qualquer que seja o resultado do referendo".

Posição moderada foi diplomaticamente “construída”
Nem sempre terá sido essa a posição de Portugal no Eurogrupo face às reivindicações de Atenas. Logo em Fevereiro, foram públicas as acusações de Alexis Tsipras numa reunião do Syriza: “Deparámo-nos com um eixo de poderes, liderado pelos governos de Espanha e de Portugal que, por motivos políticos óbvios, tentou levar a Grécia para o abismo durante todas as negociações”. Passos Coelho desmentiu, mas o tom de confronto foi repetido pelo jornal Die Welt, quando escreveu que Maria Luís Albuquerque “pediu pessoalmente” ao seu homólogo alemão,  Wolfgang Schäuble, para não ceder às pretensões de Atenas. E dias depois, ainda em Fevereiro, Yanis Varoufakis, o ministro grego das Finanças acentuou a ideia, afirmando que os ministros de Portugal e Espanha eram “mais alemães do que a Alemanha”. A ministra das Finanças também recusou o epíteto, mas a imagem de intransigência dos países ibéricos ficou.  

Mais recentemente, não se encontra já nenhuma declaração pública nesse sentido. “À medida que os riscos se tornaram visíveis, o discurso [de Portugal] foi-se moderando”, afirma fonte portuguesa em Bruxelas. A convicção de quem tem acompanhado todo o processo é que “a construção desta posição moderada de Portugal foi previamente articulada” com conversas prévias nos bastidores europeus e diplomáticos, que podem ter envolvido autoridades norte-americanas e eventualmente também chinesas.

Ainda ontem, Passos Coelho recebeu em S. Bento o ministro do Departamento de Publicidade do Comité Central do Partido Comunista da China, Liu Qibao, que na véspera tinha estado em Espanha, onde se reuniu com altos dirigentes do PP e do PSOE. Isto dias depois de, pela primeira vez, a China ter defendido a continuação da Grécia na zona euro. No sábado, depois da reunião falhada do Eurogrupo, o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês mostrou-se disponível para "contribuir" para uma solução para a crise. Declarações que provam que a crise grega é hoje um problema à escala mundial.