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São João de Deus: "Tudo apodrece devagar no Tarrafal"

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Era uma manhã de nevoeiro cerrado do mês de Dezembro de 2014. A curiosidade de Bruno da Silva em relação ao extinto São João de Deus, no Porto, era grande. Tinham passado seis anos da demolição de um dos mais problemáticos bairros sociais da cidade e o fotógrafo, de 31 anos, achava que havia uma lacuna no que ao registo deste espaço dizia respeito: "Encontrei fotografias do Bruce Gilden, da Magnum Photos, em 1998, da comunidade cigana que na altura 'dominava' a maioria do bairro. Além disso, pouco encontrei", disse ao P3. O nevoeiro matinal "impingiu" uma narrativa visual a Bruno, que a partir daquele dia começou a fotografar sempre entre as seis e as oito da manhã, antes do nascer do sol. O projecto — baptizado de "Tarrafal", tal como era conhecido o bairro portuense — é um "work in progress", para que "seja visível a passagem do tempo através das fotografias". "O meu objectivo é criar uma série pertinente que, além de documentar o lugar, faça sentir o que é estar naquele local sete anos após a sua demolição." E como se sentiu Bruno da Silva no bairro? "Ao entrar sente-se um vazio e uma tensão estranha ao ver a dimensão do abandono", diz. "As ruas e caminhos onde circulavam mais de 1000 toxicodependentes por dia estão agora vazias e só o lixo e o entulho conseguem ocupar o espaço onde existiam os blocos habitacionais. Os carros são raros e as pessoas, que ainda vivem na parte mais antiga do bairro (construído nos anos 40), sentem-se seguras, mas também abandonadas. Tudo apodrece devagar." A série fotográfica tenta "fotografar de forma pessoal o espírito local, o que foi, o que resta e no que se tornou" o São João de Deus. E desenha-se "de forma circular, à imagem do que eram os trajectos de tráfico de droga no bairro".