O fulano e o cidadão

São já três os problemas substanciais levantados a propósito da prisão preventiva de Sócrates que não me agradam nem um bocadinho.

Os amigos de José Sócrates não lhe têm facilitado a vida: há uma espécie de guarda pretoriana do regime, de Mário Soares a Almeida Santos, que está tão convencida da superioridade democrática socialista que acaba a dizer as maiores barbaridades a coberto de uma indignação nebulosa, cujo objectivo prático é a defesa de um tratamento de privilégio para os amigos. Mas se este posicionamento é inadmissível e deve ser criticado com veemência, não devemos cair no extremo oposto, e ignorar as manifestas injustiças do sistema de prisão preventiva só porque a pessoa em causa se chama José Sócrates e – ironia das ironias – as actuais regras que regem as medidas de coacção terem sido por ele aprovadas enquanto primeiro-ministro.

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Os amigos de José Sócrates não lhe têm facilitado a vida: há uma espécie de guarda pretoriana do regime, de Mário Soares a Almeida Santos, que está tão convencida da superioridade democrática socialista que acaba a dizer as maiores barbaridades a coberto de uma indignação nebulosa, cujo objectivo prático é a defesa de um tratamento de privilégio para os amigos. Mas se este posicionamento é inadmissível e deve ser criticado com veemência, não devemos cair no extremo oposto, e ignorar as manifestas injustiças do sistema de prisão preventiva só porque a pessoa em causa se chama José Sócrates e – ironia das ironias – as actuais regras que regem as medidas de coacção terem sido por ele aprovadas enquanto primeiro-ministro.

São já três os problemas substanciais levantados a propósito da prisão preventiva de Sócrates que não me agradam nem um bocadinho. Em primeiro lugar, a proibição de conceder uma entrevista presencial ao Expresso, com o argumento de que as suas respostas poderiam condicionar o depoimento de testemunhas. Seria um argumento atendível, não fosse o facto de o segredo de justiça ser diariamente violado e os jornais estarem pejados de pormenores sobre a investigação – será que isso não condiciona o depoimento das testemunhas e da opinião pública? A partir do momento que o segredo de justiça inexiste e Sócrates pode estar um ano inteiro em prisão preventiva, o seu direito à palavra não pode ser atropelado.

Segundo aspecto: as visitas da família. Neste caso, terá sido José Sócrates a recusar um tratamento de excepção, mas convém ficar claro que ele deveria tê-lo. A família de José Sócrates, em particular os seus dois filhos menores, têm todo o direito de visitar o pai sem terem de passar pelo calvário dos microfones e das câmaras de televisão. O Correio da Manhã já prometeu em editorial que não filmará os filhos, mas deveriam ser os próprios serviços prisionais a providenciar para que isso acontecesse. Os tratamentos de excepção justificam-se para situações de excepção, e aqui não se trata só dos direitos de Sócrates – trata-se do direito de dois menores poderem visitar o pai sem serem importunados por isso.

terceira questão prende-se com o dilúvio de encomendas que parece ter-se abatido sobre a cadeia de Évora e a histriónica denúncia de António Arnaut acerca do livro que voltou para trás. Um advogado só ter descoberto agora as regras das prisões portuguesas é bastante ridículo, mas o facto de um preso preventivo só poder receber uma encomenda por mês é mais do que ridículo – é totalmente inaceitável. Inaceitável num condenado, e ainda mais inaceitável num preso preventivo, que dentro do sistema judicial tem o estatuto de presumível inocente. Só reparámos nisto porque o preso em questão se chama José Sócrates? Sim, é verdade. Mas o sistema não passa a ser subitamente mais justo por causa disso.