Jardim alterou projecto de revisão aprovado pela Assembleia da Madeira

A decisão de desencadear neste momento o processo de revisão constitucional na Assembleia da República partiu de Alberto João Jardim, que pretende acentuar a ruptura com a direcção de Passos Coelho.

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Jardim disse que Merkel se enganou e confundiu a Madeira com uma região industrial do centro da França Daniel Rocha

A apresentação tinha sido decidida pelo conselho regional do PSD que, sob proposta do presidente Alberto João jardim, tinha incumbido os deputados da respectiva bancada no parlamento regional de defender e aprovar o projecto, apesar de não terem tido prévio conhecimento do seu teor. O compromisso envolvia ainda os quatro deputados sociais-democratas eleitos pela Madeira, que agora foram incumbidos de desencadear o processo na Assembleia da República, com a inesperada entrada na Assembleia da República da proposta aprovada no parlamento madeirense.

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A apresentação tinha sido decidida pelo conselho regional do PSD que, sob proposta do presidente Alberto João jardim, tinha incumbido os deputados da respectiva bancada no parlamento regional de defender e aprovar o projecto, apesar de não terem tido prévio conhecimento do seu teor. O compromisso envolvia ainda os quatro deputados sociais-democratas eleitos pela Madeira, que agora foram incumbidos de desencadear o processo na Assembleia da República, com a inesperada entrada na Assembleia da República da proposta aprovada no parlamento madeirense.

Mas tanto o timing da apresentação como as alterações introduzidas no texto foram decididos por Jardim, em concertação com o deputado Guilherme Silva, sem prévio conhecimento dos membros dos órgãos regionais do PSD e do governo regional. Tudo culminando com declarações do líder madeirense que, em ruptura com Passos Coelho, disse não acreditar que a actual direcção do PSD ganhe as eleições legislativas agendadas para 2015 e defendeu que se devia discutir a liderança nacional do partido.

A entrada do projecto em São Bento, dois dias antes da apresentação do estudo “Deve e haver”, corresponde a uma estratégia definida unilateralmente por Jardim, apenas justificada pela sua “característica teimosia” e atracção pela ribalta”, dizem dirigentes regionais. E foi desaconselhada por alguns seus mais directos colaboradores que consideram inoportuno e até “provocatório” avançar com estas iniciativas, à revelia do líder nacional do partido e primeiro-ministro, num momento em que a Madeira tenta negociar um novo empréstimo de 950 milhões, para fazer face a necessidades de tesouraria, e a flexibilização do plano de resgate, na sequência da saída da troika.

“Não é oportuno o PSD Madeira, ou qualquer outra entidade, apresentar um projecto de revisão constitucional”, porque “a ambiente político nacional não está para aí virado”, advertiu Miguel de Sousa, vice-presidente da assembleia regional no programa de candidatura à liderança do PSD madeirense.

Sousa, convicto de que “o próprio PSD nacional não irá apoiar a nossa iniciativa”, defendeu que esta “deve ser apresentada em momento oportuno para obtermos as vantagens que precisamos”. A revisão constitucional, assumiu o antigo vice de Jardim, “é o único instrumento negocial que pode fazer inverter esta lamentável crise em que nos encontramos”.

Com um novo título “Autonomia século XXI (Renovar Abril)”, o projecto que deu entrada em São Bento associa esta iniciativa à comemoração do 40º aniversário da Revolução dos Cravos. A oportunidade de revisão da Lei Fundamental é justificada pelo “interesse nacional” e pela “circunstância de o país ter estado, até há pouco, submetido a um resgate financeiro”. 

Daí resulta, por exemplo, a consagração da “regra de ouro”, que não estava prevista no projecto aprovado na Madeira. Segundo a nova norma, “o orçamento fixa, no início de cada legislatura, os limites do défice para os quatro exercícios subsequentes, com vista a assegurar o equilíbrio das finanças públicas, bem como o necessário crescimento económico e a sustentabilidade do Estado Social”.

Outras alterações
Entre as alterações ao documento original, determina-se que nas “Regiões Autónomas os impostos podem ser criados por lei regional”. Também por lei regional são fixados “o regime, condições de utilização e limites do domínio público das Regiões Autónomas”, um tema que na Madeira tem suscitado polémicas com o Tribunal Constitucional. Este órgão é, com a Entidade Reguladora para a Comunicação Social e Comissão Nacional de Eleições, eliminado no projecto, sendo substituído por uma secção do Supremo Tribunal de Justiça.

Também não previsto no texto original, propõe-se que o Tribunal de Contas seja impedido de “formular juízos de oportunidade política, económica ou financeira” e que nas suas secções regionais os juízes conselheiros e magistrados do Ministério Público “não podem permanecer mais de três anos”, tempo a que também fica limitada a permanência dos juízes e procuradores na mesma comarca.

Por outro lado, o documento entregue em Lisboa suprime os seis pontos do artigo 155-A (trabalhos parlamentares), com que a assembleia madeirense pretendia travar qualquer “perturbação dos plenários”, com aconteceu por iniciativa do deputado José Manuel Coelho. Em vez desse articulado, estabelece-se que, no regimento da assembleia regional, da sua própria competência, sejam adoptadas as regras de disciplina vigentes no Parlamento Europeu.

O projecto de revisão propõe a criação de um sistema fiscal próprio na Madeira e Açores, elimina o cargo de representante da República nas regiões autónomas e abre a candidaturas independentes as portas das Assembleias da República e Legislativas dos Açores e da Madeira. Para a Assembleia da República adopta um círculo nacional e círculos uninominais em todo o país, que elegem 181 deputados, em vez dos actuais 230. Por seu lado, o parlamento regional deverá ser composto por 31 deputados, menos que os actuais 47 da Madeira e 57 dos Açores, devendo as candidaturas ser propostas em listas subscritas por mil eleitores.

Ainda no âmbito do sistema eleitoral, preconiza a duração de 10 anos para o mandato do Presidente da República, não admitindo a reeleição para um segundo mandato consecutivo, nem durante o decénio imediatamente subsequente ao termo do mandato”.

“Constituição é lixo”
Na abertura do debate parlamentar urgente sobre a revisão constitucional que decorreu há um ano na Madeira, o porta-voz do PSD, Coito Pita, afirmou que “a nossa Constituição é lixo, nada vale”. Para justificar a classificação de “lixo” atribuída à Constituição da República Portuguesa, considerada “o problema dos problemas”, Coito Pita afirmou que “basta ver o que fez a troika que a empacotou".

Em Novembro de 2011, no encerramento do congresso regional do PSD, Jardim insistiu na revisão constitucional e ameaçou avançar com um projecto próprio caso o PSD nacional não tomasse tal iniciativa nesta legislatura. Mas Passos Coelho chumbou de imediato a proposta, esclarecendo que “não vale a pena perder tempo com fantasmas” da revisão. É no quadro dos actuais poderes que a Madeira deverá “resolver os seus problemas sem comprometer os limites constitucionais que hoje temos", advertiu.

Agora, a direcção nacional do PSD reiterou que a iniciativa madeirense é “extemporânea”.