O Vila Joya fez as malas e instalou-se no Palácio de Seteais

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A sala onde vão ser servidas as refeições by Vila Joya; ao lado, Dieter Koschina

Até meados de Fevereiro, um dos dois restaurantes que existem em Portugal com duas estrelas Michelin está mais perto de Lisboa: o chef Koschina e a equipa do Vila Joya deixaram o Algarve e mudaram-se para Sintra. Serão dois meses num palácio romântico, servindo refeições quase íntimas. Alexandra Prado Coelho (texto) e Helena Colaço Salazar (fotos)

Portugal sofre habitualmente de um desequilíbrio geográfico no que diz respeito às estrelas Michelin. É que os dois únicos restaurantes que até agora conquistaram duas estrelas - o Vila Joya e o Ocean, do Vila Vita Parc - estão no Algarve, o primeiro em Albufeira, o segundo em Porches. Mas agora esse desequilíbrio vai ser ligeiramente corrigido, com a subida temporária de um deles um pouco mais para norte - a partir de ontem e durante dois meses, o Vila Joya, do chef austríaco Dieter Koschina, estará instalado no Tivoli Palácio de Seteais. É um pop up do Vila Joya em Sintra.

Koschina nunca tinha estado em Seteais. Quando o encontramos, o chef acaba de aterrar em Lisboa, vindo da Áustria - acompanhado pelo director executivo do Vila Joya, Gebhard Schachermayer, veio directamente para o palácio. Mas na cozinha há uma semana que alguns membros da sua equipa estão já a preparar tudo.

Quem, por estes dias, tivesse entrado no hotel quase não teria dado por eles. O staff do Vila Joya - serão seis pessoas na cozinha e quatro no serviço de sala - tem estado, discretamente, a organizar aquilo a que no palácio costumam chamar a "velha cozinha". Trata-se, na realidade, de um espaço pequeno que há muito deixou de ser usado como cozinha e passou a ser, essencialmente, um local de arrumação.

Mas Koschina e um dos seus sub-chefs, Stephan Langmann, também austríaco, que estará aqui em permanência durante os próximos dois meses, não se deixaram intimidar. Do Vila Joya veio todo o equipamento - frigoríficos, fogões, mesas. E quem entrasse na "cozinha velha" na terça-feira passada já ia encontrar algo que se assemelhava muito a... uma cozinha.

"Dois de nós chegámos há uma semana, e no domingo começámos a cozinhar", diz Guilherme Quintas, que será o responsável pelas entradas dos almoços e jantares que serão servidos até 14 de Fevereiro, de quinta-feira a domingo. Está ocupado a deitar um pó branco sobre umas bases redondas e transparentes. É, precisamente, uma das entradas. "Usamos um tipo de açúcar a que juntamos algas nori em pó", explica. "Vai ao forno a 180 graus e fica uma base que pode ser moldada. Dobramos ao meio e o resultado é uma espécie de rissol doce e amargo, que é servido com sashimi de salmão e maionese de wasabi."

A azáfama é grande. O primeiro almoço só seria servido na quinta-feira, mas a adaptação ao novo espaço exige muito trabalho prévio. Esta é a primeira vez, em sete anos, que o Vila Joya fecha no Algarve por um período superior a um mês, lembra Gebhard Schachermayer. E é a primeira vez que o restaurante faz uma experiência de deslocalização. Koschina confessa que está curioso para ver como vai ser o encontro com o que imagina que será um público novo, vindo sobretudo de Lisboa.

"No Vila Joya temos mais estrangeiros", diz o chef. E brinca: "Os clientes de Lisboa gostam do prato mais cheio." Se no Verão ainda frequentam o Vila Joya alguns portugueses que estão de férias no Algarve, no Inverno é raro aparecerem clientes nacionais. Koschina gesticula para se explicar melhor: "Agosto e Setembro, completamente cheio. Depois tudo já foi embora. Inverno é chuva, é tempo de fado." E de clientes estrangeiros, muitos deles habituais.

"Sabemos que há muita gente [em Portugal] que conhece o Vila Joya mas que nunca lá foi, por isso vemos na mudança para aqui uma oportunidade para lhes oferecer um caminho mais curto para jantarem connosco", acrescenta Gebhard.

O que poderão comer aqui será o mesmo que comeriam no Algarve, ou vai haver alterações? "Não, não, alterações não, é o mesmo", diz Koschina, no seu português com forte sotaque e que acompanha sempre com gestos expressivos. Não é que prefira cozinhar peixe a carne, mas a sua cozinha muda conforme o sítio onde está. "Na Áustria cozinho mais carne. Aqui, Portugal, terra de peixe. Normalmente, uma vez aqui, cozinho peixe." Mantém o seu fornecedor habitual, Pedro Bastos, em quem tem total confiança e, em Sintra, continuará a apostar no peixe.

A ementa que foi criada para as primeiras semanas (até 30 de Dezembro) inclui três pratos ao almoço (lavagante do Atlântico, couve-flor e tapioca; pombo mieral com alcachofra de Jerusalém e avelã; e framboesa, iogurte e amêndoa) e seis ao jantar (para além dos três já referidos, ostra gillardeau, aipo e caviar imperial; salmonete com molho escabeche, verbena e cebolas pérolas; barriga de leitão, chouriço e polvo; e Serra da Estrela, açafrão e pêra). Além disso, há uma série de entradas que Guilherme Quintas preparará diariamente.

Na cozinha estão ainda a austríaca Theresa Gumplmayr, responsável pela secção dos doces - no dia em que visitamos Seteais anda atarefadíssima a preparar doces, e a tentar encaixar tabuleiros no frigorífico - e dois portugueses, Carlos Soares, que se encarrega de todos os acompanhamentos, e João Pinto, o responsável pelos peixes e mariscos. Desta vez as nacionalidades estão em igualdade numérica, dizem, rindo.

Melhor do que o original?

Gebhard está entusiasmado com a experiência - que surgiu na sequência de uma conversa entre um dos membros da equipa do Vila Joya e um responsável dos hotéis Tivoli no âmbito da iniciativa Portugal dos Sabores, que está a decorrer no Brasil, integrada no Ano de Portugal no Brasil. "Uma conversa levou à outra, e agora estamos aqui. A mudança até foi mais fácil do que imaginávamos", confessa. "Esta sala foi talvez, em tempos, uma cozinha, e nós tivemos pouco mais de uma semana para a transformar novamente numa cozinha. Mas acho que o resultado foi muito bom."

Este não é, sublinha, um processo em que um restaurante vai ocupar o lugar de outro. O restaurante do Tivoli Palácio de Seteais vai continuar a funcionar como sempre, e o Vila Joya é uma oferta adicional. Até as salas de refeição serão diferentes. O restaurante do hotel mantém a sua sala habitual, e a equipa de Koschina ocupará a Sala D. João VI (situada à esquerda de quem entra no palácio, e com capacidade para, no máximo, 20 pessoas), onde serão servidas as refeições, e a Sala Pillement, decorada com frescos do pintor francês Jean Baptiste Pillement, onde serão servidos os aperitivos.

Será um trabalho de colaboração e parceria. Embora o Vila Joya tenha deslocado para Seteais uma parte do seu staff, este vai funcionar com o apoio da equipa do Tivoli, que irá também aproveitar a oportunidade para trabalhar com um restaurante com o nível de duas estrelas Michelin. Quanto a Koschina, estará presente no primeiro fim-de-semana, mas depois terá que viajar novamente para participar em eventos no estrangeiro, que, diz, "são sempre bons para ganhar clientes para o Vila Joya".

Mas isso não é um problema, garante Gebhart. Os sub-chefs Matteo Ferrantino, que também não está em Sintra, e Stephan Langmann "são efectivamente quem comanda o espectáculo onde quer que seja", enquanto Koschina "faz o controlo final, e trabalha em novas ideias e criações". O trabalho de cozinha "é feito pela equipa, que se limita a afinar o que foi pensado por Koschina". Stephan já trabalha com o Vila Joya há bastante tempo, esteve um período fora, e regressou há cerca de três anos.

Koschina entra na cozinha e cumprimenta a equipa, falando com Stephan em alemão. O sub-chef está imparável, a organizar tudo, e preocupado com o que ainda é preciso comprar. "Temos que ir ao mercado, temos que ir já", alerta, dirigindo-se a Guilherme Quintas. A actividade é tanta na pequena cozinha que, à primeira vista, diríamos que já estão clientes sentados na sala de jantar. Engano - isso só iria acontecer dois dias mais tarde. Mas uma equipa com duas estrelas Michelin sabe que, por essa altura, tudo tem que estar mais do que pronto e nada poderá falhar.

"Consideramos que a um certo nível a experiência pode até ser melhor aqui do que no Algarve", diz Gebhard. Porquê? "Porque aqui teremos uma quantidade limitada de pessoas. Enquanto lá em baixo temos 45 a 50 pessoas todos os dias, e é uma operação com pequeno-almoço, almoço e jantar, aqui temos apenas 20". Sorri: "Tendo metade das pessoas, pode ser que o Vila Joya em Sintra seja melhor do que o original."

Vila Joya no Tivoli Palácio de Seteais

Tivoli Palácio de Seteais

Rua Barbosa du Bocage, 8

2710-517 Sintra

Tel.: 219 233 200

Email: vilajoya@tivolihotels.com

De 13 de Dezembro de 2012 a 14 de Fevereiro de 2013

Quinta-feira a domingo

Almoço - 3 pratos, 95 euros (sem bebidas incluídas)

Jantar - 6 pratos, 165 euros (sem bebidas incluídas)

É necessário fazer reserva (máximo 20 pessoas)

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