Vendaval de dois dias chegou para assorear uma barra que custou 980 mil euros

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Mar abriu barra que foi fechada por colocar em risco espaço urbano Melanie Map"s

Tal como os pescadores previram, a nova barra na Fuzeta, em Faro, durou muito pouco. Barcos já só entram um de cada vez e apenas na maré cheia

A barra da Fuzeta, em Faro, fechou assim que abriu. Tal como avisaram os pescadores, dois dias depois de a presidente da Sociedade Polis da Ria Formosa, Valentina Calixto, visitar a obra, no primeiro vendaval formou-se uma língua de areia com cerca de 50 metros. Resultado: os barcos só conseguem entrar no porto um de cada vez e com a maré cheia.

"Nem que se pintem de cor-de-rosa às risquinhas. O mar vai voltar a romper onde fecharam a barra, no Verão passado", advertiu Manuel Simões, manifestando-se contra a obra da Sociedade Polis da Ria da Formosa e da Administração da Região Hidrográfica (ARH). A tirar e pôr areias já foram gastos cerca de um milhão de euros, e vão ser investidos mais 750 mil.

No último Inverno, caíram 38 casas com os temporais. Depois disso, decidiu-se fechar uma barra a poente e abrir uma outra a nascente. Valentina Calixto justificou a intervenção com base em estudos do Laboratório Nacional de Engenharia Civil e da Universidade do Algarve e ARH.

Pescadores pedem paredões

Só que o primeiro vendaval, há uma semana, mostrou que o investimento foi "dinheiro deitado ao mar". Os homens do mar reivindicam a construção de paredões para suster as areias, mas Valentina Calixto recusa a proposta. "Do ponto de vista técnico é desaconselhável, do ponto de vista legal não é possível", afirma. Há três dias, uma equipa de técnicos visitou o local, com a maré cheia. "Deviam vir ver o lindo trabalho que fizeram, mas era com a maré vazia", reclamou Fernando Bartolomeu, enquanto tirava salmonetes do barco, acabado de chegar do mar. "Se não for feito uma paredão, não vale a pena gastar dinheiro", insiste. Manuel Simões entende que a barra "deve ser aberta onde o mar rompeu em 2009 [do lado poente]". A sociedade Polis mandou fechar o canal porque essa alteração morfológica "criou fragilidades na zona frontal ao espaço urbano da Fuzeta". O pescador Manuel Simões contrapõe: "Não é por acaso que as instalações do Salva-Vidas foram construídas em frente desse local - é porque ali é que é a barra natural."

Valentina Calixto justificou o assoreamento verificado com facto de essa barrar ter "entrado em concorrência com a outra barra antiga, situada mais a nascente, e ocorreu uma situação de vasos comunicantes". Para repor o equilíbrio, adiantou, foi "adjudicado o fecho dessa barra antiga". O custo da obra, incluindo o reforço do cordão dunar, é de 750 mil euros.

"Branquear decisões"

O assoreamento do canal, acrescentou, "era um cenário previsível, dado que a barra necessita de um certo período para evoluir".

João Romeira é um dos quatro elementos da comissão de pescadores, criada para ser o interlocutor da ARH nesta questão conflituosa com os pescadores. Na passada sexta-feira, quando viu chegar os técnicos que iam observar a evolução da barra, recentemente aberta, desabafou: "Só servimos para branquear a decisão tomada pelos engenheiros." O colega de comissão, Tibério Estrela, foi mais longe nas críticas. "Jogos de interesses - gastaram 980 mil euros a fechar uma barra e a abrir outra", disse. No temporal que se avizinha, prevê: "A barra fecha, de nada serve o dinheiro gasto."

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