Os portugueses já têm corpo e os criadores encontraram-no

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Há quase vinte anos, o sociólogo e crítico de arte Alexandre Melo escrevia: "os portugueses não têm corpo". Falava da forma como os portugueses "não reflectiam" sobre o corpo e sobre a sexualidade. O Ípsilon foi, hoje, à procura desse corpo omisso. E encontrou-o. Falou com artistas plásticos, músicos, performers, actores, bailarinos, cineastas, escritores. É andrógino, é ambíguo. Hoje há homens e mulheres de outra maneira.

O corpo de Portugal mudou. Tornou-se mais andrógino, mais ambíguo. É nesse estado de incertezas que os artistas contemporâneos portugueses exploram o corpo como instrumento e veículo de identidade. Identidade de género, identidade sexual. O que é o masculino, o que é feminino. O corpo é "o espaço onde tudo se altera", explica António Fernando Cascais, professor na Universidade Nova.

Em 1993, Alexandre Melo, sociólogo e crítico de arte, escreveu: "os portugueses não têm corpo". Quase vinte anos depois assiste-se a uma mudança de paradigma. Hoje há, em Portugal, identidades questionadas, sexualidades expostas, e subversões de géneros em palco, diante da câmara, em romances, e na tela. Como diz Cascais: hoje "há homens e mulheres de outra maneira". E tudo isso se faz através de uma nova linguagem, porque, "ela não existia". Só a partir do final dos 90 é que passou a existir. Eis a verdadeira mudança.

Rupturas em palco

O palco é um dos espaços primordiais da emergência do corpo. Há uma "transgressão sexual" no teatro, porque o "palco é um contexto para se questionarem as coisas, mas um contexto seguro, e que não implica necessariamente o eu social do actor", diz Francesca Rayner, professora na Universidade do Minho.

Rayner explica que "a partir dos anos 90 houve uma maior atenção sobre questões de género e de sexualidade no teatro e na performance" em Portugal. A sua tese de doutoramento, de 2006, explica que esse questionamento se verifica, por exemplo, através da inversão de papéis normalmente escritos para homens mas interpretados por mulheres. E houve uma ruptura de paradigma em relação ao papel do texto. Este "deixou de ser central, e podem explorar-se outras maneiras de contar": elementos técnicos como a luz, e sobretudo "a exploração do movimento, da dança e do corpo" surgem centrais em palco.

Mónica Guerreiro, doutoranda em dança contemporânea portuguesa, corrobora. Com exemplos: a peça "Antonio Miguel" (2000), de Miguel Pereira, foi "um marco", uma "bandeira ao homoerotismo na dança". Até então, o erotismo era heterossexual e estava associado à mulher: a peça de Pereira foi "singularmente importante porque trouxe imagens que não tínhamos". Outros exemplos: Francisco Camacho, Olga Roriz...

Guerreiro é biógrafa de Roriz e está a realizar um doutoramento sobre a possibilidade de uma leitura "queer" nas composições coreográficas em Portugal. Explica que Roriz "propõe claramente uma indistinção das performatividades de género que questionam noções de conformidade com a heterossexualidade, com o modelo patriarcal, e o predomínio do masculino". São rupturas óbvias nos seus espectáculos. Assim, "o homem pode ser elevado pela bailarina mulher e isso propõe uma subversão do cânone da dança". E os pares não têm de ser heterossexuais: "Podemos assistir a pares constituídos por dois homens ou por duas mulheres", explica.

Esta leitura "queer" da dança sublinha a ruptura com a heteronormatividade. "É dizer não ao binarismo, é dizer não à remissão directa a um género. Os géneros são mais do que os sexos. O sexo é biológico, o género, não", diz Guerreiro.

Cascais afirma que antes "os portugueses não conheciam uma linguagem para exprimir o corpo e a sexualidade." Simultaneamente, na academia nos anos 90, "começou-se a disseminar uma linguagem que permite falar da sexualidade de forma erudita, e elaborada, sem as categorias tradicionais que vêm da linguagem popular, da medicina".

Passam a existir instrumentos que permitem separar a sexualidade, enquanto intimidade, da sua representação artística. "As obras de arte não se referem a uma biografia dos autores, mas àquilo que o autor faz com a sua biografia. É uma vida tornada obra, que não tem a ver com o privado. Não é uma questão biográfica, mas de construção social e artística. Isto foi difícil de perceber para a teoria e crítica literária e de arte em Portugal."

Surge, então, o "queer". O antropólogo Miguel Vale de Almeida explica que o termo "nasceu de um gesto de apropriação daquilo que era um insulto e que foi transformado em algo positivo". Partiu "de um universo gay, mas expandiu-se e ganhou outro sentido: o da teoria 'queer', que surgiu nos estudos de género e de sexualidade". Hoje o "queer" é uma "atitude" que pretende ultrapassar o "binarismo de género e a ideia de uma identidade de género e sexual sólidas". E também uma teoria "que ajuda a questionar a validade das categorias binárias".

Ser homem (e) mulher

Para Miguel Pereira, 46 anos, bailarino e performer, a liberdade do corpo permite-lhe pôr em causa categorias. O corpo trabalha a ambiguidade e isso é um "estímulo criativo". O objectivo é "tentar perceber o que não é claro", diz. Interessa-lhe "trabalhar o olhar sobre as convenções, os códigos sociais, políticos e culturais, questionando sempre os limites, a identidade de um corpo, o que é o masculino e o que é o feminino".

O corpo é o instrumento de Pereira. "Nunca trabalhei directamente com a sexualidade, mas ela está lá porque faz parte de um interior que se revela. A sexualidade é uma tempestade interior que tem a ver com o desconhecido que revelamos através do instinto, do selvagem e do animal que está dentro de nós e se confronta com a questão do binómio, da natureza, da cultura." Isto está em "Antonio Miguel".

Na dança, explica Mónica Guerreiro, há uma possibilidade maior de exploração da ambiguidade e de ruptura com o "primarismo binário, que é redutor." Pereira propõe essa ruptura: "Eu não sou só homem, também posso ser mulher. Essa ambiguidade revela-se em todo o meu trabalho", explica.

Não é só em palco que o binarismo é questionado. Raquel Freire, 39 anos, cineasta, também o convoca, procurando "uma ruptura com a normatividade" e, através da câmara, um olhar que apresente uma subversão da imagem típica da feminilidade: "O primeiro plano que filmei é uma mulher grávida de nove meses, nua, de lábios vermelhos, a dançar de forma sensual e sexual. Isto choca porque, durante séculos, as mulheres ou eram Virgem Maria ou Maria Madalena."

Vasco Araújo, 34 anos, artista plástico, rompe com o binarismo, também na língua, como quando fala em "vestir-se de mulher" em "Diva" (2000): "Essa expressão tem uma carga simbólica grande, de género e sexual. Quando me vesti de mulher não era um travesti, era um encarnar numa personagem feminina. Nós somos mais do que um, nessa construção pessoana do ser." No grande teatro do mundo, "tudo é uma encenação para podermos viver neste colectivo". Então, podemos ser "várias personagens, vamos construindo o nosso género e a nossa sexualidade", diz.

A literatura usa explicitamente estes desdobramentos, num jogo entre o autor (a sua biografia e o seu género) e as personagens. Dulce Maria Cardoso, 45 anos, escritora, afirma que a "escrita serve bem a ideia da sexualidade por causa das fantasias e das nossas pulsões corpóreas." Escrever não é mais do que uma possibilidade de desdobramento. "As fantasias sexuais são experiências que nunca são cumpridas. Ao criar personagens estás a fantasiar que tens aquela vida. Estamos a criar 'realidades' não-corpóreas."

valter hugo mãe, 39 anos, abre as pulsões a infinitas possibilidades: "A maneira de ver o mundo é condicionada pelo sexo, mas estou convencido de que escrever ficção tem que ver com essa capacidade de imaginar o que não somos. O livro poderá passar, inclusive, muito longe do que são as nossas sensibilidades, experiências ou atenuantes sexuais", explica.

Poeta e ficcionista, joga com os dois géneros (literários) para poder revelar e esconder onde se encontra o valter verdadeiro: "A minha poesia caminha para a confessionalidade, parece vir ao encontro da minha vida. Entre amores e amizades, tornou-se sensibilizada pelas minhas pulsões afectivas. É um qualquer diário que as pessoas podem coscuvilhar." A prosa, pelo contrário, é verdadeiramente ficção: "É muito mais sub-reptícia. A ficção é a capacidade de desdobramento."

Há quem se abra para além do binarismo de género (homem e mulher) ponto em causa a heteronormatividade (o hetero e o homo). É isso que Vasco Araújo quer dizer: "Não amamos géneros, amamos pessoas." No caso de Raquel Freire, isso é a pan-sexualidade: "Ser pansexual começou como posição ideológica, e tornou-se uma praxis. Sou intimamente contra o binarismo de género, porque nos impede de nos vermos uns aos outros como pessoas."

São as pessoas que lhe interessam. Isso reflecte-se no olhar da câmara: "Gosto de filmar as pessoas nos olhos, olhos nos olhos, porque é uma posição de igual entre mim e a personagem. Essa igualdade gera sensualidade." Isso está em "Rasganço", mas também no próximo filme, "As Leis do Corpo", sobre um casal homossexual ao qual se junta uma mulher. "A criação artística passa por criar um mundo como eu gostava que ele fosse."

A dissolução do binarismo de género transforma a noção de família. Primeiro inconscientemente, depois como afirmação de identidade, a família (ou a sua desconstrução) é o centro do trabalho do performer Miguel Bonneville, 25 anos. Pais, mães, papéis masculinos e femininos povoam o seu trabalho. Na primeira performance, era despido pelo público e, depois, aparecia travestido numa figura de mulher: "Peito com pelos, soutien e mamas falsas. Essa transformação era assustadora." Um monstro temido, porque é o desconhecido: "Esse monstro que as pessoas viam em mim é a mulher quando se afirma e quando não está a ser submissa. A minha mulher-monstro não é feminina. Não é uma mulher, porque eu sou um homem. E, ao mesmo tempo, posso ser uma mulher."

Miguel Loureiro, 39 anos, actor, diz que a função do teatro é questionar o modelo "boy meets girl" e a tradição. "Há uma tentativa de padronizar os actores. Isso é profundamente errado. Os modelos de ensino no teatro e no cinema devem ser espaços de aceitação das quebras da heteronormatividade." É a noção de tradição que estes criadores querem subverter. "Nenhuma palavra é tão violenta como esta: tradição. sempre que me falam nisso pergunto-me: quantos medos são necessários para criá-la? E para mantê-la?", pergunta Freire.

Machos em crise

A partir do momento em que o binarismo cai, uma série de dúvidas sobre masculinidade e família se levantam. E o corpo é "a matéria-prima das alterações da identidade masculina", explica Cascais. Socialmente, "o corpo masculino é cada vez mais objecto público erótico e de desejo." Ao produzir-se enquanto tal, "o homem está a alterar a sua relação com a mulher mas também com outros homens. Assume a sua passividade. Isso reflecte-se na nova masculinidade, que tem a ver com a alteração da relação dos homens com as mulheres e da relação consigo próprio."

Loureiro diz que não se identifica com a noção tradicional de masculinidade. Assume a homossexualidade como "o chão" onde se move, mas não é sua política fazer da orientação sexual um "discurso de afirmação". Nesse sentido, diz, "sou pós-gender". Sente não pertencer "à masculinidade vigente": "Tenho uma relação de alteridade em relação a essa masculinidade. Não tenho nada a ver como feminino. E sempre me senti um passo ao lado do masculino que me foi dado como modelo, como se caminhássemos em paralelo."

Esse é também o "chão" do artista plástico João Pedro Vale, 33 anos. Contudo, mais do que questionar o género, o objectivo é desconstruir um imaginário colectivo, cânones e conceitos que fazem parte de nós enquanto seres culturais e sociais. "A sexualidade é importante, a minha orientação sexual, não. A sexualidade é tão importante como ser português e não ser espanhol, é a minha cultura. É isso que me interessa", explica. O filme porno "Hero, Captain and Stranger" e a exposição "Moby Dick" têm esse objectivo: ambos partem da leitura de estudos "queer" sobre a obra de Herman Melville. Isto mostra que o livro "na realidade, não é gay, é outra coisa: é sobre a relação entre pessoas que têm de conviver durante anos no mesmo espaço. Desenvolvem-se relações impossíveis de categorizar. É como nas prisões, é uma contingência homossocial", explica.

Miguel Bonneville e Vasco Araújo, por exemplo, dizem-se feministas. Bonneville: "Sou feminista e não me sinto diminuído por isso. Sinto que estou a pôr em causa o outro macho, só por existir, só por não representar um papel dominador, e de procurar um equilíbrio dentro da possibilidade."

Por isso, Carla Cruz, 32 anos, artista plástica, acredita que o feminismo de hoje não é o dos anos 70. A palavra "feminista"' perdeu a sua ligação ao género: "É uma metolodogia, uma forma de questionar." Em trabalhos como "Transvestite/feminine - women go out in disguise" (2002) ou "The Inauthentic Male" (2003), Cruz questionava noções de feminilidade e de masculinidade, para confrontar modelos transmitidos "pelos media, pelas convenções, pela moral". Para Cruz, faltam modelos sociais que "se apresentem fora das categorias normativas", personagens públicas "que assumam uma ambiguidade".

Carla "Suspiria Franklin" Branco, 31 anos, é há mais de dez anos vocalista dos Baton Rouge, mas, há quase vinte, mulher no rock, um mundo de homens. Em 1994, quando tinha 15 anos e liderava a única banda feminina do país sentia-se "um alien". Chamavam-se Eva Braun e tocavam punk rock. "As pessoas iam ver-nos não por causa da música, mas porque éramos uma banda de raparigas." A verdade, diz, é que a diferença no rock entre homens e mulheres "é gritante relativamente a outras áreas". Não encontra explicação, mas fala de "falta de confiança das mulheres na exteriorização. "Muitas ainda me dizem: 'Não teria coragem de me expor assim'." Novamente, há falta de modelos: "Como há poucas mulheres no rock, há poucas referências. As pessoas têm tendência para se tornarem umas iguais às outras, têm medo de sobressair."

O alter-ego "Suspiria Franklin" (Suspiria vem do filme de Dario Argento; Franklin vem de Aretha) é "o eu que precisa de se expressar artisticamente". Em palco, descreve, passa-se a "outro estado mental que transcende o corpo real", para fugir dessa "normalidade monótona e quotidiana". O corpo em palco é "isento de sexo, é o corpo em si, para além do género". O seu universo, contudo, "é muito feminino e encaixo-me muito bem nele, mesmo que o rock seja tradicionalmente viril".

A ideia de que o rock é viril é "idiota e machista", afirma Paulo Furtado, aka Legendary Tigerman. É uma questão de igualdade. O seu último álbum, "Femina", parte desses pressupostos. Primeiro: "Já que não posso falar por uma mulher, vou trazê-la para o álbum, para que ela própria possa falar por si." Dar voz aos que não têm voz. Segundo: "No meu universo, durante anos, projectei a imagem de uma mulher. Aqui decidi passar a mulher para dentro, para haver uma primeira pessoa e não uma imagem projectada." Terceiro, a mulher enquanto objecto de desejo: "Para mim, o desejo tem claramente género. Mas nem tudo tem a ver com um desejo claro e concreto. Há uma tensão no ar em todo o álbum que se estabelece pelo simples facto de eu ser homem e elas serem mulheres. Porque sou heterosexual. Isto não poderia existir desta maneira se eu gravasse um álbum só com homens."

A mulher é, para Tigerman, "o elemento catalisador" e em "Femina" estamos "numa relação de igual para igual", em diálogos e cumplicidades, neste caso, através dos duetos com Maria de Medeiros, Asia Argento, ou Rita Redshoes.

O dueto revela a outra voz, e essa revelação serve a satisfação da "curiosidade natural" sobre o lado delas, uma curiosidade que tem a ver com "perceber a diferença, perceber o que estão a pensar, a querer, coisas que não são claras para mim". Chegar à essência do feminino? Carla Cruz responde a Tigerman: "Não sei bem se há uma essência feminina. Se calhar há coisas que podem ser ditas femininas, mas que têm de ser postas na linha da frente para serem discutidas."

É isso que faz Tigerman: pôr-se na linha da frente, a nu, como na capa de "Femina". "A minha ideia era a de um homem a tentar abarcar a mulher mantendo a minha masculinidade e heterosexualidade. Abarcar um sentir no feminino", explica. Isso teria de ser dado trabalhando a "posição do cigarro, do olhar que aliados à maquilhagem conseguissem manter essa masculinidade, ao mesmo tempo, piscando os olhos a um lado mais feminino". Esse piscar de olhos é notório: só um olho tem rímel, o outro é o olho masculino de Tigerman.

Diante desta imagem, não se pode deixar de colocar a questão: isto é "queer"? A androginia de Tigerman abre o conceito de "queer" para um espaço longe da dicotomia homem/mulher. Surge um corpo ambíguo, que abole as categorias de género: onde está o homem? No corpo nu de Tigerman? E a mulher? Na maquilhagem? O músico responde: "Se suscita essa ideia de androginia, sim, e discussão sobre ela. Mas 'queer', não. Não concordo."

Comunidade de múltiplos

O corpo responde melhor às categorias do que as palavras. Tigerman nu, na capa, explica muito sobre esse corpo potencialmente andrógino do artista. Responde que "se a roupa não tem uma função, se não esta lá a dizer nada, é porque não é importante. Uma roupa não diria nada que, neste caso, a minha pele não diria melhor."

Exactamente: uma questão de pele. O actor e encenador André Teodósio, 32 anos, admite que o nu lhe permite multiplicações que o corpo vestido não tem, dominado pelas contingências: "Em palco, eu estou muito mais presente. Os meus tiques, a maneira como ando, como faço amor, como atraio, com sou: tudo isto está muito mais lá quando estou vestido do que quando estou nu."

Miguel Pereira concorda: "Ao usar o nu, posso cair no estereótipo do erótico. Mas interessa-me saber que estou a produzir esse estereótipo." Primeiro há a exposição do corpo nu: "Tem de haver esse embate, até porque as pessoas têm as suas referências." É uma relação de desejo que se estabelece com o público: "Quando nos expomos, cria-se uma certa forma de desejo, recíproco até, com a audiência. Porque queremos, no fundo, ser amados." À medida que a peça avança, o corpo "esvazia-se", os estereótipos "eliminam-se pela persistência, e o corpo nu torna-se banal, perde as conotações." Deixa de causar impacto. "Passa a instrumento, a veículo de informação e esvazia-se da sua condição social."

O objectivo de Pereira é "ficar nas entrelinhas, na pura expressão do corpo, nas suas falhas, nos seus não-ditos." Cá está a ambiguidade. O questionar das categorias é um jogo constante com o "qualquer coisa de intermédio" de Sá-Carneiro: "Homem e mulher, preto e branco: jogo muito com o que está entre um e outro. É nessa ambiguidade que está o meu trabalho criativo", diz.

Vasco Araújo quer poder dizer "hoje sou isto, amanhã sou outro", e viver nessa possibilidade múltipla.

No fundo, "o corpo somos sempre nós, é sempre o nosso corpo que lá está, mas está lá com tudo", diz Teodósio. Com as contingências sociais, culturais, nesse eterno desdobramento de eus, na construção de uma comunidade. Teodósio: "É já outro corpo que é afirmado. É a lógica perversa da arte de quebrar a pergunta colocando uma nova. O objectivo é continuar a criar um organismo vivo. Daqui a uns anos seremos todos uma comunidade de múltiplos."

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