Primeiro transplante hepático em criança foi há 15 anos

a Faz precisamente hoje 15 anos que Alexandre Linhares Furtado realizou o primeiro transplante hepático numa criança, em Portugal. A operação decorreu nos Hospitais da Universidade de Coimbra, único sítio do país onde ainda hoje se faz a "delicada" cirurgia. Desde então foram feitas cerca de 150 transplantes. Já reformado, o médico ainda recorda o dia 15 de Janeiro de 1994 com nitidez, embora mostre alguma relutância em considerá-lo um momento histórico. "Nem sequer foi um dia, foi uma noite", diz, a rir.A história é muito simples, para es-
te médico que, nessa noite, operou uma criança que tinha vindo da Alemanha e estava internada no Hospital de São João, no Porto. "Começou a adoecer gravemente na Alemanha e os pais decidiram vir para Portugal, embora já com a indicação quase segura de que poderia vir a precisar de um transplante hepático. A criança foi internada no Hospital de São João e, numa ida lá por razões académicas, pediram-me para a ver e eu comprometi-me a transplantá-la", recorda.
Assim foi. A criança de oito anos, que foi operada de urgência, tem hoje 23 anos e "continua bem". Linhares Furtado nunca teve dúvidas de que a equipa que liderava seria capaz. "O problema na altura foi decidir se era necessário ou não, porque foi um processo que caminhava para a insuficiência hepática total, ou seja, para a morte da criança", nota o antigo professor, cirurgião e urologista.
O processo já tinha sido iniciado na Alemanha e os médicos estrangeiros já tinham "posto a hipótese de transplantar". "A questão era o momento exacto em que não se deveria esperar mais e isso veio a acontecer não lá, mas cá. Recebeu um fígado de cadáver. Foi também a primeira vez que se transplantou apenas parte de um fígado", recorda Linhares Furtado que está a escrever um livro sobre a transplantação de órgãos em Coimbra. As receitas desta obra deverão reverter, em parte, para a Hepaturix - Associação Nacional das Crianças e Jovens Transplantados ou com Doenças Hepáticas que promove esta noite um concerto com a Orquestra Clássica do Centro, em Coimbra, para assinalar a data.
Dulce Pitarma, da Hepaturix, explica que o objectivo da associação é "apoiar as crianças e jovens" que se deslocam de "todo o país" para serem operadas em Coimbra, "o que traz algumas problemáticas sociais a nível de alojamento" da família, entre outras. Se nos Hospitais da Universidade, onde a cirurgia é realizada, as crianças ficam "no máximo 48 horas", no Hospital Pediátrico de Coimbra podem chegar a estar, durante o pré e pós-transplante, até quatro meses afastadas de casa, explica Dulce Pitarma. Passados 15 anos, a realidade nos transplantes hepáticos pediátricos não mudou muito e, segundo Linhares Furtado, o facto de continuar a ser apenas em Coimbra que se fazem estas operações deve-se ao número de casos existentes em crianças, que varia entre os 10 e os 12 por ano, e que não justifica que outros hospitais o façam: "Até para que um sítio adquira uma experiência razoável, entendeu--se que seria melhor assim", explica o médico, pai de Emanuel Linhares Furtado, actualmente o responsável pelas operações e também o primeiro a realizar a primeira colheita de fígado num dador vivo em Portugal.

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