Mais de 1,3 milhões de pessoas não estão inscritas no Serviço Nacional de Saúde

Estima-se que, no final da limpeza de ficheiros, seja possível dar médico de família
a mais 300 mil portugueses. Mas processo pode originar falhas e reclamações

a A limpeza de ficheiros dos centros de saúde, com a retirada de óbitos e duplicações, começa finalmente a dar resultados: os últimos dados apontam para um total de entre 8,7 a 8,8 milhões de utentes inscritos, o que significa que haverá entre 1,3 a 1,4 milhões de residentes no continente sem cartão e que não recorrem ao Serviço Nacional de Saúde (SNS). Este número ainda não é definitivo mas já representa um grande avanço, admite o secretário de Estado adjunto e da Saúde, Francisco Ramos. Até porque se estima que permitirá em breve dar médico de família a cerca de 300 mil pessoas, afirma o presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e Vale do Tejo, António Branco. Actualmente calcula-se que mais de 600 mil pessoas não têm médico assistente nos centros de saúde, um problema que se faz sentir sobretudo nas periferias das grandes cidades.
Depois de várias tentativas goradas de apuramento do número real de inscritos no SNS - os cartões emitidos chegaram há alguns anos a suplantar em mais de um milhão a população residente -, a concentração das bases de dados dos perto de 400 centros de saúde do país, associada ao cruzamento com os registos de óbitos do Ministério da Justiça, permitiu chegar a esta conclusão algo surpreendente - a de que há um número significativo de portugueses que não usa o SNS. "A maior surpresa é esta: porque é que há tanta gente sem cartão de utente?", comenta Pimenta Marinho, da ARS do Norte. Uma parte substancial será constituída pelas pessoas que dispõem de subsistemas de saúde, como a ADSE, SAMS, etc.
Só com o cruzamento com a base de dados do Ministério da Justiça foi possível perceber que cerca de 700 mil inscritos tinham morrido, adianta António Branco. E o trabalho de identificação com um algoritmo informático que corre os ficheiros para verificação de duplicações permitiu detectar muitas repetições. "Havia um cidadão com 14 registos no Sinus [o sistema informático dos centros de saúde]", exemplifica.

Testes no Alentejo e Algarve
Para se ter uma ideia da dimensão deste fenómeno basta dizer que, apenas em Lisboa, há 700 mil inscritos, quando a últimativa estimativa do Instituto Nacional de Estatística aponta para um total de 501 mil residentes na cidade. Francisco Ramos alude também à situação do Algarve, onde havia muitas duplicações devido às inscrições de cidadãos durante as férias.
As ARS estão agora a tentar fazer projecções e tudo indica que o problema da falta de médicos de família poderá ser resolvido em parte com a reafectação dos recursos - a limpeza de ficheiros permitirá redistribuir as listas de utentes dos clínicos que, por norma, não ultrapassam as 1500 inscrições. E será possível nos casos em que esta falta é apenas técnica, não real, diz Branco.
Depois da contabilidade dos óbitos e duplicações estar mais ou menos estabilizada, foi decidido avançar com testes para a eliminação de repetições nas regiões do Alentejo e do Algarve, testes esses que terminaram na semana passada. No futuro, o sistema, ao encontrar duplicações, vai escolher apenas um dos locais de inscrição. Mas o processo vai ter falhas e vai originar reclamações, apesar dos serviços estarem instruídos para dar resposta imediata nesses casos, prevê o responsável da ARS. "Este rastreio será feito com critérios (por exemplo, escolhendo o local da última consulta), mas existe a possibilidade de a pessoa ser cortada no sítio errado. Vai haver algum ruído mas os benefícios são incomparavelmente maiores", nota, frisando que não havia outra forma de fazer isto. Há uns anos, tentou-se limpar os ficheiros, escrevendo para os utentes e chamando-os aos centros de saúde, mas isso não resultou.
O cartão de utente do SNS foi criado em 1995.

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