O bolerista e os soneros

Vitorino, o bolerista, e os soneros Septeto Habanero voltam a apresentar-se juntos e ao vivo em Portugal, retomando uma colaboração encetada em disco com o álbum "La Habana 99". Boleros para fazer dançar Portugal até ao final de Agosto.

O bolero, uma das danças típicas e mais românticas da música tradicional cubana, há muito que anda a bailar na cabeça do cantor alentejano Vitorino. Um amor antigo, moldado em recordações de infância, filtradas "através do travesseiro duma cama de ferro", em casa do avô Salomé, onde, no rés-do-chão transformado em sala de ensaios, mesmo por baixo do seu quarto, uma pequena orquestra da família "executava com enorme prazer e divertimento as grandes canções clássicas dos anos 40/50 americanas, assim como os velhos boleros, mambos e tchás". "A minha avó mandava-me cedo para a cama e eu adormecia num delicioso sono de acordes longínquos e que a distância e a espessura das paredes adoçava e transformava em música de anjos brincalhões e heróis, que me enchiam a imaginação e os sentidos", recorda o autor de "Flor de la Mar" na folha de apresentação do álbum "La Habana 99", gravado no ano passado em Havana, com o Septeto Habanero, formações mítica da música cubana. Com a gravação deste disco ficava concretizada metade desse sonho. A segunda cumprir-se-á finalmente através de uma série de espectáculos que hoje, amanhã e na quarta-feira têm lugar no Teatro Tivoli, em Lisboa, prosseguindo ainda este mês em Vila Nova de Famalicão (dia 7), Braga (dia 8) e, já em Agosto, Portimão (14), Açores (18), Porto (19) e Viseu (26). Para trás ficam as más recordações da estreia ao vivo do cantor alentejano com o grupo cubano, no ano passado, no Parque das Nações, ao ar livre de uma noite gelada de Fevereiro, onde faltou clima e público a uma música toda ela apaixonada pelos perfumes e danças dos trópicos. "Entrava-nos a nortada pela boca adentro", recorda Vitorino ao PÚBLICO. Entre esse Inverno e este Verão, gravaram no ano passado em Havana o álbum "La Habana 99" que com as suas 30.000 unidades já vendidas em Portugal se prepara para ser disco de platina.Desta feita, "com condições ideais" e num "sala lindíssima", tudo se conjuga para uma noite que permitirá reviver os sons e as imagens da época dourada, os anos 40 e 50, das danças de salão. Vitorino é o cantor convidado do Septeto, após se ter oferecido como "voluntário". "Eles procuravam um cantor para cantar com eles em Portugal e eu disse logo: Sou eu!". Vitorino enviou-lhes alguns discos seus, os cubanos ouviram, gostaram, e escolheram as canções. "Sou como um vocalista à boa maneira dos anos 20" explica, com orgulho e visível satisfação, o cantor alentejano que em breve lançará com o seu irmão Janita Salomé um álbum ao vivo de canções menos conhecidas de José Afonso.Quando subir esta noite ao palco do Tivoli, Vitorino representará com gosto a mesma personagem dessa época que teima em persistir em Cuba que encarna na capa de "La Habana 99", a do cantor romântico, estrela de Santiago de Cuba e de Hollywood. Do cantor de boleros, "porque o bolero é branco, o que tem a pele mais clara, enquanto o 'son' já é mulato", diz, assumindo-se como europeu. "Eles [o Septeto Habanero] avaliaram com muita acuidade as minhas características e acharam que eu era bolerista. Sonero creio que não sou", confessa. "Soneros são eles, eu sou bolerista". E pormenoriza, dando mostras do conhecimento profundo que tem desta música presente no seu imaginário desde criança: "O que eles fazem é o bolero-son, não é o bolero-filin, um bolero muito declamado, próximo do fado".Fazem parte desta lenda viva da música de Cuba, que Vitorino honrará com todo o seu saber e experiência de grande cantor do Sul, o veterano Pedro Ibañez (voz, guitarra e líder do grupo), Emílio (voz e guijo), Digno (voz e clave), Joselito (voz e maracas), Chino (trompete), Faustino (baixo9, Ferro (bongo) e Felipe (guitarra).

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