Avilez, Avilez, quem és tu?

A Assembleia da República aprovou um voto de protesto pela "inabilidade" do ministro da Cultura em lidar com a situação do TNDM (Teatro Nacional D. Maria II), com os votos de todos os partidos da oposição. O PS, em que "boys" e "girls" movem contra Manuel Maria Carrilho uma campanha pelas piores razões, as de ocupação de "jobs" no aparelho de estado, votou contra o protesto, mas nas suas fileiras ninguém sequer citou o nome do ministro. Quanto às oposições, ao avançarem com o voto por o ministro e a direção do teatro terem "emitido posições públicas em que, utilizando o nome de Ruy de Carvalho, tentaram desvalorizar as pretensões dos trabalhadores daquela instituição", não tiveram discernimento suficiente para apontar a "inabilidade" de fundo de Carrilho, a saber, a sua hesitação de política para o Dona Maria e o jogo ambíguo com a direção daquele.Desde a sua reabertura, em 1977, o TNDM tem sido um monstro de escassa produtividade cultural. Pense-se o que se pensar de Carlos Avilez, como pessoa e encenador, ele foi o primeiro director que pôs o teatro a funcionar e mostrou disponibilidade para co-produzir sistematicamente projectos e companhias independentes. Em 1998, pela primeira vez, o TNDM apresentou uma programação anual. Nesta circunstância, o ministro Carrilho não tinha margem de manobra para substituir o diretor - a menos que o próprio apresentasse a demissão, o que não fez. O governo aprovou em 17/7/97 uma nova lei orgânica para o teatro, transformando-o em empresa pública com autonomia financeira e administrativa e, em Maio de 1998, baseando-se nomeadamente no insistente pedido de Avilez de um gestor que o assessorasse, Carrilho nomeou dois subdirectores, Antonino Solmer (subdirector técnico de de produção) e Celso Maurício (àrea financeira). Invocando a "pesada herança" e uma dívida de 200.OOO contos, Carrilho ordenou em Setembro o fecho do teatro durante quatro meses. Um conhecedor do "dossier", o ex-secretário de Estado da Cultura, Rui Vieira Nery, afirmou então pensar "que há uma inábil decisão política, a de cancelar espectáculos, explicada pelo facto de o TNDM não ser uma peça prioritária na estratégia do Ministério da Cultura". Para 1999, o ministério anunciou um reforço de verba de 222.600 contos, fixando o orçamento em 1.191.300 contos, mas em termos reais o aumento está por confirmar, como se continua a aguardar a portaria conjunta dos ministérios da Cultura e das Finanças definindo os parâmetros dos vencimentos. Com uma inabilidade política despudorada, Carrilho concede favoritismo a outro teatro nacional, o São João do Porto, e continua a desconsiderar Avilez e o Dona Maria - ou a considerar antes os subdirectores.Só que com a greve dos trabalhadores do teatro por reivindicações salariais, a situação de Avilez na corda bamba afigura-se cada vez mais insustentável. Por um lado, o nº3 do artigo 12º da lei orgânica estabelece que "na medida em que a figura do director artístico, na dupla acepção de dirigente principal e encenador residente constitui o elemento identificador do projecto artístico" daquele teatro, "a sua actividade de encenação é exercida em regime de exclusividade", "excepto no caso de projectos especiais, que deverão ser objecto de autorização pelo ministro da cultura" - ora, Avilez tem continuado a encenar na sua companhia, o Teatro Experimental de Cascais. Por outro lado, confrontado com as críticas da comissão de trabalhadores, Avilez afirmou, a 13/11/98, que só se manteria na direção com o apoio da companhia. Na presente crise, depois de deposto o pré-aviso de greve, Avilez enviou, a 11 de Março, uma mensagem aos actores solidarizando-se com a sua luta; supõe-se naturalmente que subscreve o comunicado da direção de 16 de Março, em que esta, reiterando a sua disponibilidade negocial, lamenta que o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculo "tenha recusado o diálogo", mas dois dias depois depois a tabela do teatro registava uma sua nota escrita, solidarizando-se com os actores e comprometendo-se ao empenhamento junto da tutela (Ministério da Cultura), no sentido de por ela serem dadas condições à direção para negociar internamente, deixando portanto subjacente que o problema reside nas condições dadas pela tutela.Parafraseando a deixa mais célebre do "Frei Luís de Sousa" em cena no TNDM, encenado pelo director, é caso para perguntar: Avilez, Avilez, quem és tu? A resposta à pergunta é hamletiana: ser ou não ser, nas presentes condições, director do Dona Maria, eis a questão.

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