Um ano depois dos descarrilamentos ainda se circula a 10 Km/hora na linha da Beira Alta

Refer está há um ano para pôr a linha operacional. CP não consegue cumprir horários. Mas mesmo assim ganha passageiros.

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A CP viu-se obrigada a alterar horários Nélson Garrido/ Arquivo

Um ano depois de um comboio de mercadorias ter descarrilado e destruído centenas de metros de travessas na linha da Beira Alta, a Refer ainda não conseguiu consertar o troço acidentado.

Em causa está a dificuldade em encontrar travessas de madeira para serem aplicadas nas pontes centenárias daquela linha. “São travessas com dimensões únicas, com alturas diferentes e alinhamentos que foram feitos à mão”, desabafou ao PÚBLICO um técnico da Refer, explicando o carácter quase artesanal de um produto que não existe no mercado e que só pode ser feita sob encomenda. Mas, sujeita às regras das empresas públicas, a Refer teve de avançar para concurso e o processo arrasta-se há um ano.

Enquanto isso, a administração e os quadros da CP desesperam com a lentidão das obras de recuperação da linha, que está “semeada” de afrouxamentos que tornam impossível cumprir horários. Alguns estão sujeitos à velocidade máxima de 10 Km/hora.

Por causa disso, em Dezembro passado, a CP viu-se obrigada a ajustar os seus horários à nova realidade da infra-estrutura. Os Intercidades entre Lisboa e a Guarda passaram a demorar mais 13 minutos e os Regionais mais 14 minutos. O internacional que liga Lisboa a Madrid e a Hendaia foi penalizado em mais 24 minutos. Os comboios da Beira Alta continuam, mesmo assim, a ser os menos pontuais de toda a rede da CP. Em 2015, segundo a própria empresa, cerca de 60% dos Intercidades chegam ao destino com mais de cinco minutos de atraso, percentagem que ronda os 40% nos regionais.

Em resposta ao PÚBLICO, a CP diz que “o investimento nas infra-estruturas ferroviárias em Portugal é urgente, uma vez que o resultado da operação é uma consequência das condições em que o mesmo se desenvolve”. Por isso, “esse investimento na rede deve ser bem planeado e bem distribuído, de forma a evitar a degradação das condições de circulação”. Portugal tem o segundo pior desempenho na Europa no transporte ferroviário, segundo um estudo de uma consultora divulgado no início de Maio. A CP diz ainda que se houver investimento e condições adequadas na infraestrutura, “o crescimento da operação será natural”.

Essa “naturalidade” no crescimento verifica-se na linha da Beira Alta onde, apesar da degradação do serviço, a procura tem aumentado. No primeiro trimestre deste ano os Intercidades deste eixo tiveram mais 2,7% de passageiros do que no mesmo período do ano passado. Mas a CP argumenta que sai prejudicada porque o crescimento nos restantes Intercidades do país foi, nesse período, de 6,4%. Já o serviço regional nesta linha perdeu 5,1% do seu mercado enquanto que nas outras linhas essa redução foi de 0,7%.

A Refer, por sua vez, não traz boas notícias. Só em Dezembro de 2016 estarão terminadas as obras em curso na linha da Beira Alta. Obras que vão um pouco mais além da simples reposição da via à situação anterior à dos descarrilamentos. A empresa diz que o troço acidentado necessita de 13000 travessas, das quais 1000 são as problemáticas travessas especiais de madeira para aplicar nas pontes de Várzeas, Meligioso e Trezói (concelho de Mortágua).

Durante o mês de Agosto a Refer espera resolver o problema das pontes, acabando assim com os afrouxamentos de 10 Km/hora. Uma empreitada que custará 750 mil euros. Segue-se a renovação integral dos 15 quilómetros de via acidentada (incluindo a drenagem do túnel de Trezói), que vai demorar mais um ano e custará 12,5 milhões de euros. Fora da zona acidentada, entre 2015 e 2016 a Refer espera investir três milhões de euros na manutenção da linha.

Globalmente, até 2018 serão gastos 60 milhões de euros em intervenções que visam, segundo a Refer, “corrigir não só os danos introduzidos na infraestrutura pelos descarrilamentos, mas igualmente beneficiar esta linha estratégica para o país”. Um investimento que a empresa considera imprescindível, apesar de o Governo já ter anunciado que pretende construir uma linha nova entre Aveiro e Mangualde no valor de mil milhões de euros. À questão de saber se a CP espera ser indemnizada pela Refer pelos atrasos provocados pelas obras, a empresa não respondeu.

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