Ambientalistas apontam Portugal como porta de entrada de madeiras ilegais

Greenpeace e Quercus alertam para importações irregulares da República Democrática do Congo.

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Manuel Roberto

Portugal é a segunda maior porta por onde entram no mercado internacional madeiras de explorações duvidosas ou alegadamente ilegais da República Democrática do Congo. Pelos portos portugueses, em particular Leixões, passaram já 3210 toneladas de madeiras exportadas pela empresa de origem libanesa Cotrefor, acusada de práticas ilegais ou irregulares naquele país africano pela organização ambientalista Greenpeace.

Durante dois anos, a Greenpeace vasculhou as actividades da empresa. “O resultado desta investigação revela um registo chocante de tratamento inadequado dos seus empregados, impostos não pagos, irregularidades operacionais no que toca ao abate de árvores e à ultrapassagem das quotas de espécies protegidas”, refere um relatório da organização, divulgado esta terça-feira.

A Greenpeace fala também de títulos de exploração ilegais e de casos de corrupção, com funcionários públicos a receberem ajudas mensais da empresa.  

As concessões, acrescenta o relatório, são uma ameaça aos bonobos ou chimpanzés-pigmeus, a espécie de primata mais próxima do homem e que só se encontra naquele país. O avanço das explorações abre a porta a zonas de floresta antes inacessíveis, destruindo o habitat daquela espécie e facilitando a sua captura ilegal.  

Segundo os ambientalistas, o caso da Cotrefor “é um microcosmo do caos que prevalece na exploração de madeiras da República Democrática do Congo”. O país detém a maior mancha de floresta húmida tropical de África, mas “a corrupção e a falta de vontade política estão entre as razões que colocam estas florestas sob ameaças crescentes”, diz o relatório.

Parte da investigação da Greenpeace dedicou-se a reconstruir a trajectória da madeira exportada pela Cotrefor, que actua no país desde 2011, e antes disso sob outra denominação. Os registos encontrados indicam que os produtos entraram em vários países, mas dois se destacam, por terem recebido metade de toda a madeira: França (3256 toneladas) e Portugal (3210).

As transacções dependem de empresas importadoras que aceitem o material de origem eventualmente irregular. “O problema é que muitas dessas empresas podem mascarar muita coisa”, diz Domingos Patacho, da organização ambientalista Quercus – que colaborou com a Greenpeace neste trabalho.

Patacho afirma que não há provas de que toda a madeira citada no relatório como tendo entrado em Portugal seja ilegal. “Isto não conseguimos confirmar. O que se pode dizer é que é proveniente de abate destrutivo”, diz o militante da Quercus.

Pelo menos há uma década e meia que a entrada de madeira alegadamente ilegal em Portugal está na mira dos ambientalistas. Em 2000, militantes da Greenpeace e da Quercus tentaram bloquear a entrada de um navio de Camarões no porto de Leixões. Cinco anos depois, fizeram uma nova acção de protesto para impedir o descarregamento de madeiras da Amazónia, no mesmo porto.

Em 2010, a União Europeia adoptou um regulamento para impedir a circulação no mercado europeu de madeiras ou produtos de madeira provenientes de abates ilegais. As normas entraram em vigor em 2013. Mas Domingos Patacho alerta para a falta de recursos da administração central para as pôr em prática. “O Instituto da Conservação da Natureza e Florestas [ICNF] tem de ter meios para fazer a fiscalização”, alerta.

O PÚBLICO tentou contactar o ICNF e a empresa Cotrefor, mas não obteve resposta até ao meio da tarde desta terça-feira. 

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