PS alega que convergência das pensões “questiona o Estado de Direito”

Direcção da bancada socialista sustenta que o argumento da igualdade usado pelo Governo é um “falso álibi”, porque no cálculo das pensões mantêm-se muitas divergências.

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Alberto Martins é o primeiro subscritor da declaração de voto do PS. Daniel Rocha

O PS considera que a lei da convergência das pensões quebra o princípio da confiança de forma tão grave que "questiona o Estado de Direito". Um argumento que se aproxima das fundamentações do pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República ao Tribunal Constitucional, que irá decidir até dia 18.

“Pela primeira vez na história da legislação do sistema de pensões, esta norma determina a aplicação retroactiva das novas regras de cálculo as pensões em curso de pagamento! No sistema previdencial nunca tal ocorreu!”,lê-se na declaração de voto que o PS entregou no Parlamento para sustentar o seu “não” à lei da convergência das pensões.

Em 12 páginas de argumentos políticos, princípios constitucionais e factos históricos, um grupo de deputados encimado pelo líder da bancada, Alberto Martins, e por outros ex-governantes, como Vieira da Silva, Eduardo Cabrita ou Pedro Marques, tenta refutar a argumentação do Governo para aplicar um corte de 10% às pensões acima de 600 euros.

Afirmando que a ruptura de um “valor básico do Estado de Direito que valor da confiança” é “política e socialmente inaceitável”, o PS argumenta que as regras foram sempre ditadas pelo Estado e que foi com base nelas que “centenas de milhares de cidadãos tomaram decisões irreversíveis (o momento da reforma, por exemplo), vendo agora profundamente transformadas as condições que ditaram a sua escolha.

Tal como fez o Presidente da República na fundamentação do pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei enviado a 23 de Novembro, também os socialistas defendem que a redução nominal das pensões se aplica a pessoas que se encontram “impossibilitadas de recuperar, pelo seu trabalho, a redução dos rendimentos que é agora proposta”.

A seguir, o texto tenta demonstrar como o argumento da igualdade dado pelo Governo é “um falso álibi”. “O Governo mantém as divergências há muito existentes, favoráveis a alguns grupos profissionais, mormente em favor dos trabalhadores das áreas de soberania, seja no cálculo das pensões, seja na idade da reforma”, escrevem. A estas juntam “todos os outros parâmetros divergentes no cálculo do regime geral e da CGA [Caixa Geral de Aposentações]”, elencando desde os salários relevantes para o cálculo das pensões até ao número de dias por ano de trabalho para a consideração de um ano para o cálculo, “fortemente desfavoráveis para os funcionários públicos”.

Os socialistas sublinham ainda que, se o objectivo do Governo fosse realmente a convergência e igualdade dos regimes, não estaria previsto na própria lei que a situação se pudesse inverter quando o défice ficar abaixo dos 2%. Em seu entender, esta é a prova de que “o único propósito desta proposta é cortar despesa pública com o desígnio de reduzir o défice”.

Para sustentar que o corte de pensões aprovado é “injusto e desproporcionado”, a declaração de voto afirma ainda não ser verdade que os aposentados da administração pública tenham, até agora, ficado de fora dos esforços de consolidação das contas públicas. Recordam, por exemplo, o congelamento das pensões, a contribuição extraordinária de solidariedade, o aumento da contribuição dos reformados para a ADSE ou a redução das deduções específicas em sede de IRS, para afirmar que o conjunto destas medidas resultou numa perda dos valores médios das pensões superior a 7,5%. Isto enquanto a queda da despesa corrente primária rondou os dois por cento.

Mas é no capítulo da sustentabilidade da CGA que os socialistas mais se alongam em considerações sustentadas em factos históricos. “O Estado, há várias décadas, optou por não proceder a transferências correspondentes à contribuição” dos funcionários públicos, porque “na altura muitos contribuíam e poucos recebiam pensões”. Embora não contestem tal opção à época, defendem que esta decisão “não pode é ser esquecida quando se trata de honrar as obrigações assumidas”.

Depois, a “mudança substancial da política de emprego público na última década”, que terá conduzido a uma quebra de contribuintes para a CGA em mais de 30%, conduziu à perda de receitas anuais de cerca de 1900 milhões de euros, sustentam os socialistas. “O Estado há anos que vai exaurindo em milhares de milhões esse orçamento [da CGA], por outras razões imperiosas de interesse público”, acrescentam. Mas “quebrar agora a confiança dos cidadãos e nos direitos consolidados dos pensionistas” é, concluem, “errado e profundamente injusto”. Além de ser uma “medida profundamente recessiva”.

 

  
 
 

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