México sai à rua para exigir às autoridades que encontrem 43 estudantes desaparecidos

Muitos não confiam nas autoridades e a indignação contra o Governo federal não pára de crescer.

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“Estado terrorista e assassino” ou “Estado fascista, assassino de estudantes”, lia-se nos cartazes levados pelos estudantes Edgard Garrido/Reuters

Duas semanas depois do desaparecimento de 43 estudantes mexicanos, atacados por polícias e por narcotraficantes e levados em viaturas da polícia, dezenas de milhares de pessoas manifestaram-se em diferentes cidades para exigir que as autoridades os encontrem.

A contestação não parou de crescer desde que foram divulgadas as ligações entre o presidente da câmara de Iguala, membro do PRD (Partido da Revolução Democrática, esquerda), e os traficantes do grupo Guerreros Unidos, uma unidade local do cartel Beltran Leya. O autarca, José Luis Abarca, desapareceu há vários dias e é considerado um fugitivo pela polícia federal, que desde o início da semana tomou o controlo desta cidade no estado de Guerrero, Sul, a 200 quilómetros da capital.

Segundo um relatório dos serviços secretos publicado pela imprensa mexicana, a mulher de Abarca, Maria de Los Angeles Pineda, ordenou às forças de segurança que impedissem o protesto previsto dos estudantes (100 deslocaram-se da zona rural onde vivem à cidade, a 26 de Setembro), evitando assim que estes atrapalhassem um discurso que deveria fazer no dia em que os jovens desapareceram.

Em 2009, dois irmãos de Pineda estavam na lista dos narcotraficantes mais procurados do país precisamente por serem suspeitos chefes locais do cartel Beltran Leya.

É por tudo isto que tanta gente saiu à rua: a consciência de que o Governo do Presidente, Enrique Peña Nieto, sabia destas ligações e podia ter agido para afastar políticos e forças de segurança corrompidas. O ministro da Justiça, Jesus Murillo Karam, reconheceu que o próprio Abarca foi acusado do assassínio de um camarada de partido a meio do ano passado, enquanto o procurador de Guerrero, Inaky Blanco, diz que um líder dos Guerreros Unidos conspirou com membros da segurança local para atacar os estudantes.

As famílias dos desaparecidos viajaram até à Cidade do México na quarta-feira e dezenas de milhares de pessoas encheram as ruas do centro para se solidarizarem. “Vocês não estão sozinhos”, ouvia-se à passagem dos pais, protegidos por um cordão de estudantes. “Viemos exigir justiça e o regresso dos nossos camaradas vivos”, disse à agência AFP um dos alunos da Escola Rural de Ayotzinapa, onde os estudantes desaparecidos, com idades entre os 17 e os 21 anos, se preparavam para ser professores.

Os protestos repetiram-se em várias cidades: para além de Chilpancingo, capital do estado de Guerrero, onde se manifestaram 20 mil pessoas que chegaram a bloquear a auto-estrada que une a Cidade do México à estância turística de Acapulto, houve protestos em Cristóbal de las Casas ou Guanajuato. Em Chiapas, milhares de membros da guerrilha Exército Zapatista de Libertação, desceram das montanhas desarmados, mas de cara tapada, erguendo cartazes onde se lia: “A vossa cólera também é a nossa.”

Sem que nenhum ainda tenha sido identificado como pertencendo a algum dos estudantes, 28 corpos foram encontrados numa vala comum no domingo perto do local do desaparecimento. Dois assassinos confessaram entretanto terem morto 17 deles. “O México tornou-se pior do que um campo de morte. Nunca pensei viver para ver algo tão terrível”, disse à Reuters Mariela Lopez, uma professora de 56 anos que se juntou à marcha da capital.

Nos últimos dias, milícias de autodefesa juntaram-se às buscas e organizaram buscas paralelas; segundo dizem, fazem-no a pedido das famílias, que não confiam nas autoridades federais. “Nós vamos encontrar os jovens, mortos ou vivos”, disse à AFP Moisés, um dos comandantes da União dos Povos e Organizações do Estado de Guerrero.

Organizações como a ONU e a OEA (Organização dos Estados Americanos) apelaram ao Governo mexicano para agir com urgência neste caso. Já a Human Rights Watch (HRW) acusou Peña Nieto de ter demorado muito a reagir e de não ter feito dos casos de direitos humanos uma prioridade, “tratando de escondê-los por os considerar má publicidade para o México”, país que vive “uma crise de direitos humanos de enormes proporções”.

Este Governo tinha-se comprometido a investigar os mais de 26 mil desaparecimentos reconhecidos pelo anterior, mas, para a HRW, todos os seus esforços foram minados por “demoras inexplicáveis, anúncios contraditórios e resultados escassos”.

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