Estender ataques à Síria deixa aliados relutantes com a estratégia de Obama

Mundo árabe aceita integrar "frente unida" para impedir o avanço dos islamistas, mas põe-se de fora das manobras militares. Rússia avderte para a ilegalidade dos ataques aéreos na Síria prometidos pelo Presidente norte-americano.

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Treze anos depois do 11 de Setembro, a América está confrontada com uma nova ameaça Gary Cameron/Reuters

A estratégia para “degradar, derrotar e por fim destruir” o Estado Islâmico (EI), anunciada pelo Presidente norte-americano, Barack Obama, na quarta-feira à noite, parece não ter convencido totalmente nem mesmo os parceiros dos Estados Unidos na coligação internacional que se propôs combater os militantes sunitas no Médio Oriente.

A promessa de ataques aéreos dentro da Síria foi o ponto que motivou mais reticências e críticas: as palavras mais contundentes foram as da Rússia, aliada do Presidente Bashar al-Assad, que chamou a atenção para a eventual transgressão da lei internacional por parte da Força Aérea norte-americana.

Conforme precisou o porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros, Alexander Lukashevich, qualquer acção militar exige ou o consentimento do Governo de Damasco ou um mandato do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas. Mas quando Barack Obama “falou directamente na possibilidade de ataques às posições do EI dentro da Síria”, não referiu a autorização “do legítimo Governo” de Damasco, observou aquele responsável. “Esse passo, na ausência de uma decisão do Conselho de Segurança, constituiria um acto de agressão, uma séria violação da legislação internacional”, considerou.

Mais brandos, aliados como a França ou o Reino Unido referiram-se às dificuldades ou desafios que tal estratégia compreende, aconselhando ponderação. Paris entende que deve haver uma diferença nas “modalidades” da acção militar contra os extremistas, no Iraque e na Síria, distinguindo entre os bombardeamentos já em curso em território iraquiano e a distribuição de armas ou a formação militar dos rebeldes que combatem os militantes do EI mas também a tropa de Bashar al-Assad.

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, disse que Londres não exclui nenhuma acção militar contra o EI na Síria, nomeadamente ataques aéreos. O esclarecimento foi feito por Downing Street após declarações do ministro da Defesa, Philip Hammond, sobre a “diferença qualitativa” entre bombardeamentos no Iraque e a mesma actividade na Síria. “As diferenças legais, técnicas e militares tornam essa possibilidade muito mais complicada na Síria”, observou.

Na sua declaração ao país para apresentar a nova campanha militar contra o EI, Barack Obama fez questão de explicar que a iniciativa americana não era uma declaração formal de guerra mas sim uma operação de contraterrorismo de larga escala. O Presidente garantiu que não queria envolver o país noutra guerra prolongada no Médio Oriente, mas não apresentou prazos nem identificou os critérios para o fim da missão.

Apesar das críticas da imprensa americana, o plano foi bem recebido pelos legisladores do Congresso, que esta quinta-feira anunciaram para breve medidas para “assegurar que as nossas forças obtêm todos os meios necessários para levar a cabo a sua missão”, disse o líder republicano do Senado, Mitch McConnell.

As palavras de Barack Obama também caíram bem no mundo árabe. Em Jeddah, na Arábia Saudita, o secretário de Estado norte-americano John Kerry, encarregado de montar a coligação internacional de, confirmou esta quinta-feira a participação de dez Estados árabes na “frente unida” que está comprometida com a destruição do Estado Islâmico, “onde quer que ele esteja, incluindo no Iraque e na Síria”.

Numa declaração conjunta, a Arábia Saudita, os Estados do Golfo, o Egipto, Jordânia e Líbano prometeram tomar medidas para cortar o financiamento às actividades terroristas do EI e impedir o trânsito de militantes pela região. A Turquia, que também participou no encontro com o diplomata americano, preferiu não subscrever o documento final.

Mas da mesma maneira que não haverá soldados norte-americanos no Iraque (e muito menos na Síria), também não é de antecipar que esses países venham a destacar homens para combater no estrangeiro – Kerry disse que até agora nenhum país se comprometeu com o envio de tropas, embora o comunicado conjunto diga que “conforme apropriado, [os signatários] participarão em alguns aspectos da campanha militar coordenada”.

No seu discurso ao país, na quarta-feira, Obama referiu-se ao destacamento de mais 475 conselheiros militares americanos para o Iraque – até agora, os EUA já enviaram 1200 especialistas para a formação e aconselhamento das autoridades iraquianas.

Embora sem confirmação oficial, o Irão também terá destacado conselheiros militares para apoiar o Exército vizinho nas suas manobras contra os radicais do EI. A república islâmica já exprimiu a sua preocupação com os avanços dos militantes nas zonas de fronteira; porém, a intensificação da presença militar norte-americana na região não agrada a Teerão, que encontrou “demasiada ambiguidade” no discurso de Obama.

No Iraque, o plano de combate enunciado por Obama foi recebido com moderado optimismo pelas lideranças xiitas e sunitas e também no Curdistão. “A situação é urgente e não fazer nada não é uma opção. Estamos satisfeitos com a nova estratégia americana”, comentou o novo vice-primeiro ministro curdo, Hoshyar Zebari, citado pela AP.

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